Pesquisadores otimizam produção de óleo de pequi no Cariri cearense

Por Verônica Freire
Embrapa Agroindústria Tropical

Novo método usa centrifugação para retirar óleo do pequi e substitui fogueiras feitas por catadores | Foto: Claudio Bezerra

Fortaleza – CE. Um projeto da Embrapa Agroindústria Tropical, no Ceará, propôs soluções para alguns dos problemas identificados nos métodos tradicionais de produção do óleo da polpa e da amêndoa do pequi na Chapada do Araripe.

Tradicionalmente, o óleo da polpa é produzido no meio da mata, em fogueiras acesas com madeira da floresta. Para preparar um litro do produto, é necessário permanecer oito horas macerando mil caroços em um latão no fogo. Um trabalho duro e com precárias condições de higiene e segurança, mas que garante alguma renda para as comunidades extrativistas quando a safra termina.

Uma pequena parte dos catadores extrai também o óleo da amêndoa que fica no interior do caroço espinhoso. É um processo ainda mais complicado que a extração do óleo da polpa, por causa dos espinhos. Além disso, como as amêndoas são pequenas, o rendimento de óleo é baixo. Por isso, esse produto é mais raro e caro que o óleo da polpa.

Mais rápido e com o dobro de rendimento

O protocolo apresentado pela Embrapa para a extração do óleo de polpa propõe a extração por centrifugação, de forma mais segura, rápida e com maior rendimento do que o esquema tradicional. O método, relativamente simples, consiste na retirada da polpa, aquecimento em banho-maria a 45°C e centrifugação em equipamentos próprios para pequenas agroindústrias.

Uma das vantagens, conforme conta a pesquisadora Elisabeth Barros, é a preservação de compostos nutricionais sensíveis a altas temperaturas, que se perderiam durante o demorado cozimento tradicionalmente empregado na produção. Outra vantagem do novo modelo é o bom rendimento. Enquanto no método tradicional a quantidade de óleo extraído é inferior a 10% da massa de polpa, o processo apresentado pela Embrapa obtém rendimento de 20%. “Isso corresponde a cerca de 76% de todo o óleo presente na polpa, o que significa um alto valor quando se fala de rendimento industrial”, esclarece a cientista.

O que mais chamou a atenção dos produtores ao conhecerem a nova forma de extrair o óleo da polpa foi a redução drástica no tempo de extração, que não chega a uma hora, sem contar o tempo necessário para outras fases do processamento, como a secagem em estufa e a embalagem.

“Nós gastamos oito horas só para cozinhar o caroço de pequi e mais quatro horas para apurar o óleo. A produção desse novo jeito vai dar melhor qualidade de vida pra gente”, festeja o agricultor Antônio da Hora, morador da comunidade da Baixa do Maracujá, na Chapada do Araripe, município do Crato.

De acordo com Barros, o método também apresenta vantagens logísticas e operacionais por exigir menor espaço de estocagem, já que é possível armazenar apenas a polpa congelada. Dessa forma, também é viável guardar a matéria-prima para a produção na entressafra.

O pesquisador da Embrapa Antônio Calixto salienta a redução do risco ambiental, já que a extração por centrifugação dispensa as fornalhas feitas de madeira da floresta. Além disso, favorece a adoção de Boas Práticas de Fabricação.

De cor clara, com cheiro suave e peculiar, o óleo da amêndoa tem bom potencial para a indústria de cosméticos e óleo de mesa | Foto: Cláudio Bezerra

Óleo de amêndoas

O projeto da Embrapa Agroindústria Tropical estabeleceu também os parâmetros para extração aquosa do óleo de amêndoa de pequi. “O processamento pode ser feito a partir das amêndoas dos caroços descartados ao fim da extração do óleo da polpa”, diz a pesquisadora Janice Lima, da Embrapa Agroindústria de Alimentos, no Rio de Janeiro, que atuou no projeto.

Segundo a pesquisadora, a amêndoa do pequi também é comestível, mas é pouco explorada, em função, principalmente, da dificuldade da extração do endocarpo espinhoso. Ela Lima esclarece que a extração aquosa apresenta a vantagem de não necessitar de solventes orgânicos. Ela explica que as amêndoas são trituradas com água quente, o que ajuda a liberar o óleo dos tecidos, formando uma camada superior separada por flotação ou centrifugação.

De cor clara, com cheiro suave e peculiar, o óleo da amêndoa tem bom potencial para a indústria de cosméticos e óleo de mesa. Ele é rico em ácidos graxos insaturados, reconhecidos como benéficos à saúde, e apresentou bom desempenho em testes sensoriais. Óleo obtido com os parâmetros definidos pelo projeto apresentou estabilidade em prateleira de 350 dias. Para produzir um litro é necessário processar em torno de 3,5 mil caroços.

Atividade penosa

“Eu tenho certeza de que se não tivesse o pequi, o Crato não cabia mais de morador daqui da serra porque é bastante gente que tem aqui na região atrás de um emprego. Não tem emprego nem para os que já são veteranos e têm experiência de emprego, que dirá para um agricultor que vai se habilitar a tudo novamente em uma nova função.”

O depoimento é do agricultor Antônio Agostinho da Hora, morador da Baixa do Maracujá, no município do Crato. Além dele, a esposa e quatro dos oito filhos trabalham na coleta do pequi. “A sobrevivência que a gente tem aqui, principalmente agora, é o pequi, a mangaba e o cambuí”, conta da Hora.

O produtor participou de um Dia de Campo promovido pela Embrapa para apresentar o modelo de processamento do óleo a frio. Ele aprovou a novidade, principalmente pela redução do tempo de produção e de exposição ao calor que eles costumam passar. “É ótima, a gente não leva tanta temperatura no corpo quanto a gente leva para fazer o óleo artesanal, porque não é brincadeira não,” declara.

O município do Crato, na região do Cariri cearense, pode ganhar uma usina para produção de óleo de pequi com tecnologia Embrapa. A prefeitura elaborou um projeto para construção do equipamento na comunidade da Baixa do Maracujá, na Chapada do Araripe.

Na Chapada do Araripe, o pequi se destaca pela importância socioeconômica. Os frutos  são utilizados tanto na culinária regional como na farmacopeia popular e na indústria cosmética | Foto: Verônica Freire

Pequi faz parte do Cariri

No Cariri cearense, o uso culinário do pequi é um traço cultural tão marcante quanto a fé em padre Cícero ou a rica arte popular manifesta em nomes como irmãos Aniceto, Espedito Seleiro e Patativa do Assaré. O fruto compõe pratos apreciados na região, como o baião de dois ou a pequizada – um ensopado cremoso com verduras, leite e queijo coalho. Repleto de vitaminas e óleos, o pequi garante sustança e renda ao povo do lugar.

Na safra, que se estende de janeiro a março, centenas de pessoas montam acampamento na Floresta Nacional do Araripe (Flona Araripe) para catar o fruto caído no chão. Parte dos catadores incrementa os ganhos com a produção do óleo da polpa. Enquanto o cento do pequi in natura chega ao consumidor final por até R$ 10, o litro do óleo da polpa pode custar até R$ 100.

O nome do fruto origina-se do tupi “pyqui”, no qual py significa pele, e qui, espinho, referindo-se aos espinhos do endocarpo do fruto. O pequizeiro é uma planta perene, nativa e típica do Cerrado, pertencente ao gênero Caryocar e à família Caryocaraceae.

A espécie Caryocar coriaceum Wittm ocorre nos estados da Bahia, Goiás, Piauí, Ceará e Pernambuco. Nessas regiões, apresenta-se como árvore frondosa e esgalhada, podendo alcançar até dez metros de altura. Seu fruto, de cheiro e sabor peculiares, é bastante apreciado pela população nas regiões de ocorrência, onde é explorado de forma extrativista.

Na Chapada do Araripe, o pequi se destaca pela importância socioeconômica. Os frutos – ricos em ácidos oleico, palmítico, linoleico e carotenoides – são utilizados tanto na culinária regional como na farmacopeia popular e na indústria cosmética. A safra, que vai de janeiro a março, é comercializada na região e pouco aproveitada pela indústria.

Quer a apoiar a Eco Nordeste?

Seja um apoiador mensal ou assine nossa newsletter abaixo: