Painéis solares instalados em telhado de hotel, em Sousa (PB). FOTO: Maristela Crispim

 

A região de Sousa, no sertão paraibano, vem se destacando pelo uso da energia solar fotovoltaica, não apenas na cidade, mas em pequenas comunidades rurais

 

Maristela Crispim*

Pombal/Sousa. A 438 quilômetros da capital litorânea, João Pessoa, Sousa, Município do sertão paraibano com quase 70 mil habitantes, tem sido um foco irradiador de desenvolvimento local a partir do trabalho do Comitê de Energia Renovável do Semiárido (Cersa). Cerca de 58 quilômetros separam Sousa de Pombal, primeira parada desta série de reportagens.

Várzea Comprida dos Oliveiras é o nome da localidade onde as mulheres têm feito a diferença. Maria Solange de Oliveira Matos, presidente da Associação Comunitária Rural; e Glauciene Ferreira Freires, à frente da Associação do Bolo das Oliveiras, são protagonistas desta história de sucesso.

Localizada em pleno Semiárido brasileiro, além da irregularidade das chuvas, a comunidade era carente de políticas públicas quando a primeira Associação foi fundada, em 1993. Passo a passo, foi se fortalecendo e, hoje, nenhuma das 67 famílias associadas se encontra em vulnerabilidade social, orgulha-se em destacar Maria Solange.

Entre os destaques na comunidade está a padaria, cuja energia vem de duas fontes: placas solares (eletricidade) e biodigestor (gás). Além disso, o armazenamento da água da chuva por meio de cisternas e o reúso compõem os elementos para a garantia da Sustentabilidade local.

No começo, as mulheres levavam bolos feitos em casa para vender na feira. Mas, aos poucos,  perceberam que a união e a organização poderiam ser benéficas para todas. Com parcerias e alguns apoios, foram trabalhadas a padronização das receitas e a marca.

O fornecimento ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) foi fundamental para esse crescimento. Demandou, a princípio, de 200 a 300 quilos de bolo semanais, fabricados por 16 mulheres. Foram comprados equipamentos, feitos cursos no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). O investimento em qualidade e variedade elevou a produção de 600 quilos semanais.

O uso do biogás produzido a partir do esterco dos próprios animais da comunidade significou um impulso importante para o funcionamento da padaria. Estudante do Campus de Pombal da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Joaquim Souza é o responsável pela implantação e manutenção do equipamento, cujo investimento deve ser pago, no máximo, em três anos. Além do gás, a biomassa vem sendo aproveitada como biofertilizante, explica.

Joaquim Souza é o responsável pela instalação e manutenção do biodigestor da padaria. FOTO: Maristela Crispim

Com os painéis solares, por outro lado, a padaria paga apenas a taxa mínima à concessionária, que é de R$ 92. Para participar da Geração Distribuída, é necessária a instalação de um medidor bidirecional que conta a energia consumida e a injetada no sistema. Neste caso, a estimativa é que o investimento esteja pago em cinco anos.

Estratégia solar para o Semiárido

Integrante do Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social e da Frente por uma nova Política Energética para o Brasil, o Cersa é um coletivo formado por organizações, pesquisadores e colaboradores. Foi criado em 2014, a partir da premissa de que o Semiárido brasileiro dispõe de um dos mais altos índices de insolação do Planeta, o que significa uma privilegiada potencialidade de contribuir com a produção de energia elétrica e térmica solar.

Participante também da coordenação sul americana do Grupo 3 + 1 (Brasil, Bolívia, Peru e Alemanha), sua missão é fazer com que o Sol seja assumido como a principal fonte de energia no Semiárido brasileiro e seu objetivo é promover o uso descentralizado da Energia Solar na região.

O Cersa se encaixou no contexto da campanha Nossa Casa Solar, iniciativa da Frente por uma nova Política Energética para o Brasil, cujo objetivo é promover a compreensão sobre o Sistema de Compensação de Energia Elétrica no Brasil pela mini e microgeração, com foco na energia solar fotovoltaica.

O Sistema é regulado pela Resolução Nº 482, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e permite, desde 2012, que Unidades Consumidoras (UCs) conectadas à rede de distribuição convencional gerem uma parte da energia elétrica da qual necessite a partir de uma mini ou microcentral geradora.

Contexto Semiárido

Semiárido, no Brasil, refere-se a uma região que ocupa cerca de um quinto do território, habitada por 26,62 milhões de pessoas, sendo cerca de 61,97% na área urbana e 38,03% em ambiente rural, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

É importante destacar que os critérios para delimitação do Semiárido são a precipitação pluviométrica média anual igual ou inferior a 800 milímetros; o índice de aridez igual ou inferior a 0,50 e; o percentual diário de déficit hídrico igual ou superior a 60%, considerando todos os dias do ano. Essa delimitação partiu da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), em 2017.

Intercâmbio reúne quatro países

No Campus de Pombal da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) foi implantado um sistema gerador de Energia Solar fotovoltaica para estudos. FOTO: Maristela Crispim

Em um esforço para compartilhar experiências, sob o sol do Nordeste brasileiro, o Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social, do Brasil; Grupo de Trabalho Mudança Climática e Justiça, da Bolívia; o Movimento Cidadão frente ao à Mudança Climática, do Peru; e o Misereor, da Alemanha, articularam uma aliança para a realização do I Curso Internacional de Energias Renováveis, realizado em Cajazeiras (PB), de 10 a 17 de outubro.

O curso de imersão foi uma oportunidade para a troca de experiências entre Brasil, Bolívia, Peru e Alemanha (Grupo 3 + 1) em ações de disseminação e uso de tecnologias em fontes renováveis de energia, em especial a solar fotovoltaica, realizada por comunidades rurais e urbanas do Semiárido paraibano.

* A jornalista viajou à Paraíba a convite da Inter Press Service – News Agency (IPS)

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