Inclusão de Unidades de Conservação em programa de concessões divide opiniões

Por Alice Sales
Colaboradora

De um lado, há uma preocupação com a possibilidade de superexploração econômica dessas áreas, de outro, acredita-se que haverá mais estrutura para o gerenciamento das atividades.

O Parque Nacional de Jericoacoara foi criado em 2002 e possui uma área de 8,8 mil hectares. A Unidade de Conservação é uma das que passa pelo processo de concessão | Foto: Alice Sales

Jijoca de Jericoacoara – CE. Um decreto que inclui os Parques Nacionais de Lençóis Maranhenses (MA), de Jericoacoara (CE) e do Iguaçu (PR) no Programa de Concessões do Governo Federal (PPI) foi assinado, na última terça-feira (3), pelo Presidente Jair Bolsonaro.

Publicada no Diário Oficial da União, a assinatura do documento cumpre mais uma etapa para a realização da concessão das três Unidades de Conservação (UCs). Dentre elas, o Parque Nacional de Iguaçu já é concedido e passa pelo processo de renovação da concessão.

O decreto também estabelece que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) poderá ser contratado para elaborar os estudos referentes às concessões e prestar apoio às as atividades de supervisão dos serviços técnicos e de revisão de produtos contratados.

O termo usado para este tipo de procedimento é “Concessão à iniciativa privada de serviços em Parques Nacionais”, que consiste na permissão para que a iniciativa privada se encarregue de serviços de ecoturismo dentro de uma Unidade de Conservação (UC).

A proposta é que esta garanta a melhoria na infraestrutura e a ampliação do número de visitantes. Serviços como estacionamento, vias de acesso, sinalizações, orientações aos visitantes, hotelaria, passeios, segurança, venda de souvenires, alimentos e bebidas, ficam sob a administração de um grupo privado, escolhido por meio de uma licitação e que terá essa atribuição por tempo determinado.

A pesquisadora Vanda Claudino Sales, geógrafa, com pós-doutorado em Geomorfologia Costeira, afirma  que os Parques Nacionais foram criados para proteger áreas excepcionais do ponto de vista natural, que contam ainda com elevada sensibilidade ambiental, sendo suscetíveis aos usos e ocupações agressivas, e que por isso mesmo necessitam de um conjunto de ações e mecanismos de proteção para viabilizar a sua preservação permanente.

Segundo ela, o objetivo dessas UCs não é gerar lucro e sim garantir a preservação desses espaços naturais. “A conservação não combina com exploração capitalista. Quando se trata de uma empresa privada, o objeto é o lucro, e não a preservação. A tendência será a exploração em demasia desses sistemas naturais, que poderão chegar à exaustão. Inclusive, existem também moradores nativos nessas áreas, que certamente terão sua convivência com uma empresa privada afetada na essência, pois o lucro comandará as intervenções que venham a ser feitas”, alerta a pesquisadora.

E completa: “privatizar essas pérolas do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) é passar o patrimônio dos brasileiros para a iniciativa privada, isso significa desfalcar o Estado brasileiro, que tanto investimento fez para encaminhar os Parques para a situação ‘vantajosa’ em que eles se encontram”.

Em contraponto, fontes do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA) que gerencia os Parques Nacionais , afirmam que a decisão otimizará o trabalho realizado pela autarquia, no que diz respeito à gestão dessas  UCs.

A ideia é que a iniciativa privada esteja responsável pelos serviços de ecoturismo dos Parques e, em contrapartida, invista na infraestrutura e nas medidas para a preservação dessas áreas protegidas. Tudo isso baseado em estudos de viabilidade econômica feitos com antecedência. Os Parques Nacionais continuam sob o controle administrativo e territorial do governo.

“Com o aporte das concessionárias, chegará recursos para gerenciar os patrimônios naturais de forma mais eficaz e promover a conservação dessas áreas. No momento, a concessão é a alternativa mais viável para se ter melhores condições de trabalho e de estruturas para os Parques e entornos das áreas protegidas, além de oferecer uma melhor experiência aos visitantes, haja vista que por si só o ICMBio não possui recursos suficientes para realizar essas melhorias de forma efetiva”, declarou uma das fontes.

Permanecerá a cargo dos órgãos governamentais atividades como plano de manejo, fiscalização, realização e apoio a pesquisas científicas, ações de educação ambiental, gerência das áreas protegidas, entre outras. Como exemplo, os Parques Nacionais da Tijuca, e Fernando de Noronha já são concedidos. Segundo o ICMBio,  as duas UCs já apresentaram melhorias em suas infraestruturas e estão na lista dos Parques mais visitados do País.

Sobre os Parques

O Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses foi criado em 1981 e tem 155 mil hectares, dos quais 90 mil correspondem a dunas livres e a lagoas. A UC fica a cerca de 250 Km de São Luís e atualmente não cobra taxas de entrada.

Já o Parque Nacional de Jericoacoara está situado no litoral cearense. Criada em 2002, a área possui 8,8 mil hectares. Entre os principais pontos turísticos do Parque está a Pedra Furada, procurada por visitantes que buscam as praias de Jericoacoara para descansar ou praticar esportes náuticos.

O Parque Nacional do Iguaçu, em Foz do Iguaçu (PR), tem entre seus atrativos as Cataratas do Iguaçu, formadas pelas quedas de até 80 metros de altura do rio que possui o mesmo nome. O A UC é referência na preservação da onça-pintada, espécie ameaçada de extinção.

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