Por Verônica Falcão
Colaboradora

O manguezal da Resex Rio Formoso inclui o estuário de três rios: Formoso, dos Passos e Ariquindá | Fotos: Enrico Marone / Marcos Rosa

Rio Formoso / Sirinhaém / Tamandaré – PE. No Dia Internacional para Conservação do Manguezal, 26 de julho, representantes de pescadores do Litoral Sul de Pernambuco protocolaram, junto à Secretaria Estadual e Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), estudos técnicos para subsidiar a criação de Reserva Extrativista na região. Aproveitando a data, instituições da sociedade civil, governamentais e de pesquisa lançam campanha em defesa da criação da Resex Rio Formoso. A iniciativa tem o apoio de artistas como Aninha Martins (Una), Banda Eddie, Claudio Rabeca, Isaar, Isadora Melo, Luccas Maia, Mulungu, Rogerman (Bonsucesso Samba Clube), Siba, Tibério Azul e Zé Manoel.

Entidades que propõem a criação da Resex Rio Formoso estimam que 2.615,91 hectares de manguezal são utilizados por 2.355 pescadores artesanais e 80 famílias remanescentes de quilombos. A reserva extrativista garantirá o uso de forma sustentável dos recursos pesqueiros e a manutenção do modo de vida dessas pessoas.

Além de prover alimento e fonte de renda para quem vive do extrativismo, o manguezal é considerado um ecossistema fundamental para a manutenção da biodiversidade oceânica, uma vez que funciona como berçário de espécies marinhas. Uma delas, ameaçada de extinção e protegida por lei desde 2002, é emblemática: o mero, vive até 40 anos e atinge mais de 2 metros, tendo o início de seu ciclo de vida associado aos manguezais. Os cientistas o chamam de Epinephelus itajara, uma referência ao nome em tupi – itajara –, que significa senhor das pedras.

Outras duas características do manguezal que justificam a proteção desse ambiente: amenizar os efeitos das enchentes na região costeira e contribuir para a redução do efeito estufa, pois retém gás carbônico.

O manguezal da Resex Rio Formoso inclui o estuário de três rios: Formoso, dos Passos e Ariquindá. Embora a pesca artesanal seja a principal atividade da região, as populações tradicionais também praticam a agricultura familiar, também permitida pela legislação que regulamenta as Reservas Extrativistas.

A ideia de criar a Resex Rio Formoso surgiu há mais de 10 anos, a partir de um abaixo-assinado elaborado por entidades de pescadores. Nos últimos cinco anos o assunto foi retomado e, em janeiro deste ano, começaram a ocorrer reuniões. São três Colônias de Pesca envolvidas – Z5 (Tamandaré), Z6 (Barra de Sirinhaém) e Z7 (Rio Formoso -, além do Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP) e da Associação Mangue Verde, de Sirinhaém; e a Associação da Comunidade Quilombola do Engenho Siqueira, em Rio Formoso.

Os estudos técnicos que subsidiam a proposta foram apoiados pela ONG Rare Brasil, o Programa Ecológico de Longa Duração Tamandaré Sustentável (Peld Tams), o Departamento de Oceanografia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), o Instituto Recifes Costeiros – ONG com sede em Tamandaré, o Projeto Meros do Brasil e Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Marinha do Nordeste (Cepene) / Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

O educador social do CPP Severino Santos explica que, ao criar uma Resex, o Estado protege os meios de vida e a cultura das populações tradicionais extrativistas: “Dessa forma, assegura o uso sustentável dos recursos naturais do território historicamente explorado por essas pessoas.” Ele lembra que o manguezal é considerado área pública, sendo definido na Constituição como bem da União.

Entidades que propõem a criação da Resex Rio Formoso estimam que 2.615,91 hectares de manguezal são utilizados por 2.355 pescadores artesanais e 80 famílias remanescentes de quilombos | Foto: Moacir Santana

No dia 21 de julho, prefeituras dos três municípios envolvidos na criação da Resex manifestaram apoio à iniciativa em reunião realizada no Cepene, em Tamandaré, com representantes dos pescadores e das instituições envolvidas. No encontro, representantes do poder público municipal consideraram que a proteção do meio ambiente e dos direitos das comunidades tradicionais é um princípio fundamental a ser respeitado no processo de desenvolvimento dos municípios. Participaram integrantes de colônias de pescadores, CPP, Associação do Quilombo Engenho Siqueira, Departamento de Oceanografia da UFPE, ICMBio e da Secretaria de Pesca e Aquicultura do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

Entre as questões levantadas na reunião estavam a importância da fiscalização ambiental e a necessidade de conciliar as atividades turísticas com a preservação da natureza e com a pesca.

Área proposta
2.615,91 hectares de manguezal

Área  por município (hectares)
Sirinhaém – 1731,69
Tamandaré – 141,25
Rio Formoso – 742,96

Pescadores por município
Sirinhaém – 1.418
Tamandaré – 511
Rio Formoso- 426

O Dia do Manguezal

A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) estabeleceu, em 6 de novembro de 2015, 26 de julho como o Dia Internacional para a Conservação do Ecossistema Manguezal. Nessa data é lembrada a morte, em 1998, do ativista do Greenpeace de nacionalidade micronésia Hayhow Daniel Nanoto, durante um protesto em Muisne, no Equador. Em 2000, o País passou a celebrar na mesma data o Dia de Defesa do Mangue. O mundo comemorou pela primeira vez o Dia do Manguezal em 2016.

As Vozes do Mar

A iniciativa As Vozes do Mar reúne cantores de Pernambuco que gravaram músicas que mencionam o mar ou o pescador, como Isaar, Luccas Maia e a Banda Eddie | Fotos: Humberto Reis / Bruna Valena / Clara Gouveia

A iniciativa As Vozes do Mar reúne cantores de Pernambuco que gravaram músicas que mencionam o mar ou o pescador. A seleção está em quatro plataformas: Instagram, Spotify e Youtube (@asvozesdomar), além do Facebook (@umoceanodecultura) e faz parte do Projeto Um Oceano de Cultura, capitaneado pelas instituições que apoiaram a elaboração dos estudos técnicos para a criação da Resex Rio Formoso.

A motivação é celebrar a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável, instituída pela ONU e comemorada em todo o mundo de 2021 a 2030. O objetivo da ONU é conscientizar a população sobre a importância dos oceanos e mobilizar atores públicos, privados e da sociedade civil organizada em ações que favoreçam a saúde e a sustentabilidade dos mares.

O Projeto Um Oceano de Cultura, a ser implantado até 2030, pretende se desdobrar em As vozes do mar, um encontro do oceano com a música; As linhas do mar, um encontro do oceano com a poesia; As luzes do mar, um encontro do oceano com a fotografia; As cenas do mar, um encontro do oceano com o cinema; As cores do mar, um encontro do oceano com a pintura; As formas do mar, um encontro do oceano com a escultura; Os movimentos do mar, um encontro do oceano com a dança; Os sabores do mar, um encontro do oceano com a culinária.

A pesquisa musical que fundamentou As Vozes do Mar resultou até o momento na seleção de 44 faixas de 19 artistas e bandas locais: Almério, Banda Eddie, Bonsucesso Samba Clube, Claudio Rabeca, Isadora Melo, Isaar, Ivan Morais, Juliano Holanda, Léo da Bodega, Luccas Maia, Marcello Rangel, Martins, Monbojó, Mulungu, Samico, Siba, Sofia Freire, Tibério Azul, Zé Manoel. Esses artistas estão sendo convidados a usarem suas vozes em defesa da conservação dos mares, oceanos e zonas costeiras.

Pernambuco e o Recife têm o mar como origem dos próprios nomes. O do Estado, herança dos indígenas que antes da colonização já habitavam o litoral nordestino; o da capital, uma marca da ocupação portuguesa. Derivado do tupi paranã-buca, Pernambuco quer dizer furo de mar. Já Recife é procedente do termo árabe ar-raSîf, que significa calçada do mar.

O Peld TAMS, o Cepene e o Instituto Recifes Costeiros acreditam que a música pode ser utilizada como um instrumento de sensibilização e os artistas assumirem o papel de porta-vozes da causa conservacionista marinha e costeira.

As três instituições atuam ao Sul de Pernambuco, nos municípios de Rio Formoso, São José da Coroa Grande, Sirinhaém e Tamandaré. No local são encontradas 10 das 15 espécies formadoras de recifes de coral do Brasil. Diferente dos recifes de arenito, estruturas geológicas que demarcam antigas linhas de praia, os recifes de coral são organismos vivos que contribuem para a manutenção da biodiversidade no ambiente costeiro. Servem de abrigo e alimento para muitas espécies.

Os recifes de coral representam, em relação à manutenção da biodiversidade e absorção do gás carbônico da atmosfera, uma imensa floresta tropical submersa.

Atualmente, entre as ameaças estão o aquecimento global, resíduos agroindustriais, pesca excessiva e as consequências do turismo de massa desordenado (pisoteio dos corais e a poluição sonora marinha provocada pelas embarcações). E, mais recentemente, o vazamento de navios petroleiros e o descarte inadequado de resíduos plásticos.

Uma das ações em prol da conservação e uso sustentável da região foi o fechamento, desde 1999, de um trecho de mar ao turismo e à pesca. O estabelecimento dessa área de exclusão tem permitido a manutenção da biodiversidade, inclusive de espécies que servem de alimento e geração de renda para a população local, além de se constituir num laboratório natural para pesquisas científicas.

Tamandaré Sustentável

Financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) / Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), dentro do Programa Ecológico de Longa Duração, o Peld TAMS é ligado ao Departamento de Oceanografia da UFPE e conta com uma rede de pesquisadores de diferentes instituições do País e do exterior. Está focado na pesquisa e na conservação de 216 mil hectares de paisagem marinha que abrange praias, manguezais, recifes de corais e a plataforma continental (extensão submersa do continente), tendo como sede o município de Tamandaré, Litoral Sul de Pernambuco.

Instituto Recifes Costeiros

Fundado em 2001, o Ircos desenvolve atividades de conservação e uso sustentável dos ecossistemas costeiros e marinhos. Sua atuação abrange uma Área de Proteção Ambiental (APA) Federal Costa dos Corais – e duas estaduais – Guadalupe e Recifes Serrambi -, além do Parque Natural Municipal do Forte de Tamandaré.

Pesquisa e Conservação da
Biodiversidade Marinha do Nordeste

Vinculado ao ICMBio, do Ministério do Meio Ambiente (MMA), o Cepene realiza atividades de pesquisa, formação e ações de manejo para a conservação, uso sustentável e recuperação das espécies e ecossistemas marinhos e estuarinos no Nordeste brasileiro. O Cepene também atua no desenvolvimento de pesquisa relacionada à criação, implementação e gestão de unidades de conservação federais marinhas do Nordeste.

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