Resultados, ainda preliminares, foram apresentados em seminário do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) no dia 11 de maio, a partir de 18 projetos contratados por meio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Por Verônica Falcão
Colaboradora
Entre os organismos em que foram detectadas partículas de petróleo cru estão larvas de caranguejo e microcrustáceos | Imagens: Claudeilton Santana / Renata Campelo
Recife – PE. Quase dois anos após o derramamento de petróleo cru no litoral do Nordeste e do Sudeste brasileiros, fragmentos da substância persistem no meio ambiente costeiro, tendo sido encontrados nas praias e estuários por pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Os resultados, alguns ainda preliminares, foram apresentados no dia 11 de maio, em seminário do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). O Seminário de Monitoramento Marco 01 do Programa Ciência no Mar – Gestão de Riscos e Desastres reuniu dados de 18 projetos de pesquisa contratados pelo MCTI, por meio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), em resposta ao desastre do derramamento de óleo que atingiu a costa brasileira no segundo semestre de 2019.
O levantamento da UFPE envolveu laboratórios do Departamento de Oceanografia e contou com a colaboração de instituições como a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). Entre os organismos em que foram detectadas partículas de petróleo cru estão microcrustáceos e larvas de caranguejo. Isso porque houve biodisponibilização dos fragmentos de óleo bruto para o zooplâncton – pequenos animais que vivem dispersos na água e se constituem na base da cadeia alimentar. O trabalho incluiu medição, quantificação e registro fotográfico.
A pesquisa identificou ainda a presença de contaminantes do óleo bruto na água e em sedimentos de praias estuarinas, principalmente naquelas localizadas perto da Foz do Rio Formoso. Areia coletada na Praia da Pedra, no município de Tamandaré, Litoral Sul de Pernambuco, apresentou níveis moderados de contaminação, tanto na superfície quanto em profundidades de 2 a 6 centímetros.
Manchas de óleo recolhidas nessa praia, mesmo depois do intemperismo natural, ainda apresentam altas concentrações de hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPA), composto derivado do petróleo que é reconhecidamente carcinogênico e mutagênico.
“O efeito tóxico desse óleo ainda é perceptível, embora em menor grau, quando comparado à situação em março de 2020”, diz uma das pesquisadoras envolvidas, Lília Pereira de Souza Santos, do Departamento de Oceanografia da UFPE.
No manguezal, um ecossistema associado ao estuário, os fragmentos de óleo afetaram a vida aquática. Na desembocadura do Rio Mamucabas, no Litoral Sul de Pernambuco, minúsculos fragmentos de óleo cru foram observados em larvas de microcrustáceos que podem ter tido seu desenvolvimento afetado pelo contaminante.
O local está na área de estudo do Programa Ecológico de Longa Duração Tamandaré Sustentável (PeldTams). O programa é vinculado ao CNPq-MCTI e conta com a parceria do Cepene-ICMBio e Fundo Toyota / SOS Mata Atlântica. A coordenadora do projeto, Beatrice Padovani Ferreira, alerta para a possibilidade de a contaminação persistir por tempo indeterminado na região. “Há registros históricos de impactos e monitoramentos cientificamente documentados em que os danos foram registrados até 12 anos após o evento”, informa.
Foi verificado aumento da bioconcentração de hidrocarbonetos policíclicos aromáticos na bile e alterações em biomarcadores bioquímicos no peixe donzela (Stegastes fuscus) em 5 áreas recifais ao longo do litoral após a chegada do óleo. Nas Praias do Paiva e de Suape as alterações foram mais significativas e estão em curso projetos para acompanhar esses parâmetros após o derramamento.
Desastre
O derramamento de óleo cru que atingiu a costa brasileira no segundo semestre de 2019 afetou, segundo dados do MCTI, mais de 2,5 mil quilômetros de litoral em todos os nove estados do Nordeste e dois da Região Sudeste (Espírito Santo e Rio de Janeiro).
O derramamento deixou uma trilha tóxica por milhares de quilômetros impactando diversos ecossistemas e organismos a eles associados: praias, costões rochosos, manguezais, pradarias marinhas, estuários, arrecifes e corais. O MCTI lembrou, em comunicado, que o óleo também atingiu algumas das praias turísticas mais frequentadas na área, afetando toda a cadeia de turismo e pesca, com graves consequências econômicas e sociais no litoral.
Os 18 projetos de gestão de risco e desastre contratados para o enfrentamento ao derramamento de óleo fazem parte de um portfólio de projetos do Programa Ciência no Mar, desenvolvido pelo MCTI em parceria com os estados, Marinha do Brasil, CNPq e Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). O Programa foi lançado em novembro de 2019 e oficializado pela Portaria 4.719, de 5 de maio de 2021.
De acordo com o MCTI, é um programa de gestão da ciência brasileira relacionada ao oceano, com duração prevista até 2030, que se organiza em seis linhas temáticas transversais e trabalhadas de forma sistêmica, integrada e em interface com a Década da Ciência Oceânica e com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Entre as linhas temáticas, está a gestão de riscos e desastres, como por exemplo as ações relacionadas ao derramamento do óleo de 2019.
Se esses caranguejos e outras espécies da fauna marinha, que estão convivendo com partículas de petróleo cru, conseguem se desenvolver e de alguma maneira vão parar na alimentação das pessoas, qual o impacto a longo prazo? E por quanto tempo esse fenômeno persistirá?
O futuro não será menos complicado que o momento em que estamos. Por isso, nós que temos o voto como ferramenta democrática, temos que ter cada vez mais consciência da relevância de nossas escolhas.
Lamentavelmente os danos serão persistentes por anos e anos.
#ForaBolsonaroGenocida