Dizia o filósofo alemão Immanuel Kant: duas coisas me impressionam, o céu estrelado sobre mim e a lei moral dentro de mim. Ele, sem dúvida, não estava pensando no homem do sertão do Brasil, mas na espécie humana como um todo. Qualquer pessoa da espécie humana, esteja onde estiver.
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Na caatinga, o que não faltam são estrelas nas noites sem lua. Imagino um homem ou uma mulher deitada no chão descoberto, olhando as estrelas. Elas lhe dirão o quanto somos pequenos, insignificantes. Muitos imaginarão que aquilo é o próprio céu, onde mora o criador e para onde iremos. Cada um tem as suas crenças.
E a lei moral dentro de mim?
Posso olhar para o meu interior e sentir que existo, que penso. Aquilo que pensa o sertanejo é, sem dúvida, produto da sua cultura. Muitos pensarão que estão aqui por causa de um projeto divino, que vão morar naquele céu estrelado ou, se forem maus, poderão arder no inferno pela eternidade. Pelo menos é isso que diziam a patroa e o padre que vinha rezar missa, de tempos em tempos.
Alguns poucos podiam ir mais além e perguntar: por que estou aqui? Tudo isso tem algum sentido?
Uma outra forma de dizer a mesma coisa foi inventada, acho, pelo escritor Josué Montello, quando escreveu um livro chamado “Memórias Póstumas de Machado de Assis”. Ele disse que a existência do homem tem dois momentos. Um é quando nasce e descobre o mundo. Antes disso não havia nada, agora existe tudo isso aí para ser conhecido. Outro é quando vive e acumula experiências (suas ou dos outros).
Claro, na experiência vem toda a cultura específica de cada povo, mas as questões básicas continuam semelhantes.
Nisso, o homem da caatinga não difere do homem de outros lugares. Quem é o homem da caatinga? Ele descende de três ramos principais: os portugueses que vieram para cá há muitos e muitos anos; os negros que trabalhavam como escravos nas fazendas, nas paróquias e nos serviços; e os indígenas, que forneceram o padrão típico do nordestino. Eles se esqueceram dessas origens e se misturaram na cultura nordestina, carregada de religiosidade, enfeitada pelo bumba-meu-boi e outras brincadeiras, com experiências trazidas por cada grupo. Alguns gastavam toda a sua vida no mesmo local, que passava a ser o seu universo. O meu pai, por exemplo, nunca saiu do Ceará, nunca andou de avião, tinha o sertão como o universo dele.
Apesar de tão separados, os nordestinos e sertanejos não eram únicos no mundo. Claro, não eram iguais. Poderiam ter as suas diferenças de cor da pele, de educação, de inteligência individual, mas poderiam também ter as suas exceções, aquelas pessoas extremamente inteligentes que, se tivessem oportunidade, poderiam fazer descobertas maravilhosas.
Tudo isso para dizer que o homem sertanejo é feito do mesmo barro que o ser humano brasileiro, americano, europeu ou asiático. O que muda, basicamente, é a cultura de cada um, o meio em que cada um habita. As grandes coisas que causam sua admiração são aquelas que o filósofo alemão colocou.
O céu estrelado, que está fora de mim, e a lei moral, que está dentro de mim.