Visitar o Museu Brinquedim, em Pindoretama, Região Metropolitana de Fortaleza, é entrar num colorido mundo da imaginação infantil cercado por vegetação nativa. Uma visita obrigatória. Se você é criança ou adulto, não importa, todos são convidados a brincar. O Próprio criador, Dim Brinquedim, faz da brincadeira o seu ofício diário, de toda uma vida.

Obra do acervo do Museu Dim Brinquedim, em Pindoretama – CE | Foto: Marcos Vieira

Pintoretama – CE. Aberto ao público em 2002, o Museu Brinquedim segue os princípios da democratização do acesso à cultura com seu acervo, 500 peças de autoria do artista plástico Dim Brinquedim. São brinquedos, esculturas e quadros, de pequenas e grandes dimensões, criações de mais de quatro décadas dedicadas ao brincar. A sede, em Pindoretama, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), inclui uma casa típica da região, edificada em 1970, em um espaço de 372m², rodeado por uma ampla área externa de circulação e uma pequena reserva de vegetação nativa de 14.000m².

O nome da certidão de nascimento é Antonio Jader Pereira dos Santos. Mas só é conhecido como Dim Brinquedim. “Dim porque meu pai me chamava de Jadim, e depois todo mundo abreviou para Dim, e ficou Dim até hoje. Brinquedim foi um nome que me foi dado pelo meu amigo Almiro Santos, pela relação entre meu trabalho e a brincadeira”, conta.

Ele nasceu e se criou em Camocim, município litorâneo com importante porto pesqueiro, bem a oeste do Estado do Ceará. “Na minha infância, me chamavam até de Zé faz tudo, que era o nome do carpinteiro no bairro que fazia tudo”, conta. “Tudo que eu via, queria fazer, eu brincava com tudo: no inverno eu brincava de fazer canoa com casco de melancia, e colocava uns palitinhos nos maxixes e eles se transformavam em bois e cavalos, depois eu fazia um curral e brincava de vaqueiro”, relata.

“Eu via uma coisa e queria fazer, pintava, desenhava, sem ter preocupação de estar ou não fazendo arte. Eu não estava preocupado em ser artista, e eu estava apenas feliz por estar fazendo tudo aquilo, brincando e inventando. Eu não tinha ainda a compreensão do que era a reciclagem mas já reciclava, porque eu aproveitava o que tinha”, revela.

Ele conta que só tomou consciência de que era artista já com 18 anos, quando conheceu o artista plástico Batista Sena. Foi visitá-lo e ficou impressionado com a pintura dele, com a forma de decorar a casa: “Achei aquilo tão legal que eu fiquei lá, ajudando, foi ai que ele me disse: ‘rapaz você é um artista!’. A partir daí, eu passei a conhecer novos materiais, tintas, aprender a trabalhar com pincéis, a me dedicar conscientemente às artes plásticas, mas, desde que eu me entendo por gente que eu trabalho com pintura porque a minha família é de artesãos. Eu sempre fiz arte, mesmo sem saber que era arte, hoje eu apenas faço com mais cuidado, com mais profissionalismo, porque o tempo vai passando e a gente vai aprendendo”.

Com uma vida dedicada ao brincar, praticamente ninguém o conhece mais pelo nome de registro, mas por Dim Brinquedim | Foto: Marcos Vieira

O brincar

Dim Brinquedim conta que a brincadeira sempre foi a sua inspiração e confessa que nunca deixou de brincar: “O mais sério da vida pra mim é o brincar, levar a vida a sério é considerar seriamente que o objetivo maior da vida é a felicidade”. E revela qual é o seu favorito: “Um dos brinquedos que eu mais gosto é o joão-teimoso porque ele traz a ideia de persistência, de nunca desistir dos nossos ideais“.

Dim conta que o conheceu na Feira de Camocim, a Pedra, porque era feita no calçamento mesmo. “Tinha um pano estendido no chão e alguns brinquedos: mané-gostoso, rói-rói, e um brinquedinho que tinha umas orelhinhas pra cima, que parecia um coelho. Era todo enfeitado com papel de seda e pintadinho, a gente derrubava e ele voltava, e eu gostava demais desse brinquedo porque achava interessante ele ir e voltar. Ai eu o desmontei e descobri que tinha um peso ali embaixo, foi assim que descobri o joão-teimoso. Até hoje ele está em tudo nos meus trabalhos”, relata.

Dim conta que há quem pense que começou a fazer brinquedos porque era um garoto pobre que não podia comprar brinquedos industrializados: “Na verdade, eu tive muitos brinquedos comprados, e brinquedos caros da época. Comecei a fazer brinquedos pela danação de fazer”.

Curioso, desde muito cedo estudava os mecanismos e os adaptava aos brinquedos que criava: “Mesmo quando não estou confeccionando alguma coisa, estou pensando, tendo ideias que desejo executar”, explica.

Ele está sempre juntando materiais para inventar soluções não convencionais: “Eu gosto de ter várias coisas em casa pra testar. Se vejo um parafuso perdido na calçada, uma tampinha, um arame torto, eu pego e ponho no bolso. Vou juntando um material e, quando chega a necessidade, eu uso”.

“Todas as minhas experiências entram no meu processo de criação. Se faço um trabalho de reforma da minha casa e acompanho o pedreiro, aprendo com ele novas técnicas que vem também para o meu trabalho. Eu uso todas as técnicas eu aproveito tudo, todo o meu caminho de vida se insere em meu trabalho”, resume.

O texto acima foi adaptado do original, escrito pela companheira de Dim Brinquedim, Ângela Madeiro, no Site do Museu Brinquedim.

Ângela Madeiro, companheira de Dim Brinquedim, é a responsável pelos textos no site do Museu | Foto: Marcos Vieira

Ping-Pong

Maristela – Já entendi que vc vem de uma família de artesãos. Algum deles te influenciou de uma forma especial?

Dim – Minha mãe me influenciou demais nas suas soluções, na pintura no corte, na organização. Ela produzia coroa de flores artesanais, e nessa produção existia uma organização com várias etapas, começo, meio e fim. Eu aprendi com ela que existe um processo no fazer, e isso me deixou preparado para trabalhar. Aprendi muitas coisas, tanto na pratica como no olhar, e me tornei um rapaz prendado. E, meu avô me influenciou com suas histórias fantásticas, e eu criava muita fantasia. Outra influência foi o bairro onde eu nasci, que tinha muitas crianças, alegria e liberdade.

Maristela – Você teve uma infância feliz, cheia de liberdade, com a oportunidade de dar vazão à sua criatividade. Se tivesse crescido em uma grande cidade, por exemplo, acredita que trilharia um caminho diferente?

Dim – O meio influencia, mas o fato de morar em uma cidade grande não é impedimento para ser criativo e feliz. A cidade grande também pode ser bacana, em todo lugar podemos receber estímulos e ser criativos. Creio que se eu tivesse crescido em uma cidade grande eu ia procurar a brincadeira do dia a dia do mesmo jeito, porque o objetivo da gente é ser feliz e sou feliz na brincadeira.

Maristela – Esse conduzir o mundo lúdico infantil para a vida adulta em algum momento foi problemático pra você? Alguém chegou a te dizer que precisava crescer, por exemplo?

Dim – Sim, às vezes não me aceitam, na Marinha do Brasil, por exemplo, não me aceitaram. Fui expulso aos 17 anos, depois de passar oito meses lá, não aceitaram minha brincadeira. Mas, assim mesmo, eu aprendi muita coisa lá, principalmente disciplina. Já fui chamado de doido também. Mas na maior parte das vezes sou bem aceito, porque a alegria contagia as pessoas.

Maristela – Que sentimento te desperta quando olha pra esse acervo tão maravilhoso, de 500 peças, que você construiu?

Dim – Eu olho e fico feliz, lembrando de tudo que vivi, e vejo que fiz muitas coisas, fiz muito mais peças que essas 500. E saber do tanto que já fiz me dá força. E minha produção é uma coisa que vai acontecendo de forma natural. Eu não me preocupo. Quando estou produzindo, estou brincando como uma criança que brinca sem medo de errar. E eu sou feliz em fazer as minhas coisas. E eu gosto de ver o resultado, quando eu começo, fico ansioso para ver o resultado porque sei que vai ser surpreendente. Eu me surpreendo todas as vezes porque é sempre um resultado diferente. Nada é igual, mas tudo é alegre e tem um amor muito verdadeiro, porque é a minha vida. Eu tenho 53 anos e 50 anos de lembranças de brincadeiras, essas informações eu guardo e coloco no meu trabalho.

Maristela – E qual é a sensação de observar as crianças explorando o museu?

Dim – É uma sensação de satisfação, de contribuir com uma coisa legal para esse mundo tão maluco. Gosto de estar falando de brincadeira, de proporcionar oportunidade para as crianças brincarem, de fazer os adultos lembrarem de brincadeiras, e se soltarem e brincarem também porque todo mundo gosta de brincar, todo mundo gosta de ser feliz. E quando as pessoas visitam o museu Brinquedim há uma interação, do visitante com a obra e com o artista. A gente conversa eu escuto muitas histórias e aprendo muito também. E o que me deixa tranquilo, feliz, seguro e com mais vontade de fazer meu trabalho, que eu digo que é uma missão, é a avaliação das crianças, porque as crianças falam a verdade, e elas gostam do Museu Brinquedim. Todas as crianças que visitaram o Museu Brinquedim saíram felizes. E quando a gente tem o respeito de uma criança é tudo na vida, porque a criança não mente, e isso me dá mais força de continuar teimando na brincadeira, e fazendo arte.

Maristela – Quais são os pensamentos do Dim Brinquedim para o futuro?

Dim – Plantar muitas árvores nativas, catingueira, pau pombo, angelim. Fazer muitos brinquedos, ter um terreno com um olho d’ água, viajar muito. Rodar bem o Ceará e o Brasil. Penso em fazer uma escultura muito bacana, para a praça da minha infância, a Praça do bairro Cruzeiro, em Camocim. Só penso coisa boa, muita chuva, muitos amigos, muita arte, muita alegria.

O Museu Brinquedim conta com diversas opções de brinquedos interativos | Foto: Marcos Vieira

Serviço

Site: www.museubrinquedim.org.br
Endereço: Estrada da Coluna, Km-20, Alto Alegre, Capim de Roça, Pindoretama – CE
E-mail: museu@museubrinquedim.org.br
Quando: Terça a Domingo – 9h às 17h
Ingresso: R$ 16 – R$ 8 (meia)
Agendamento: WhatsApp – (85) 9 9254-9637

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