Por Márcia Dementshuk
Colaboradora
João Pessoa – PB. Notícias sobre desmatamento em florestas são mais comuns de serem encontradas e geralmente abordam as ameaças desse fato ao aumento do aquecimento global. Por outro lado, pouco é dito na imprensa sobre o papel do oceano para o equilíbrio dos gases atmosféricos. O oceano retira o CO2 do ar e o mantém nas profundezas; atua como um regulador do sistema climático e promove um ambiente apropriado para a vida em quase toda a superfície da Terra. Só isso já justificaria o apoio a projetos de restauração e conservação dos ambientes marinhos. Mas os argumentos se acentuam quando se acrescentam valores sociais e econômicos.
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Essa é a dimensão da pesquisa “Restauração ecológica de corais”, realizada pela bióloga marinha Karina Massei, em nível de pós-doutorado, pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Conta com parceiros da iniciativa privada, de organizações não governamentais, de moradores locais e com apoio do Governo do Estado da Paraíba por meio do Programa de Bolsas de Pesquisa de Pós-Graduação, da Fundação de Apoio à Pesquisa da Paraíba (Fapesq).
O campo experimental é formado pelas piscinas naturais do Seixas, em João Pessoa; abre oportunidades para ampliação do turismo sustentável e pedagógico; promove a economia, desenvolve a pesquisa em biotecnologia; envolve moradores locais que trabalham com a pesca e com o turismo, a comunidade científica, gestores públicos, órgãos como a Capitania dos Portos da Paraíba, a Polícia Militar, a PBTur, estudantes, entre outros. Um esforço conjunto canalizado para a conservação marinha.
Ao longo dos anos o oceano vem absorvendo volumes cada vez maiores de dióxido de carbono (CO2) e, por isso, a água tem se tornado mais ácida, o que influencia na saúde de animais e vegetais marinhos. Isso é observado nas piscinas do Seixas, tanto pelos pesquisadores quanto pelas pessoas que frequentam o local há anos, como Daniel Virgílio Basílio Crispim da Silva, guia turístico náutico, pescador que atua no Seixas desde 1998.
“Eu nunca tinha visto tantos corais branqueando ao mesmo tempo e num espaço tão curto de tempo. Havia, mas era uma pontinha aqui, outra ali. De 2020 para cá, foi repentino. Tem uma espécie específica de coral que está morrendo em massa. É o que chamamos de tapitanga (Millepora alcicornis). E eles atraem os peixes, lagostas, polvos. Agora não encontramos mais algumas espécies de peixes que estavam aqui em 2019”, diz Daniel, alarmado.
O guia turístico Daniel e colegas que trabalham no Seixas estão engajados no projeto de pesquisa para a restauração ecológica de corais porque têm esperança de que essas espécies retornem ao habitat. “Além disso, o turista só retorna ou indica o passeio quando ele comprova que os prestadores de serviço estão engajados na conservação do ambiente”.
Segundo Daniel, 12 catamarãs com capacidade média de 100 pessoas se distribuem pelas piscinas do Seixas em dias de maré baixa. Esse é um dos fatores que contribui para a degradação, conforme aponta Karina Massei. Mas há outros: “Há um consenso entre os pesquisadores de que o branqueamento dos corais ocorre porque o coral sofre com o aumento da temperatura da água e desprende uma microalga que lhe fornece nutrientes e a cor. Também, pelo oceano estar mais sobrecarregado de gás carbono, ele está mais ácido, o que atinge os corais e outros animais. Por isso estamos vendo o branqueamento em massa desde 2020, a demora para esses corais se recuperarem e, infelizmente, a morte de muitos deles”.
É neste apelo que a pesquisa científica se insere. Há alguns dias, foram implantados no recife, simbolicamente, protótipos de bioatrator de corais – fragmentos de recifes manipulados biologicamente que servirão de base para a colonização de corais. Um marco para um trabalho cuja intenção vai além de conservar a vida nos recifes do Seixas. É mostrar que estamos, todos e todas, em uma via de mão dupla: “enfrentar as mudanças climáticas é fundamental para o oceano; e protegê-lo também é fundamental para regular o clima no Planeta”.
Novas colônias
Um dos produtos que a pesquisa científica realizada por Karina Massei, executada no âmbito do Programa de Ecologia e Monitoramento Ambiental (PPGEMA) / UFPB Rio Tinto e supervisionada pela professora doutora Cristiane Sassi, é o Bioatrator Recifal Multifuncional. São suportes feitos com o rejeito do marisco processado com cimento de sílica (ecológico). O material é compactado dentro de uma estrutura estilizada e produzida por impressora 3D.
Nesta estrutura estilizada são encaixadas peças menores, onde estão os fragmentos de corais transplantados. A área da instalação a unidade amostral do projeto, nas piscinas naturais do Seixas, foi tema da tese de doutorado da bióloga. Foram realizados, portanto, estudos prévios necessários (geomorfologia, levantamento da fauna e flora, caracterização socioambiental da área).
Os bioatratores serão monitorados quinzenalmente, sendo os dados inseridos na plataforma aberta www.sisfaumar.com, já em operação.
Em formas artísticas, os bioatratores têm como principal matéria-prima as conchas de mariscos, são descartadas constantemente depois da retirada do marisco para alimento. Terão um destino mais nobre ao compor a base natural que vai sustentar o fragmento coral. As estátuas submersas, onde os corais crescerão, serão uma atração turística diferenciada e oportunidade para Educação Ambiental. Irão melhorar os habitats marinhos e expandir as populações pesqueiras, o que deve proporcionar oportunidades criativas, econômicas e de captura de carbono da atmosfera.
Globalmente, existem projetos similares que utilizam diversas biotecnologias. O desafio no Brasil, é adaptar para as nossas espécies, que são endêmicas. Neste sentido, existe um projeto, em Porto de Galinhas, que tem sido base para a pesquisa na Paraíba.
Primeiros fragmentos
O dia em que os primeiros fragmentos de recifes manipulados biologicamente seriam colocados no mar do Seixas amanheceu chuvoso. A implantação da pesquisa integrava as atividades da Semana do Consumidor Consciente promovidas pelo Procon-PB, em alusão ao Dia da Água.
As pessoas seriam recebidas no Espaço Oceano, um local em frente ao mar, na Praia do Seixas, que agrega atividades náuticas e de pesquisa científica. Estavam presentes representantes da Superintendência do Meio Ambiente da Paraíba (Sudema); da Defensoria Pública da Paraíba; da PBTur; de ONGs; o capitão-de-fragata Erijansen de Souza Maciel, da Capitania dos Portos da Paraíba; o presidente da Fapesq-PB, Roberto Germano; o secretário-executivo da Ciência e Tecnologia da Paraíba, Rubens Freire; Késsia Liliana Dantas Bezerra Cavalcanti, superintendente do Procon-PB; o coronel Tibério, do Estado Maior da Polícia Militar da Paraíba; a coordenadora do curso de Medicina Veterinária do Centro Universitário Maurício de Nassau, Patrícia Oliveira; apoiadores da iniciativa privada e amigos.
A chuva que poderia atrapalhar caiu timidamente e recuou. No mar, o presidente da Fapesq, Roberto Germano, foi um dos convidados para implantar um dos fragmentos: “Só quando estamos aqui entendemos o impacto global que tem uma ação como esta. A Paraíba, com o litoral que tem, requer pesquisas científicas nesse nível”, afirmou. Christina Vasconcelos, coordenadora de Estudos Ambientais da Sudema, Alexsandro Batista, líder do Grupo CaiaquePB, e Daniel Crispim da Silva implantaram fragmentos de corais no recife.