Por Alice Sales
Colaboradora
Amontada – CE. Moradores da localidade de Icaraí de Amontada, no litoral oeste do Estado, denunciam mais uma vez intervenções prejudiciais em dunas nas imediações da Praia de Moitas. Isso após três meses de a comunidade se mobilizar contra a presença de tratores destruindo as dunas, sem autorização legal para a realização da obra. As denunciais são feitas pelo coletivo “Salve o Cascudo do Fogo” (@salveocascudo), a fim de preservar uma Área de Preservação Permanente (APP) de grande importância socioambiental.
Segundo relatos de moradores locais, na tarde da última segunda-feira (27), uma retroescavadeira e um caminhão foram vistos fazendo o desmonte de uma duna situada no estuário do Rio Aracatiaçu. Denúncias foram feitas por parte da comunidade aos órgãos competentes, que investigam o crime ambiental de autoria desconhecida, até o momento.
Denúncia e Investigação
Na última terça-feira (28) o, presidente da Comissão de Direito Ambiental da Ordem dos Advogados do Brasil do Estado do Ceará (OAB-CE), João Alfredo Telles Melo, encaminhou uma denúncia sobre o caso ao Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), por meio do Centro de Apoio Operacional de Proteção à Ecologia, Meio Ambiente, Urbanismo, Paisagismo e Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural do MPCE (Caomace).
Ao encaminhar a denúncia, João Alfredo Teles Melo, reivindica as providências necessárias para a adoção das medidas administrativas e judiciais cabíveis para o caso, tanto no sentido de interromper o desmonte da duna, como também apurar as responsabilidades civil, administrativa e penal dos autores da degradação.
Como resposta à denúncia do presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB-CE, o Comaece/MPCE instaurou o Protocolo SAJ MP nº 02.2020.00037483-6, a ser encaminhado à Promotoria de Justiça de Amontada para a adoção de providências, visto que Centros de Apoio são impedidos da prática de atos de execução próprios de Promotorias de Justiça (art. 78, inciso VI/LC nº 72/2008).
Em Nota enviada à Agência Eco Nordeste, a Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace) informou que “não atua em demandas de fiscalização, em ocorrências de impacto local, quando o município tem órgão ambiental fiscalizador, como é o caso de Amontada. A Semace foi informada de uma ação executada pelo ente municipal, em abril de 2020, que culminou com a aplicação de multa e embargo da área”.
A Superintendência foi informada que o Batalhão da Polícia de Meio Ambiente (BPMA) esteve no local da ocorrência na última quarta-feira (29) e não verificou a retirada areia ou outra intervenção no local.
Já a Autarquia do Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de Amontada, representada pela diretora Maria Gorete Marques, informou à Agencia Eco Nordeste que o órgão tomou conhecimento dessa ocorrência por meio das redes sociais e está buscando localizar o infrator para tomar as providências cabíveis.
“Já fui duas vezes ao local e no momento não encontramos, mas já tenho informações de quem possa ser. No momento e só especulação. Nada ainda de concreto”, afirma a diretora da Autarquia.
As dunas de Icaraizinho
Prestadoras de diversos serviços ambientais à população e à biodiversidade da região, as dunas móveis fornecem sedimento que alimenta a faixa de praia e combate o avanço do mar na faixa de praia. Elas filtram e abastecem o lençol freático, sendo importantes para a reprodução de diversas espécies, além de delimitarem o leito do Rio Aracatiaçu, evitando assim que a água do rio invada as casas de moradores de Moitas.
Segundo o geólogo Jeovah Meireles, professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC), as dunas móveis que alcançam as margens dos rios e dos lagos são fundamentais para aportar sedimentos, que, ao atingir o rio, são levados para a faixa de praia, protegendo a praia contra erosões e o aumento do nível do mar. “Esse é um importante processo geomorfológico dinâmico envolvendo as dunas, estuários e faixas de praia,” destaca.
Além disso, Meireles ressalta que os tratores, ao retirarem areia das dunas, alteram o nível do lençol freático e, consequentemente, agem de modo a gerar impactos ambientais negativos sobre a água mineral subterrânea, que é extremamente estratégica para as comunidades que se beneficiam desse recurso.
O geólogo aponta como uns dos impactos negativos que podem ser gerados por esse tipo de intervenção: a alteração da geomorfologia natural das dunas móveis, bloqueio entre as dunas e o rio, promovendo déficit de sedimentos, alteração do lençol freático, além de um grande impacto no turismo da região.
Consideradas como um dos destinos paradisíacos do litoral cearense, as praias de Amontada são procuradas por turistas que buscam por belezas naturais e áreas preservadas. As dunas possuem grande relevância para o ecoturismo da região e para a garantia do sustento de diversas famílias que prestam serviços ao setor turístico.
Movimento Salve o Cascudo do Fogo
O coletivo Salve o Cascudo do Fogo surgiu para denunciar o desmonte da paleoduna conhecida como Cascudo do Fogo, situada em Icaraizinho de Amontada, e que há três meses sofreu intervenções de terraplanagem. O perfil do coletivo no Instagram também já denunciou interferências na APP, região com função ambiental de preservação de recursos hídricos, geológicos e de paisagem.