Por Alice Sales
Colaboradora
Fortaleza (CE). Quase um ano após ter sido avistado pela primeira vez nas águas da costa cearense, o peixe-leão (Pterois volitans) segue sendo motivo de preocupação. Isso porque o peixe exótico agora ameaça a natureza e as atividades de pesca artesanal do Parque Estadual Marinho da Pedra da Risca do Meio, berço de uma rica biodiversidade nativa. O que agrava ainda mais a preocupação sobre os danos que a espécie invasora pode causar é que, dentro da área do Parque, o peixe-leão está protegido pela legislação e não pode ser capturado por mergulhadores, já que, mesmo se tratando de uma espécie invasora, a prática não é permitida em uma Unidade de Conservação de Proteção Integral.
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“Estamos capturando o peixe-leão com a ajuda de mergulhadores e pescadores desde março de 2022, quando a espécie foi vista pela primeira vez no Ceará. O que está acontecendo agora é um caso muito específico por se tratar de uma Unidade de Conservação de Proteção Integral. Ninguém pode entrar lá com um arpão, mesmo que seja para capturar uma espécie exótica, sem que esteja devidamente amparado pela Lei. A Lei não permite, mas ela tem algumas exceções”, destaca Marcelo Soares, pesquisador do Instituto de Ciências do Mar (Labomar), da Universidade Federal do Ceará (UFC).
Desde as primeiras vezes que a espécie foi avistada nas áreas do Parque Estadual Marinho por mergulhadores, ativistas estão se mobilizando para que os órgãos competentes encontrem uma solução a fim de erradicar a espécie das áreas da Pedra da Risca do Meio.
A invasão da espécie ameaça a vida marinha nativa já que apresenta uma expressiva capacidade reprodutiva que favorece o aumento da sua população. O peixe é um predador voraz de outros organismos. Isso pode provocar um desequilíbrio da cadeia alimentar e gerar impactos nos estoques de peixes alvo da pesca local. Além disso, é capaz de se adaptar em diferentes condições ambientais e em águas de temperaturas altas e baixas, com diferentes condições de salinidade e pode ser encontrada até em manguezais.
“Em Fernando de Noronha, que é um Parque Nacional, o peixe-leão virou praga e os mergulhadores estão colaborando com a captura da espécie. Precisamos fazer como está sendo feito em Noronha. Se em Noronha, que também é um Parque Marinho, está sendo permitido capturar o peixe-leão, por qual razão aqui no Ceará não é permitido? Por que tanta demora? Será burocracia? Enquanto isso, o peixe está se reproduzindo rapidamente e devorando todos os outros que ele encontra”, destaca Erika Beux, bióloga e mergulhadora.
Com urgência por uma solução, os pesquisadores Tommaso Giarizzo e Marcelo Soares, do Labomar, elaboraram um projeto que fundamenta todo o problema causado pelo peixe-leão. O documento também pede autorização, tanto para a gestão do Parque, quanto para a Secretaria do Meio Ambiente (Sema), para que mergulhadores possam fazer a captura do peixe para fins científicos. A expectativa é que essa autorização saia o quanto antes. Somente mergulhadores capacitados serão permitidos capturar o peixe-leão nas áreas do Parque Estadual Marinho. Os espécimes deverão ser entregues ao Labomar para pesquisas.
De acordo Luís Ernesto Arruda, pesquisador do Labomar, com apoio do Programa Cientista Chefe Meio Ambiente, a Sema está preparando uma Instrução Normativa para permitir a captura de espécies exóticas na área do Parque Estadual Marinho da Pedra da Risca do Meio, para fins científicos.
“A Secretaria do Meio Ambiente está trabalhando em uma instrução normativa, com base nas adotadas em Fernando de Noronha pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Nós, do Labomar, estamos auxiliando neste processo para que a solução seja por via da ciência”, reforçou Marcelo Soares.
A articuladora das unidades de conservação estaduais sob a gestão da Sema, Carol Viana, informou que a Secretaria está elaborando uma nota de esclarecimento sobre o assunto para divulgação das ações que estão sendo realizadas para respaldar a captura do peixe-leão na Unidade de Conservação do Parque Estadual da Pedra da Risca do Meio.
O peixe-leão
O nome popular peixe-leão refere-se a duas espécies intimamente relacionadas e quase indistinguíveis que são originárias do Oceano Indo-Pacífico mas que invadiram pela primeira vez as costas da Flórida em meados da década de 1980, como resultado provavelmente de solturas de aquários. Rapidamente suas populações aumentaram dramaticamente nos últimos 30 anos. Após os primeiros registros na Flórida, o peixe-leão invadiu a costa leste americana e diferentes ambientes marinhos do Golfo do México e de todos os países banhados pelo Mar do Caribe, até o litoral da Venezuela.
No Brasil, o primeiro registro de ocorrência da espécie foi a captura de dois indivíduos em Arraial do Cabo, no Rio de Janeiro, em 2014 e novamente em 2016. Por não ter registrado novas ocorrências nesta localidade, presume-se que a causa desta ocorrência foi a liberação secundária de aquários. No entanto, desde 2020, espécimes de peixe-leão foram registrados em recifes profundos (30-100 m) na Costa Amazônica e no Arquipélago de Fernando de Noronha. Nestas localidades, foram capturados dezenas de peixes-leão e, portanto, já se considera esta invasão preocupante uma vez que comprova que a população é estabelecida no Oceano Atlântico Sudoeste Tropical.
Além de todo risco que oferece à biodiversidade dos mares brasileiros e às atividades pesqueiras, o peixe-leão é portador de toxinas neuromusculares de efeito sistêmico nos espinhos das nadadeiras. Os espinhos desse peixe têm diversas finalidades, como defesa, intimidação e ancoragem em fendas. A espécie faz parte de uma família de peixes Scorpaenidae que são considerados os peixes marinhos mais venenosos do mundo.