Análises em rios feitas no período de um ano sinalizam a capacidade de recuperação de alguns corpos d‘água. Mas isso apenas se tornará tendência mediante investimento contínuo em saneamento, proteção de matas nativas e áreas verdes

No Ceará, a Lagoa da Parangaba, em Fortaleza, estava regular em 2020 e, no monitoramento de 2021, entrou para a categoria ruim | Foto: Taci Morais

Neste Dia Mundial da Água (22/3/2021), a Fundação SOS Mata Atlântica destaca a condição ambiental dos rios monitorados durante o ciclo hidrológico de março de 2020 a fevereiro de 2021 que coincide com o primeiro ano da pandemia do novo coronavírus. Com o relatório “Retrato da Qualidade da Água nas Bacias Hidrográficas da Mata Atlântica”, a ONG apresenta um panorama sobre a qualidade da água de 130 pontos de monitoramento, distribuídos em 77 trechos de rios e corpos d’água brasileiros, em 64 municípios, nos 17 estados do bioma Mata Atlântica.

Ao analisar os dados, os especialistas da Fundação destacam a tendência de melhoria na qualidade ambiental de rios e córregos urbanos ao longo de 2020 por conta de avanços nos índices de coleta e tratamento de esgoto e do isolamento social que resultou na redução de fontes difusas de poluição, como resíduos sólidos e material particulado proveniente da fuligem de veículos automotivos.

A melhoria aferida, de forma pontual, no entanto, só se tornará perene se for acompanhada de investimentos contínuos em saneamento ambiental e proteção de matas nativas e áreas verdes, seguindo a SOS Mata Atlântica. A equipe técnica da organização ressalta ainda que a pressão sobre o uso doméstico da água, durante a pandemia, resultou no comprometimento da qualidade da água de rios em regiões impactadas, no mesmo período, por secas e diminuição das vazões.

No total dos 130 pontos monitorados neste ciclo de 2020 a 2021, 95 deles (73,1%) apresentaram qualidade da água regular, 22 (16,9%) ruim e 13 (10%) estão em boa condição. O levantamento não identificou corpos d’água com qualidade de água ótima ou péssima.

Considerados os 95 pontos fixos de monitoramento, em que é possível fazer um comparativo com o período anterior (2019-2020) aqueles que também foram analisados entre 2020 e 2021, os indicadores aferidos apontaram variações expressivas em 20 pontos. A condição da qualidade da água melhorou em 10 pontos e manteve estabilidade nos indicadores, mesmo com variações climáticas intensas nos períodos de seca e chuva, em 75 pontos que continuam com as mesmas condições do levantamento anterior, inclusive com destaque para quatro pontos bons. No comparativo, também não foram encontrados pontos com condição ótima ou péssima.

“A gente já fala há muitos anos que a situação de um rio é o espelho do comportamento da sociedade. O processo de degradação de um corpo d’água, por lançamento de esgotos sem tratamento ou desmatamento de suas margens é rápido, mas, a recuperação pode demandar muitos anos. Por isso, os indicadores e dados mudam pouco, mas os rios têm, em geral boa capacidade de se recuperar, desde que não fiquemos parados. É preciso agir agora, mudar a nossa forma de gestão e governança e como consumimos a água”, afirma Gustavo Veronesi, coordenador do Projeto Observando os Rios da Fundação SOS Mata Atlântica.

Efeitos do aquecimento

As altas temperaturas registradas em alguns rios neste ciclo de monitoramento,  chegando a 30ºC ou mais, trouxe um alerta sobre os impactos das mudanças do clima sobre a qualidade da água. Altas temperaturas reduzem o oxigênio presente na água e, consequentemente, afetam a vida e a qualidade. Em condições normais, as médias consideradas adequadas para os rios das bacias monitoradas, deveriam ser de temperaturas na faixa de 18 e 23ºC. A existência de áreas verdes e matas nativas nas margens dos rios, fazendo sombreamento a ele, pode minimizar o aumento da temperatura.

Os indicadores de qualidade da água reunidos no estudo foram obtidos graças ao trabalho voluntário de 3.000 pessoas que integram 256 grupos de monitoramento do projeto Observando os Rios, patrocinado pela Ypê e com apoio da Sompo Seguros. Os grupos de voluntários coletaram e analisaram a qualidade da água, mensalmente ao longo do ciclo de 12 meses, com acompanhamento e supervisão técnica da Fundação SOS Mata Atlântica.

Os indicadores de qualidade da água reunidos no estudo foram obtidos graças ao trabalho voluntário de 3.000 pessoas que integram 256 grupos de monitoramento do Projeto Observando os Rios

“É necessária atenção especial das autoridades e da sociedade para a qualidade da água e proteção dos grandes rios da Mata Atlântica, para segurança hídrica. Com ênfase para a necessidade urgente de ações voltadas às populações que vivem em situação de vulnerabilidade social e econômica, principalmente, aqueles desprovidos de acesso ao saneamento básico e os que perderam moradia e passaram a viver nas ruas das cidades e em beira de rios ao longo da pandemia. Os indicadores levantados também reforçam que em áreas rurais há a necessidade de fiscalização e controle contra o uso intensivo de agrotóxicos e fertilizantes”, afirma Malu Ribeiro, diretora de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica.

No Nordeste

No Nordeste, a maioria dos mananciais monitorados ficou na categoria regular nos dois períodos. Se destacam, na categoria ruim, no Ceará, a Lagoa da Parangaba, em Fortaleza, que estava regular em 2020 e passou a ruim em 2021. Em Pernambuco, o Rio Capibaribe, em Paudalho, passou de regular a ruim; e em Recife, dependendo dos pontos, variou de regular a ruim, ruim a regular ou ruim nos dois períodos. Na Bahia, o Rio Passa Vaca, em Salvador, passou de regular a ruim; em Sergipe, o Rio Poxim, em São Cristóvão, passou de ruim a regular.

No caso da Lagoa de Parangaba, César Pegoraro, educador ambiental da SOS Mata Atlântica, informa que passou a ser mais utilizada para lazer e pesca, aumentando a quantidade de lixo. “Além disso, o índice pluviométrico nas ocasiões de análise favoreceram a concentração de poluentes”, complementa.

“Em Pernambuco, nos pontos que pioraram do Capibaribe, o lançamento de esgoto sem tratamento é principal fator, que é amenizado quando está mais perto da foz e tem mais volume de água (autodepuração). Em Sergipe também o maior desafio é o tratamento de esgoto doméstico”, afirma Gustavo Veronesi.

Bom mesmo no Nordeste, dos mananciais monitorados, só o Rio Coriripe, no município de mesmo nome, em Alagoas, nos dois períodos; e, no mesmo Estado, o Rio Pratagy, que foi de regular a bom entre 2020 e 2021.

A equipe do SOS Mata Atlântica destaca que, dos dez pontos que melhoraram de condição alcançando o índice de qualidade de água boa no País, cinco estão próximos de áreas protegidas, ou com mata nativa. Entre eles, exatamente o  Pratagy.

“Em Alagoas, destacamos o Pratagy, onde tivemos a menor quantidade de poluição difusa durante esse ano e o Coruripe, com diminuição drástica de resíduos devido a ações incisivas de coleta e educação”, explica César Pegoraro.

Fundação SOS Mata Atlântica

A Fundação SOS Mata Atlântica é uma ONG ambiental brasileira criada em 1986 para inspirar a sociedade na defesa da floresta mais ameaçada do Brasil. Atua na promoção de políticas públicas para a conservação da Mata Atlântica por meio do monitoramento do bioma, produção de estudos, projetos demonstrativos, diálogo com setores públicos e privados, aprimoramento da legislação ambiental, comunicação e engajamento da sociedade em prol da restauração da floresta, valorização dos parques e reservas, água limpa e proteção do mar. Os projetos e campanhas da ONG dependem da ajuda de pessoas e empresas para continuar a existir. Saiba como você pode ajudar em www.sosma.org.br.

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