Sob estresse de até 31,4 ºC, diferentes espécies são impactadas pelo El Niño de 2019 | Foto: Coral Vivo

 

O impacto do fenômeno El Niño nos recifes de coral da Costa do Descobrimento, na Bahia, está mais severo entre 2018 e 2019 do que aquele observado no período anterior, entre 2015 e 2016. Os pesquisadores do Projeto Coral Vivo estão monitorando e analisando uma série de variáveis ambientais e biológicas, e gerando um robusto banco de dados sobre o impacto do fenômeno. Eles alertam sobre a observação de que existe, em julho, uma mortalidade do coral-de-fogo (Millepora alcicornis) acima de 90%, em alguns recifes da região.

A capacidade de crescimento e multiplicação do coral-de-fogo é mais rápida do que de outros corais que ocorrem no Brasil. “Como as temperaturas se mantiveram elevadas até junho, com uma média de 29,6°C, essa espécie começou a morrer em maio. Para se ter uma ideia, a temperatura chegou a 31,4ºC nos recifes mais rasos”, informa o zootecnista Carlos Henrique Lacerda, coordenador regional de pesquisas do Projeto Coral Vivo, que é patrocinado pela Petrobras por meio do Programa Petrobras Socioambiental.

Em recifes da Costa do Descobrimento, a temperatura média da água, entre janeiro e maio de 2018, foi de 27,0°C, o que significa 2,6°C inferior àquela registrada no mesmo período de 2019. “Também observamos um aumento de quase 15% da radiação solar incidente na região durante a ocorrência do evento”, observa Lacerda. Entre 2018 e 2019, o Projeto Coral Vivo está monitorando os mesmos pontos que foram monitorados entre 2015 e 2016.

Em 2019, pela primeira vez no Brasil, foi observada e registrada a mortalidade de colônias e recrutas de corais de diferentes espécies, em função do El Niño. Em recifes mais rasos, próximos à costa, espécies como Agaricia humilis e Favia gravida, consideradas tolerantes ao estresse térmico, apresentaram uma elevada porcentagem de branqueamento, variando entre 60% e 80%, com perdas acima de 50% no número de colônias e recrutas.

“Em São Paulo, observamos um branqueamento de 80% das colônias de coral e mortalidade de 2%. As espécies de Mussismilia são mais resistentes. É comum no Sudeste encontrar colônias mais próximas à costa com mais branqueamento, devido à ação humana”, informa o oceanógrafo Miguel Mies, pesquisador do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP) e membro da Rede de Pesquisas Coral Vivo.

De acordo com a bióloga e oceanógrafa Beatrice Ferreira, os efeitos do El Niño nos recifes de Tamandaré, em Pernambuco, entre 1998 e 1999, também foram severos. “Posteriormente se recuperaram, ainda que lentamente, mas mediante a implementação de várias medidas de manejo e conservação, incluindo legislação específica de proteção com a criação de áreas de preservação e a redução de impactos diretos, com envolvimento da comunidade local”, explica Beatrice, que é professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e coordenadora do Programa Ecológico de Longa Duração Tamandaré Sustentável (PELD).

Os pesquisadores constataram que 90% das colônias de coral-de-fogo estão mortas em alguns recifes do Sul da Bahia | Foto: Coral Vivo

“O Coral Vivo estuda há quase 16 anos os recifes de coral da Costa do Descobrimento e inserimos no nosso atual patrocínio com a Petrobras a construção de um banco de dados com esse monitoramento ambiental”, destaca a coordenadora geral do Coral Vivo, Flávia Guebert. Esse monitoramento, que tem gerado dados científicos robustos, foi iniciado em 2016.

Uma série de sensores instalados em pontos estratégicos na Costa do Descobrimento, incluindo o Parque Natural Municipal do Recife de Fora em Porto Seguro e o Parque de Coroa Alta em Cabrália, registram a temperatura da água, a cada 30 minutos, e a incidência de luz solar. Além disso, os pesquisadores realizam uma avaliação do estado de saúde das colônias de corais por meio de mergulhos, utilizando uma escala de cor internacional, denominada “Coral Watch“, desenvolvida pela Universidade de Queensland, da Austrália. O Programa Reef Check, em parceria com Coral Vivo realiza monitoramentos da saúde dos corais do Sul da Bahia e outras regiões do Brasil, com participação de voluntários, e também vem registrando o mesmo fenômeno.

O monitoramento em questão continua sendo realizado pela equipe do Projeto Coral Vivo. Os dados completos serão disponibilizados à Rede de Pesquisas Coral Vivo, que é composta por 14 universidades e institutos de pesquisa. A Costa do Descobrimento é uma das áreas de maior biodiversidade marinha do Atlântico Sul e uma das áreas prioritárias do Plano de Ação Nacional para a Conservação dos Ambientes Coralíneos (PAN Corais).

Sobre o Projeto Coral Vivo

O Projeto Coral Vivo realiza atividades associadas à pesquisa, educação, políticas públicas, comunicação e sensibilização para a conservação e a sustentabilidade socioambiental dos ambientes coralíneos do Brasil. Essas atividades envolvem pesquisadores de 14 universidades e institutos de pesquisa do Brasil.

O Coral Vivo é o coordenador executivo do PAN Corais, que engloba 18 áreas desde o Maranhão até Santa Catarina, envolvendo assim 52 espécies de peixes e invertebrados ameaçadas de extinção. O Projeto tem sua base e seu centro de visitantes localizados no Arraial d’Ajuda Eco Parque, em Porto Seguro (BA).

O Coral Vivo integra a Rede Biomar, junto com os projetos Albatroz, Baleia Jubarte, Golfinho Rotador e Tamar, patrocinados pela Petrobras por meio do Programa Petrobras Socioambiental. O Coral Vivo tem o co-patrocínio do Arraial d’Ajuda Eco Parque.

Mais informações: coralvivo.org.br

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