Quilombolas vivem em precária situação; muitos moram em casas de taipa sem pias ou banheiro | Foto: Cid Barbosa

Simões Filho – BA. Está chegando ao fim um dos maiores episódios de repressão oficial após o fim da ditadura militar no Brasil. A pedido do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública da União na Bahia (DPU/BA), na última semana, a Justiça Federal confirmou decisão liminar sobre demarcação e titulação das terras da comunidade remanescente de quilombos de Rio dos Macacos, localizada no Município de Simões Filho, Região Metropolitana de Salvador. Na sentença, é determinado que o Instituto Nacional de Colonização da Reforma Agrária (Incra) conclua o procedimento de demarcação e titulação das terras no prazo máximo de 540 dias.

Há mais de 200 anos, a comunidade quilombola Rio dos Macacos, atualmente, cerca de 85 famílias, ocupa o local. Há 47 anos, entretanto, teve início um conflito com a Marinha do Brasil, quando a área onde a comunidade está instalada, foi escolhida para a construção da Vila Naval de Aratu. Desde então, os remanescentes quilombolas sofrem para ter acesso às suas moradias, haja vista, entre outras restrições, que têm que passar pelo mesmo caminho que dá acesso à Vila Naval. Os relatos de humilhação e até violência física são comuns.

Por conta do conflito, o acesso, por meio da Vila Naval da Barragem, é restrito. Só é permitida a entrada de quem é cadastrado. Parte da área é cercada com arame farpado. Para os moradores, é uma forma de intimidação e de acuá-los cada vez mais. Segundo um um remanescente de quilombola que pediu para que sua identidade fosse preservada, “na portaria, eles têm uma relação. Se um parente ou amigo que não tiver o nome incluído quiser nos visitar tem que voltar, a não ser que a gente desça e vá recebê-lo pessoalmente”.

Por conta da restrição, muitos parentes dos quilombolas evitam frequentar o local. “Quem quiser chegar até aqui tem que pegar um atalho no meio do mato. O local é perigoso, pois tem muitos desocupados e ladrões nessa região. Além do mais, tem que ter sorte e reza forte, pois, se a guarda pegar, bota para descer”, conta outro morador do Rio dos Macacos.

A opressão oficial impede que muitos barracos consigam uma ligação de água encanada. Energia, só se for puxada clandestinamente, por meio do que se convencionou chamar de gato. “A Marinha diz que estou roubando energia elétrica. Como, se ela nunca me deu o direito de pedir uma ligação normal?”, questionam os quilombolas.

Os moradores apontam restrições para a construção em alvenaria. Até mesmo levantar um banheiro não pode acontecer sem a autorização expressa da Marinha. Os moradores são proibidos de cultivarem pequenas lavouras, buscar água e outras atividades elementares para levar uma vida condizente com um ser humano. Muitos vivem em barracos de taipa sem as mínimas condições de levar uma vida digna.

Visita da OEA

Em novembro do ano passado, o Quilombo Rio dos Macacos recebeu representantes da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) para observar a situação de garantia dos direitos humanos da população no local, além de colher relatos. Na ocasião, o acesso da imprensa não foi autorizado pela Marinha.

“Muito do que vimos aqui são crimes contra a humanidade. Temos que impedir a construção do muro e pressionar para a titulação. Os Estados que tiveram escravidão em seus territórios têm dívida com essas pessoas e temos que tratá-las com dignidade. A comissão vai fazer o possível para que o governo brasileiro responda e implemente o que vocês precisam”, comprometeu-se a presidente da CIDH, Margarette May Macaulay, logo após a visita a Rio dos Macacos.

Em nota, a instituição informou que “a área visitada pela comissão da OEA é restrita, com controle de acesso e sob litígio. Dessa forma, segundo o comunicado, por questões de segurança e controle, a gravação ou registro de imagens no local depende de prévia análise, autorização e acompanhamento. Na impossibilidade de atendimento a tais critérios, a entrada de equipes de imprensa na referida área não é autorizada”.

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