Espelho d'água azul escuro com estruturas de concreto e pequeno morro pedregoso ao fundo com céu azul claro e poucas nuvens brancas
O Açude de Orós ou Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira fica no leito do Rio Jaguaribe, no Centro-Sul do Ceará, e foi inaugurado em janeiro de 1961 | Foto: Honório Barbosa
Homem branco de cabelos brancos usando óculos de armação de metal quadrada, camisa xadrez e casaco preto
Antônio Rocha Magalhães é economista e foi secretário de Planejamento do Governo do Ceará

Por Antonio Rocha Magalhães
Economista
Ex-Secretário de Planejamento do Ceará
armagalhaes@gmail.com

Tenho falado aqui neste espaço sobre aspectos ligados à Caatinga, especialmente em relação às minhas memórias de catingueiro. Não me debrucei apenas sobre os aspectos folclóricos da Caatinga, as histórias que me marcaram o espírito ao longo do tempo, a exemplo das grandes assombrações que havia quando alguém passava no escuro, à noite, sob grandes pés de oiticica. De coração na mão, ouvindo os próprios passos como se fossem de alguém que me seguia, não havia outro remédio senão correr desenfreadamente, até sair da zona de perigo.

Hoje quero começar a falar de saídas. Este e os próximos dois artigos apresentam três tipos de saída: a acumulação de recursos hídricos, o crescimento da agricultura e a melhoria na qualidade dos recursos humanos.

Ao longo da história, especialmente a partir do século passado, muitas tentativas e muitas propostas houve em relação ao desenvolvimento da região semiárida. A preocupação sempre foi a de procurar soluções para reduzir a desigualdade, erradicar a pobreza, tornar o Nordeste uma economia dinâmica. Os resultados deixaram a desejar, até agora.

Ainda estamos na mesma, ou quase na mesma. Desigualdade, pobreza e pouco desenvolvimento econômico são ainda as nossas queixas. O Nordeste, e aqui se leia o Semiárido e a Caatinga, continua sendo o núcleo da pobreza brasileira, por qualquer forma em que esta seja medida. Recentemente, em um programa de televisão (Fantástico, que a Globo leva ao ar aos domingos à noite), foi mostrada uma operação de libertação de trabalhadores escravos em Minas Gerais. De quase 200 trabalhadores escravizados, mais da metade era do Nordeste. Isso para uma região – o Nordeste – que tem menos de 30% da população do País. Pode-se dizer que aqueles que buscam esse trabalho estão entre os mais pobres e sem oportunidades.

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O que foi feito até hoje?

Uma resposta é criar e expandir uma infraestrutura hídrica. Graças ao trabalho realizado pelo Departamento Nacional de Obras contra as Secas (DNOCS) e, mais recentemente, pelos governos estaduais, bem como pelos fazendeiros, foi aumentada a disponibilidade de água armazenada no Semiárido. A região comporta hoje uma população bem maior e sofre menos com as secas (embora continue sofrendo) do que quando não havia água armazenada.

É justo falar-se que o DNOCS criou uma civilização no Semiárido. Essa civilização só foi possível após a acumulação de água em grandes açudes plurianuais.

Ao lado disso, houve muito progresso em relação ao desenvolvimento dos sistemas de transporte e de comunicações. As secas atuais já não são como aquelas descritas por Rodolpho Theóphilo e outros escritores nordestinos, quando as pessoas deixavam os seus rincões, por falta de água e de alimentos, e se arrastavam meses e meses através das trilhas até chegar ao litoral, onde o futuro era incerto. No caminho, muitas não resistiam.

Um exame minucioso dos planos e programas de desenvolvimento que abundaram a partir dos anos 1960 mostra que o abastecimento de água sempre esteve entre as grandes prioridades. O Projeto Sertanejo, um programa especial do Governo Militar, tinha como estratégia a formação de uma fonte hídrica em cada fazenda, que permitiria água para alimentação e para agricultura ao nível da fazenda. Para muitos, a questão do Nordeste resume-se à garantia de água para diversos usos, em cada lugar. Ainda hoje.

Não resta dúvida de que a disponibilidade de água aumenta o bem-estar da população. Ter água na torneira em casa é muito diferente de ir buscar água em latas ou canecas, como eu fazia na minha criancice. Ou como faziam inúmeros lares, uma tarefa que muitas vezes era desempenhada pelas mulheres.

A água é necessária. O saneamento básico é fundamental. Melhora o bem-estar das famílias. Mas ele não cria os empregos de que a população carece.

A vida melhorou por causa da água, mas deveria piorar em caso de seca extrema, quando secam muitas fontes.

Infelizmente, mesmo nos dias atuais, um dos programas governamentais mais populares em todo o Nordeste é o de carros-pipa, que levam água para pessoas e comunidades desprovidas. Esse é um indicador de vulnerabilidade da civilização do Semiárido.

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