Esta é a primeira de uma série de matérias produzidas pela Eco Nordeste a partir da participação na Brazil Energy Conference, em Teresina

Impulsionada pela sua forte base de recursos renováveis, como o Sol e o vento, a região Nordeste lidera o processo de transição energética no País com um notável crescimento na aprovação de projetos que reflete o seu potencial natural e o apoio às políticas de descarbonização. Entretanto, sociedade e governantes buscam meios para garantir que essa mudança evite os impactos negativos decorrentes do processo de instalação e funcionamento das usinas e realmente promover o desenvolvimento sustentável.
Os desafios e soluções para a garantia de uma transição energética justa, equânime e sustentável foram debatidos durante a Brazil Energy Conference, realizada entre 4 e 7 de junho, em Teresina, no Piauí. O governador do estado, Rafael Fonteles, destacou que o estado tem se posicionado como um protagonista na transição energética. Ele afirmou a convicção em seu governo de que esse processo é uma grande oportunidade de desenvolvimento econômico, não só para o Piauí, mas para todo o Nordeste, Brasil e mundo.
Fonteles ressaltou a importância do desenvolvimento de capital humano para atuar no processo de transição energética e na transmissão da energia produzida. “O que queremos é que essa oportunidade trazida pela transição energética seja aproveitada pelo nosso povo. E, para que isso aconteça, ele tem que estar capacitado e bem formado para aproveitar as oportunidades que irão surgir; e que possam, também, participar do processo de operação, de pesquisa, desenvolvimento e inovação”, disse o governador.
“Nosso desafio maior não está na geração de energia, mas na transmissão. Nós temos no Brasil um grid todo interconectado, o que é uma vantagem. Ao mesmo tempo, que temos essa abundância de energia, temos que escoar ela para os consumidores que estão em outras regiões. Queremos trazer os grandes consumidores para cá, industrializar o Nordeste e o Piauí”, declarou o governador.
Segundo ele, a continuação do investimento no fortalecimento das linhas de transmissão é considerada uma necessidade por parte do planejamento central do Ministério de Minas e Energias (MME), da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). “Temos recebido incentivos desses órgãos para continuarmos investindo no fortalecimento dessas linhas de transmissão, dessas subestações. Mas, nós queremos que aconteça de maneira ainda mais veloz e robusta”, enfatizou Fonteles.
Em entrevista exclusiva à Eco Nordeste, o secretário de Comunicação do Estado do Piauí, Marcelo Nolleto, detalhou os planos do governo local para garantir que a transição energética no Estado e os investimentos econômicos impulsionados ocorram de maneira sustentável e igualitária.
“São grandes preocupações nossas criar as condições necessárias para que as empresas venham investir no Piauí, mas que elas utilizem a mão de obra e o potencial de fornecedores locais. Nosso objetivo é que o desenvolvimento econômico seja associado à diminuição das desigualdades”, afirmou.

O secretário disse ainda que o governo atual quer atrair os investidores, mas não abrirá mão de que o povo piauiense seja contemplado por estes investimentos. Por isso investe na preparação dos jovens com a universalização das escolas em tempo integral, 530 no total, com o contraturno do Ensino Médio dedicado ao aprendizado técnico e profissionalizante.
“Esse super choque educacional, como estamos chamando esse plano do governo, garantirá que todo estudante, ao sair do ensino médio, terá uma profissão e quem for investir no Piauí encontrará aqui um governo digital, condições favoráveis ao investimento e, sobretudo, profissionais muito bem qualificados. Nossa preocupação é com a atração de investimentos, mas, sobretudo com a diminuição das desigualdades e a melhoria da vida do nosso povo”, destacou o secretário.
Quando questionado sobre a criação de políticas públicas que tornem a produção e acesso à energia limpa justa e equitativa para as comunidades tradicionais e de menor poder aquisitivo, Nolleto afirmou: “o primeiro passo para atingir o objetivo de tornar a energia limpa justa e sustentável para estas populações é o respeito. É delimitar o espaço de vida delas. Segundo, temos ações direcionadas especificamente para a educação, a universalização das escolas em tempo integral também é direcionada, ela respeita as peculiaridades das comunidades”.
O secretário também destacou o respeito e fomento à agricultura familiar, com a criação de condições para que os produtos produzidos por estes produtores sejam melhor beneficiados e escoados.
Confrontado sobre a disparidade de um evento sobre inovações tecnológicas para a produção de energia a partir de fontes renováveis e produção de hidrogênio verde em um Estado que vem investindo pesado em atrair empresas para produzir e escoar essa energia para além das suas divisas, mas que ainda tem aproximadamente 24 mil domicílios que não possuem acesso à energia elétrica, de acordo com o Ministério de Minas e Energia (MME), Nolleto afirmou:
“Essa é uma realidade. Mas seria falso o raciocínio de achar que porque eu tenho no Piauí parte do território sem saneamento básico, nós não devamos investir em energia limpa, nem em inteligência artificial. Nosso pensamento é o de que vamos tentar corrigir as nossas mazelas estruturantes e, concomitantemente, evoluir e incluir essas pessoas todas, sobretudo as que mais precisam, dentro destas políticas públicas que incluem o ensino, o acesso à tecnologia, acesso às energias”.
Para o secretário, o avanço da transição energética no Estado vai permitir dar a essa parcela da população mais acesso à energia e a um custo mais barato. “A gente pode chegar a estas pessoas que ainda não têm (energia), inclusive já com essa energia que é limpa, sem precisar passar pela obra. E todo esse ciclo de desenvolvimento certamente nos trará maiores condições de o Estado fazer mais investimentos”, assegurou Nolleto.
Mitigação de impactos
Para além dos avanços econômicos e sociais a transição energética, urgente e necessária, para combater as mudanças climáticas, reduzir a poluição e promover um futuro sustentável, também tem seu lado negativo, com desafios e impactos negativos potenciais. Dentre eles, os custos iniciais elevados, a necessidade de modernização da infraestrutura, a resistência de setores dependentes de combustíveis fósseis e a possível perda de empregos em setores tradicionais. Além disso, a exploração de recursos para energias renováveis pode gerar impactos ambientais e sociais, como a mineração de metais críticos e o deslocamento de comunidades.
Durante a entrevista à Eco Nordeste, o secretário de Comunicação do Piauí afirmou ser essa uma discussão muito profunda: “temos vários aspectos a serem analisados: se fala na implantação das usinas solares, eólicas, de hidrogênio verde, mas o que eu posso garantir é que nós estaremos muito atentos quanto à construção de tudo isso. Verificaremos esse alinhamento das obras com respeito aos nossos biomas. Nós temos cinco biomas muito bem preservados. Todas as ações passam por licenciamento ambiental. Nossa Secretaria de Meio Ambiente tem estado muito atenta ao uso de tecnologia para verificar os desmatamentos”.
Segundo o secretário, neste momento, por exemplo, a Secretaria de Projetos Especiais e Desenvolvimento (Seped) de Parnaíba acompanha uma supressão vegetal: “essa área de supressão tem sido acompanhada por biólogos que vão na frente das máquinas para ver, cadastrar as espécies e ter o cuidado com o acolhimento dos animais. Nós temos que avançar com toda essa cautela socioambiental. Parece meio contraditório, mas nós estamos na vanguarda do processo de descarbonização, construindo condições de termos energia que vai ser utilizada pelo Brasil e pelo mundo e, nesse processo, nós não podemos descuidar do meio ambiente”.
Aumento populacional
Com a chegada dos novas usinas de energia e do Porto Piauí, a perspectiva do governo é de que haja na região litorânea, mais precisamente no município de Parnaíba, um aumento populacional em torno de 30% a 50% por conta da demanda de trabalho e, segundo o secretário, o Estado está preparado para esse aumento demográfico, com a garantia do acesso a serviços públicos essenciais como saúde, educação, segurança, dentre outros.
“O Piauí inteiro está investindo muito nisso. Provavelmente vai haver essa busca por emprego, não só no litoral, mas também nos demais territórios. Estamos nos preparando para isso com tecnologia. Eu estou lhe falando do governo digital, do Piauí Saúde Digital, a tecnologia como um instrumento de eficiência do gasto público. De prestar um serviço público melhor, de melhor qualidade, a um custo menor”, finalizou o secretário.
* A repórter acompanhou a Brazil Energy Conference a convite dos organizadores do evento