Câmara debate contribuição das agências multilaterais para a efetivação do direito à alimentação no Semiárido

Por Verônica Pragana
Da Asacom

Iniciativa acontece após impedimentos aos estados de contraírem empréstimos internacionais para área da agricultura e desenvolvimento rural.

Segundo a ASA, esses apoios são fundamentais para fortalecer a produção agrícola sustentável de base agroecológica, a Convivência com o Semiárido, a implementação de Tecnologias Sustentáveis e iniciativas de Comércio e Mercado Justo da Agricultura Familiar | Foto: Vládia Lima

Recife – PE. Em Brasília, centro político do País, a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados e a Frente Parlamentar em Defesa da Convivência com o Semiárido convocaram uma audiência pública para debater as contribuições das agências multilaterais na efetivação do direito humano à alimentação no Semiárido. A audiência será realizada nesta quarta-feira (2), no plenário 9, do Anexo 2 da Câmara dos Deputados, a partir das 14h.

A audiência se dá após algumas negativas do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão às solicitações de estados do Nordeste, a exemplo do Ceará, de contrair empréstimos junto à agências multilaterais de desenvolvimento para implementar ações de combate à pobreza e de ampliação da segurança alimentar para a população rural do Semiárido.

Os impedimentos estão pautados na retirada dos temas “Agricultura” e “Desenvolvimento Rural” dos assuntos que merecem a tomada de empréstimos internacionais pelos entes federativos. A mudança foi implementada a partir do dia 5 de setembro de 2017, data de publicação no Diário Oficial da União da Resolução Nº 2, assinada pela Comissão de Financiamentos Externos (Cofiex), ligada ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão.

De lá pra cá, cartas consultas para captar recursos junto a agências multilaterais de desenvolvimento, como o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida), voltados para investimentos na Agricultura e no Desenvolvimento Rural foram desaprovados pela Secretaria de Assuntos Internacionais (Seain), também vinculada ao Ministério do Planejamento.

“A partir desta resolução, projetos que trazem como objetivo o investimento em Agricultura e Desenvolvimento Rural passam a receber pontuação “zero” inviabilizando assim a sua aprovação. Desta forma, somente são elegíveis para financiamento projetos de infraestrutura, como os de recursos hídricos, e que tratem de inovação tecnológica e de disseminação de novas tecnologias“, explica o titular da Secretaria de Desenvolvimento Agrário do Ceará (SDA), Francisco de Assis Diniz.

Foi o que aconteceu com o pleito do Governo do Ceará para conseguir, junto ao Fida, o empréstimo de US$ 25 milhões. O montante seria destinado à continuidade do Projeto Paulo Freire, que desenvolve ações e estratégias para a redução da pobreza de famílias agricultoras em situação de vulnerabilidade social e insegurança alimentar. O projeto estava endereçado a 600 comunidades rurais em 31 municípios do Semiárido com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). O Governo do Ceará chegou a modificar a carta consulta e submeteu-a mais uma vez à aprovação da Seain com um segundo retorno negativo.

Segundo dados da Síntese de Indicadores Sociais (SIS) 2018, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Nordeste concentra metade da população pobre do Brasil. Dos 57 milhões de brasileiros em situação de pobreza em 2017, 25,6 milhões de pessoas vivem na região onde se encontra a maior parte do Semiárido.

Audiência pública

Para o presidente da Frente Parlamentar, deputado Carlos Veras (PT-PE), a finalidade da audiência é “demonstrar para o parlamento brasileiro a importância de se manter as políticas públicas de apoio ao Desenvolvimento do Semiárido, assegurando recursos e posições políticas prioritárias”.

O documento de requerimento da audiência, assinado pelo deputado pernambucano, argumenta que há interesse de organismos multilaterais ou agências de governos no Semiárido brasileiro por ser visto “como ambiente favorável ao desenvolvimento de seus programas, seja pelas problemáticas que esse território enfrenta, como os processos de desertificação, seja por suas potencialidades ambientais, como a biodiversidade, a incidência de luz solar, ou mesmo seu potencial produtivo e inovador.”

Para Claus Reiner, diretor do Fida no Brasil, que confirmou participação no evento, “essa audiência vem no momento oportuno porque o desenvolvimento desigual e as Mudanças Climáticas precisam de uma resposta política e alianças fortes”. E assegura: “O Fida oferece a experiência e os recursos dele para fazer parte dessa resposta”.

Alexandre Pires, da coordenação executiva da Articulação Semiárido (ASA), uma rede de organizações que atua no Semiárido há 20 anos, reconhece que os investimentos feitos, sobretudo pelo Fida, em ações de Desenvolvimento Local, são fundamentais para a fortalecer a produção agrícola sustentável de base agroecológica, a Convivência com o Semiárido, a implementação de Tecnologias Sustentáveis e iniciativas de Comércio e Mercado Justo da Agricultura Familiar.

Ele acrescenta que estes financiamentos, somados às políticas públicas e investimentos do governo brasileiro, estavam garantindo direitos como o acesso à água para milhões de pessoas no Semiárido, a assistência técnica, a compra institucional da Agricultura Familiar e o programa de distribuição de renda, o Bolsa Família. “Esse conjunto de iniciativas contribuiu, significativamente, para a retirada do Brasil do Mapa da Fome e a ampliação dos níveis de segurança alimentar e nutricional da população do Semiárido”, afirma Pires.

Para ele, a redução de investimentos por parte destes órgãos multilaterais é grave. “Isso nos preocupa enquanto ASA porque, além da redução das políticas públicas brasileiras para estas iniciativas que estavam em curso, também temos uma redução de investimentos por parte destas agências e bancos de financiamento”.

Foram convidados para a audiência representantes das seguintes instituições de financiamento, além do Fida: Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Fundo das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), Banco Mundial, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (Iica), Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD).

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