Barco no mar. Na proa há oito meninas com roupas pretas de mergulho, sentadas e outras cinco pessoas em pé atrás delas
O objetivo foi treinar jovens de comunidades tradicionais sobre conservação marinha e monitoramento dos recifes de corais, além de proporcionar o primeiro contato das voluntárias com o fundo do mar | Foto: Projeto Coral Vivo

Por Alice Sales
Colaboradora

Arraial D’ajuda (BA). Seis voluntárias de comunidades tradicionais do Sul da Bahia, entre elas cinco indígenas da etnia Pataxó, participaram, nesta semana, do curso de capacitação Reef Check Brasil promovido pelo Projeto Coral Vivo em parceria com a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). A iniciativa, que já é realizada em 102 países, teve como objetivo realizar treinamentos, com aulas práticas e teóricas, sobre conservação marinha e monitoramento da saúde dos recifes de corais da região, além de ter proporcionado o primeiro contato das voluntárias com o fundo do mar.

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Patrocinada pela Petrobrás, a capacitação contou com a participação de mulheres com idades entre 13 e 29 anos, que vivem na Aldeia Velha, em Arraial d’Ajuda, e na Aldeia Mãe Barra Velha, além de participantes da comunidade de Curuípe, na Reserva Extrativista Marinha do Corumbau. Ao longo da semana, as voluntárias participaram de atividades que forneceram conhecimento científico e incentivaram o engajamento feminino na conservação dos recifes de corais, já que a maioria dos grupos de monitoramento que atuam no litoral sul da Bahia é formada por homens.

Sara, da Aldeia Mãe Barra Velha, tem 28 anos e nunca havia mergulhado no mar antes. Para ela, o curso foi muito proveitoso: “Aprendi bastante, principalmente sobre os corais e peixes. É uma experiência única e espero que seja a primeira de muitas”.  Já Márcia, da comunidade de Curuípe, conta que sempre mergulhou nos costões, mas nunca com os equipamentos e cilindro antes: “Estou muito empolgada em conhecer os recifes”.

A ideia é que os conhecimentos adquiridos durante as atividades sejam úteis para formar equipes locais que realizem o monitoramento da saúde dos corais, peixes e outros invertebrados marinhos da região. A ação visa principalmente inserir as voluntárias no contexto da ciência cidadã, que é a parceria entre cientistas e a sociedade para coleta de dados que ajudam a gerar conhecimento e ampliar a participação da população nos cuidados com o meio ambiente.

Além disso, o grupo estará apto a atuar em áreas de mergulho livre e pode ter um papel de vigilância no registro de eventos como o branqueamento dos corais, provocado pelo pelas mudanças climáticas. Espera-se que os conhecimentos adquiridos sejam multiplicados dentro das comunidades.

Durante as aulas teóricas, as alunas foram apresentadas às espécies locais, como esponjas, algas, corais e peixes. Já nas aulas práticas do curso, elas participaram de uma experiência de mergulho em uma piscina com correnteza em formato de rio, com 426 metros de extensão, dentro do Eco Parque Arraial d’Ajuda. No último dia, as alunas observaram as espécies na natureza, em um mergulho com cilindro (batismo) no Parque Natural Municipal Marinho do Recife de Fora, em Arraial D’Ajuda.

“Chegamos há pouco do mergulho de batismo que finaliza a formação de novas lideranças jovens mulheres que serão voluntárias de monitoramento ambiental, especialmente com base no protocolo Reef Check, que é internacional e que no Brasil já é realizado há quase 20 anos. O engajamento dessas jovens Pataxó nos trouxe uma alegria e uma conexão da mata com o mar. Tivemos uma participação muito boa dessas guerreiras, que aprenderam muito sobre os organismos marinhos que vivem aqui no Sul da Bahia”, destaca Fábio Negrão,  pedagogo e coordenador de sensibilização do Projeto Coral Vivo.

Além disso, Negrão ressalta a importância da troca de conhecimentos entre as jovens durante a experiência.  “Elas compartilharam conosco os conhecimentos tradicionais das suas comunidades, muito do que hoje a gente dá muito valor, que é a preservação desse modo de vida engajado com a natureza. Essas jovens não só passaram dias maravilhosos aqui, mas também levarão muito conhecimento para as suas comunidades”.

O pedagogo relata que o que mais chamou sua atenção durante as atividades foi o desenvolvimento e aprendizado rápido dessas meninas. Além do interesse, independentemente da idade, de ir para o mar. A maioria não tinha tido a experiência de mergulhar e ver a vida marinha debaixo d’água.

Sete mulheres sentadas em um barco, em círculo. Elas usam blusas brancas e conversam
O momento também foi de compartilhar os saberes das voluntárias | Foto: Projeto Coral Vivo

Negrão considera que a iniciativa contribui de forma ampla para a gestão e uso sustentável  dos recifes de corais. “Queremos sensibilizar as mulheres dessas comunidades indígenas para que elas possam multiplicar o conhecimento da ciência cidadã. Nosso objetivo é estimular o olhar crítico da comunidade em relação às questões ambientais, promover a gestão do uso sustentável dos recifes de forma ampla”, explica.

O conhecimento poderá ser aplicado também no dia a dia de cada voluntária, que poderá contribuir ao observar, por exemplo, a presença de resíduos sólidos na praia e no mar, a observação de mudanças na largura dos rios e praias, volumes de chuvas e problemas como a baixa salinidade nas águas do mar, assim como quebra de recifes por eventos climáticos ou pelo uso inadequado dos recifes por diferentes pessoas.

As aulas da capacitação Reef Check  foram ministradas por Fábio Negrão, Carlos Henrique Lacerda, Kely Salvi e Edimilson Conceição, da equipe do Projeto Coral Vivo, e também pela bióloga Ana Lídia Gaspar, do Instituto Recifes Costeiros, e pela oceanógrafa Camila Brasil, professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA). A etapa prática também contou com a participação de monitores do Coral Vivo na logística de insumos e transporte para as aulas, além do apoio nas aulas práticas de piscina, atuando como dupla de mergulho das alunas.

Coral Vivo

Patrocinado pela Petrobras desde 2006, por meio do Programa Petrobras Socioambiental, o Projeto Coral Vivo trabalha com pesquisa, educação, políticas públicas, comunicação e sensibilização para a conservação e a sustentabilidade socioambiental dos ambientes recifais e coralíneos do Brasil. Concebido no Museu Nacional da Universidade Federal do Rio da Janeiro (UFRJ), hoje é realizado por 13 universidades e institutos de pesquisa. Está vinculado ao Instituto Coral Vivo, que já foi coordenador executivo do Plano de Ação Nacional para a Conservação dos Ambientes Coralíneos (PAN Corais), e segue no apoio à iniciativa.

Além disso, o Coral Vivo integra a Rede Biomar, junto com os projetos Albatroz, Baleia Jubarte, Golfinho Rotador e Meros do Brasil. Patrocinados pelo Programa Petrobras Socioambiental, eles atuam de forma complementar na conservação da biodiversidade marinha do Brasil. As ações do Projeto Coral Vivo são viabilizadas também pelo copatrocínio do Arraial d’Ajuda Eco Parque.

O Coral Vivo faz parte também da Rede de Conservação das Águas da Guanabara e Entorno (Redagua), que reúne outros projetos apoiados pela Petrobras. A rede tem como objetivo promover a conservação da biodiversidade, prestação de serviços ecossistêmicos, restauração ambiental, pesquisa, educação ambiental, inclusão social e comunicação na região da Baía de Guanabara e entorno, sendo constituída pelos Projetos Coral Vivo, Guapiaçu, Meros do Brasil e Uçá.

Campanha de Conduta Consciente

Iniciativa da Secretaria de Biodiversidade e Florestas (SBF) do Ministério do Meio Ambiente (MMA), surgiu em 2001 e tem como objetivo contribuir para a conservação dos corais. Em 2010, a Campanha foi estendida ao ambiente praial, com o foco na importância da conservação dos ecossistemas costeiros. Em 2016, passou a integrar a lista de ações que fortalecem os objetivos do PAN Corais e em 2018 recebeu o apoio do Projeto TerraMar (MMA/GIZ). Desde então, a Campanha Conduta Consciente foi atualizada com novas temáticas, novo visual e linguagem mais simples, na intenção de abranger um maior público.

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