Por Alice Sales
Colaboradora

Segundo as informações do Ibama, as manchas de petróleo cru já atingiram 187 pontos, espalhados por 77 municípios. Os nove estados nordestinos foram afetados. 

Mancha de óleo atingiu a Baía de Todos os Santos e Ilha de Itaparica na Bahia, e um trecho da Área de Preservação Ambienta (APA) da Costa dos Corais, entre Pernambuco e Alagoas

Fortaleza – CE. Os esforços para contenção e monitoramento da grande mancha de petróleo cru que atinge todo o Nordeste segue por parte das autoridades. Segundo a Secretaria do Meio Ambiente do Ceará (Sema), não há indícios de novas manchas de óleo no litoral do Ceará. Entretanto, o trabalho de monitoramento da Agência Nacional de Petróleo (ANP), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Marinha do Brasil, com inspeção de navios, sobrevoo e outras ações de fiscalização, continua.

Um grupo de trabalho que integra a Casa Civil, Sema, Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma), Ibama, Secretaria de Turismo do Ceará (Setur), Departamento Estadual de Trânsito (Detran), Polícia Militar, Corpo de Bombeiros, Instituto de Ciências do Mar (Labomar), Núcleo de Tecnologia e Qualidade Industrial do Ceará (Nutec), Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), Marinha e as ONGs Associação de Pesquisa e Preservação de Ecossistemas Aquáticos (Aquasis) e Instituto Verdeluz, lidera as atividades de combate à mancha de óleo.

De acordo com a Semace, por meio de um monitoramento terrestre foi possível constatar que o Litoral Oeste do Ceará está limpo, mas algumas praias do Litoral Leste, como Prainha, Caponga, Aracati e Quixaba, ainda apresentam ocorrências. A Sema, que está fazendo vistorias diárias com os gestores de Unidades de Conservação, identificou presença de óleo na praia, algas e animais entre Paracuru e Paraipaba.

As praias de Sabiaguaba, em Fortaleza, e Quixaba, no Litoral Leste, são prioritárias para ação de limpeza e devem receber equipes nos próximos dias. Outras praias do litoral cearense que receberão ações de limpeza são Capim-Açu, Paracuru, Paraipaba,no Litoral Oeste; e Prainha, Caponga, Aracati, Canoa Quebrada, Praia das Fontes e Morro Branco, no Litoral Leste. O Equipamento de Proteção Individual está sendo fornecido pela Petrobras e pela Seuma.

Balneabilidade das praias

De acordo com o boletim extraordinário de balneabilidade do litoral cearense, divulgado pela Semace, nesta ultima sexta-feita (18), as 18 praias do Litoral Oeste do Estado estão recomendadas para banho. O Litoral Oeste vai de Icaraí, em Caucaia, até a praia do Preá, em Cruz.

Já no Litoral Leste, que vai da Cofeco, em Fortaleza, à Redonda, em Icapuí, a Semace verificou a ocorrência de óleo em seis das 17 praias analisadas. Estão impróprias para banho Cofeco, Prainha (Aquiraz); Barro Preto, Tabubinha e Praia das Fontes (Beberibe); e Majorlândia (Aracati).

Em Fortaleza, as onze praias do Litoral Leste, que corresponde ao trecho que vai do Farol ao Caça e Pesca, incluindo a Praia do Futuro, estão próprias para banho.  A área recebeu ações de limpeza para remoção do óleo. Na Zona Centro, que inclui as praias do Mucuripe, Meireles e de Iracema, seis das sete praias analisadas estão próprias. No entanto, a faixa que vai da Praia do Botes ao Monumento do Jangadeiro, no Mucuripe encontra-se imprópria. Três praias estão localizadas no canteiro da obra de requalificação da Beira-Mar, por isso não tiveram amostras de água do mar colhidas para análise.

No Litoral Oeste da Capital, entre o Centro e a Barra do Ceará, quatro das praias observadas pela Semace estão próprias. De acordo com o boletim, nenhuma praia foi reprovada pela ocorrência de óleo.

Um guia sobre como se proteger do óleo nas praias foi lançado pela Semace. A cartilha tem como objetivo reduzir o risco de contaminação, que pode ocorrer diante do contato ou da ingestão da substância. “Queremos combater a desinformação e os boatos, que podem colocar em risco a saúde das pessoas”, afirmou a superintendente-adjunta no exercício da Superintendência, Virgínia Carvalho. “Com informação certa, todos podem ajudar no esforço de reduzir os efeitos do crime ambiental”, completou.

Vida marinha

O Instituto Verdeluz registrou 37 tartarugas encalhadas desde 1º de setembro, quando as machas começaram a aparecer. Deste número, sete tinham sinais de contato com o óleo. A necrópsia de duas delas indicaram a ingestão da substância. Há ainda uma grande preocupação em relação ao período de desova de tartarugas, que está se aproximando, principalmente na Paria da Sabiaguaba e Praia do Futuro, que são áreas de ocorrência de ninhos.

Na Bahia, O Projeto Tamar suspendeu as solturas de filhotes de tartarugas marinhas nas praias dos municípios de Conde e Jandaíra por causa das manchas que chegaram ao litoral do Estado. “A gente não pode soltar porque não sabemos como está o comportamento do óleo do mar. Os filhotes são mais suscetíveis ao óleo. Se eles interagirem, morrem. Estamos adotando essa medida para que eles não morram. Não existe um prazo para voltar a soltar os animais”, afirmou César Coelho, engenheiro de pesca do projeto.

187 pontos já atingidos no Nordeste

De acordo com o Ibama, as manchas de petróleo cru já atingiram 187 pontos, espalhados por 77 municípios. Os nove estados nordestinos foram afetados.

Em Sergipe, as manchas estão distribuídas em 17 pontos e todas as praias do Estado foram afetadas. Barreiras de contenção serão implementadas em cinco rios do Estado para impedir a entrada das manchas de óleo que afetam praias.

Além de Sergipe, A Bahia também decretou estado de emergência, com o intuito de facilitar a compra de equipamentos para barrar as manchas de óleo, que na última sexta-feira (18) atingiu também a Baía de Todos os Santos e a Ilha de Itaparica, pontos importantes para o turismo do litoral baiano.

Ainda na Bahia, na cidade de Salvador, uma iniciativa da jornalista Indra Soares, intitulada como o movimento #óleonão, realizará, neste domingo (20), um mutirão de sensibilização social para limpeza de praias, com luvas de proteção que serão disponibilizadas. A ação terá concentração a partir das 8h, partindo de Jardim Armação sentido Boca do Rio.

A iniciativa busca conscientizar os moradores e empresários da região sobre o  papel importante de atuar na preservação e proteção dos ecossistemas de forma ativa com ações positivas de engajamento sustentável.

APA da Costa dos Corais é atingida

A Área de Preservação Ambienta (APA) da Costa dos Corais foi afetada em pontos distintos, como a Praia dos Carneiros, no município de Tamandaré (PE) | Foto: Associação para o Desenvolvimento Sustentável da Praia dos Carneiros (Adesc)

Nesta semana, a grande mancha de petróleo cru também atingiu um trecho da Área de Preservação Ambiental (APA) da Costa dos Corais, tida como a maior Unidade de Conservação Marinha Costeira do Brasil. A APA situa-se entre os estados de Pernambuco e Alagoas, e possui mais de 400 mil hectares de área, além de 120 Km de praias e mangues.

A Unidade de Conservação foi afetada em pontos distintos: Praia dos Carneiros, no município de Tamandaré (PE); Foz do Rio Una, em São José da Coroa Grande (PE); Praias do município de Japaratinga (AL); e Maragogi (AL).

Na última quinta-feira (17), 400 metros de barreiras de contenção e de mantas absorventes foram instaladas durante uma força-tarefa na região. As mantas absorventes servem para isolar o óleo ainda em alto mar, absorver e retirá-lo com a ajuda de barcos. Ao todo foram coletados  1.200  Kg de petróleo cru em alto mar, em ação que contou com o apoio de autoridades do governo federal, estadual e municipal, além da Petrobras e Transpetro que disponibilizaram o equipamento.

Barreiras de contenção

O uso de barreiras de contenção para reter o petróleo cru é uma das soluções propostas para impedir que o poluente continue se alastrando e contaminando áreas litorâneas sensíveis como a Reserva Biológica Santa Isabel e o Rio São Francisco. No entanto, a medida pode não alcançar a eficácia pretendida.

O equipamento é composto por uma parte flutuante e outra submersa, chamada saia, que tem a função de conter o óleo superficial, substância que contém a densidade menor que a da água. No entanto, o petróleo que atinge o Nordeste se concentra em camada sub-superficial. Por esse motivo, as manchas não são visualizadas em imagens de satélite, sobrevoos e monitoramentos com sensores para detecção de óleo.

Além disso, barreiras de contenção geralmente são eficazes em correntes com velocidades de até um nó, o equivalente a uma milha náutica por hora. A vazão dos rios é muito superior a essa capacidade.

Nos casos em que o óleo derramado é de origem conhecida e sua dispersão é prevista, a instalação de barreiras em águas calmas é tecnicamente recomendável para proteger pontos sensíveis, como manguezais. Contudo, se os manguezais já estiverem oleados, a medida poderá provocar o efeito inverso e impedir a depuração natural do ambiente.

Por precaução, o Ibama requisitou à Petrobras, mediante ressarcimento, a disponibilização do equipamento. Mais de 200 metros de barreiras estão em Aracaju à disposição de instituições com capacidade operacional para realizar sua instalação e manutenção.

Investigação

Uma análise feita pela Universidade Federal de Sergipe (UFS) aponta que o óleo encontrado dentro de barris descobertos no litoral sergipano é o mesmo das manchas de petróleo cru de origem desconhecida que se espalha pelas praias do Nordeste.

Os barris contêm a inscrição “Argina S3 30”, um lubrificante da marca Shell, além de etiquetas da multinacional de petróleo. Como o que havia dentro deles era óleo cru e não lubrificante, a investigação acredita que os barris foram apenas reaproveitados para o transporte de petróleo cru.

Em nota à imprensa a empresa afirma: “A Shell Brasil esclarece que o conteúdo original dos tambores localizados na Praia da Formosa, no Sergipe, não tem relação com o óleo cru encontrado em diferentes praias da costa brasileira. São tambores de óleo lubrificante para embarcações, produzido fora do País. O Ibama está ciente do caso”.

Inscrições à mão da palavra “ekata”  encontradas nos barris podem ser uma pista sobre a origem do derramamento. “Ekata” poderia ser o nome do navio que transportava os barris. Entretanto, o único petroleiro com esse nome encontra-se no status de “descomissionado (desativado) ou perdido”, segundo o sistema de rastreamento de embarcações Marine Traffic. A última posição conhecida do Navio Ekata é a do porto de Chittagong, em Bangladesh, em 2017.

A Marinha está mobilizando 48 organizações militares, com emprego de 1.583 militares, cinco navios, uma aeronave, além de embarcações e viaturas pertencentes às diversas capitanias dos portos, delegacias e agências, sediadas ao longo do litoral nordestino.

Após uma triagem das informações do tráfego mercante na região, 30 navios-tanque de dez diferentes bandeiras deverão prestar esclarecimentos à Marinha. A intenção é buscar contato com as autoridades competentes dos países dessas bandeiras, com a Organização Marítima Internacional e com a Polícia Federal, visando esclarecer todos os fatos.

A dificuldade encontrada para rastrear a origem das manchas de petróleo reforça a teoria de que um navio ilegal seja o causador do derramamento. No caso, a hipótese refere-se a embarcações que navegam de forma clandestina, sem que os rastreadores estejam ligados. Acredita-se que a circulação desses navios pode ser motivada pelas sanções econômicas dos Estados Unidos à Venezuela.

Origem do Petróleo

Pesquisadores do Instituto de Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) revelaram o resultado de um estudo preliminar que aponta o possível ponto de origem das manchas de petróleo cru. Segundo a pesquisa, o local de origem pode estar cerca de 600 Km a 700 Km do litoral brasileiro, entre Alagoas e Sergipe.

O engenheiro Luiz Landau e o oceanógrafo Luiz Paulo Assad fizeram uma pesquisa de modelo reverso que sai dos locais onde as manchas foram encontradas para rastrear a possível origem do óleo. Com o estudo, foi possível verificar o resultado da atuação de correntes marinhas no Atlântico e chegaram ao possível ponto de origem.

O estudo foi feito a pedido da Marinha com a ajuda de modelos físicos-matemáticos em que são simuladas as condições hidrodinâmicas, que corresponde a ação das correntes marinhas e dos ventos sobre o transporte das manchas de óleo pelo mar.

Sobre a procedência do petróleo, uma análise realizada pelo Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (UFBA) aponta que a substancia teria como origem a Venezuela. A informação foi divulgada pela diretora da entidade, a pesquisadora Olivia Oliveira, durante coletiva de imprensa. A pesquisa foi realizada a partir da avaliação de amostras do petróleo encontrado nas praias da Bahia e de Sergipe.

Os estudos permitiram identificar os biomarcadores, que são compostos químicos que não se decompõem facilmente e referem-se a determinados ambientes sedimentares e eras geológicas. Esse indicador permite identificar o ambiente e o período em que viveram os organismos que deram origem ao petróleo.

Trata-se de um trabalho de geoquímica forense, fundamental para a identificação das características e do local de produção do petróleo. “É como se fosse uma impressão digital do óleo”, explica a professora Olívia Oliveira.

Em parceria com o Laboratório de Isótopos Estáveis (Lise) do Instituto de Física da UFBA, também foram feitas análises da razão isotópica de carbono das amostras de óleo. Os resultados dessas análises geoquímicas foram comparados com resultados de análises de petróleos comuns na literatura e também com os que compõem o Banco de Óleos do Lepetro, que detém um conjunto amostras de óleo de diferentes bacias petrolíferas brasileiras e dos principais países produtores.

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