Por Priscilla Costa
Colaboradora
Fernando de Noronha – PE. Uma das principais atrações do mar de Fernando de Noronha, o Golfinho-Rotador (Stenella longirostris) está com sua sobrevivência ameaçada. O turismo náutico desordenado – reflexo do inchaço populacional no arquipélago – tem obrigado bandos da espécie a migrarem para novas áreas em busca de segurança para descanso, reprodução e alimento.
É o que revelam os dados do Projeto Golfinho Rotador, programa que há 30 anos utiliza a pesquisa científica em prol da conservação desse mamífero no arquipélago por meio de patrocínio do Programa Petrobras Socioambiental. O censo, feito nos últimos dez anos pelos pesquisadores da instituição, foi apresentado recentemente no 12º Congresso da Sociedade Latino Americana de Especialistas em Mamíferos Aquáticos, em Lima, no Peru.
De acordo com o fundador e coordenador do Projeto Golfinho Rotador, José Martins, o tráfego de embarcações é uma das atividades mais impactantes sobre os rotadores. “Há uns 25 anos, o número total de barcos em Noronha, entre os (barcos) de passeio e mergulho, era menos de 20. Hoje, são mais de 100 barcos de mergulho operando no Parque (Nacional Marinho) e na APA (Área de Proteção Ambiental), além das operações de mergulho, todos com o mesmo propósito de ver golfinhos”, compara.
Ele conta que, há três anos, um macho juvenil, medindo 1,36 metros de comprimento, morreu após colidir com uma embarcação. O animal foi encontrado boiando, nas imediações do Porto de Santo Antônio, com uma lesão no focinho e fraturas expostas na mandíbula e no maxilar.
As observações feitas do Mirante do Boldró e do Forte dos Remédios (veja a arte) pelos pesquisadores apontam que os golfinhos rotadores – chamados assim por darem até sete rotações em torno do próprio eixo a cada salto fora d’água – têm preferido as regiões entre as ilhas, as chamadas ilhas secundárias. “Um forte indício de que os rotadores estão fugindo de Fernando de Noronha. Saindo de suas áreas principais de ocupação, ou seja, no centro do arquipélago para áreas mais periféricas”, reforça Martins, que também é analista ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Para se ter uma ideia do quão o trafego massivo de embarcações vem mudando o comportamento desses mamíferos, foi descoberto que os poucos bandos que ainda insistem em frequentar a Baía dos Golfinhos optam por rotas mais remotas para adentrar a área. “Eles chegam à Baía pela Ponta da Sapata. Tem sido a principal rota deles porque é a que menos tem trânsito intenso de embarcações”, complementa o coordenador. A Ponta da Sapata fica na ilha principal de Noronha, próximo à Baía dos Golfinhos e à Praia do Leão. A região, de difícil acesso, é procurada por mergulhadores.
Plano de Manejo
Não é de hoje que o inchaço populacional em Noronha contraria as regras do Plano de Manejo do arquipélago. O documento, basicamente, normatiza o uso e ocupação do solo de um território legalmente protegido por meio do seu zoneamento. Mas não é o que ocorre. A legislação define a capacidade de 246 visitantes por dia, o que soma um limite 89.790 pessoas ao ano. O problema é que, a partir de 2014, a Lei passou a ser descumprida com a autorização pela Administração de Noronha de voos extras/regulares, possibilitando um considerável aumento de visitantes. Só em 2017, Noronha registrou o maior número de visitantes, chegando a um incremento de quase 79% da média histórica. A estimativa foi de uma marca de 95 mil turistas. Ao dividir pelos 365 dias do ano, a média de visitantes por dia chegou a 260 pessoas.
Proteção aos Rotadores
José Martins reconhece que os esforços do Projeto Golfinho Rotador estão longe de reverter o cenário atual, mas, destaca algumas normativas que têm minimizado os impactos sobre a espécie. “Em parceria com o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), conseguimos limitar o número de barcos que podem trabalhar na área do Parque Nacional Marinho (Panama), como os donos das embarcações devem proceder ao se aproximar dos golfinhos, definimos os limites de velocidade dos barcos e conseguimos oficializar a proibição do mergulho turístico com os rotadores”, destaca.
A ida de grandes cruzeiros turísticos ao arquipélago também é proibida. O Golfinho Rotador trabalha em parceria com o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF), Ibama e o ICMBio Noronha. Este ultimo órgão, do qual Martins é analista ambiental, é responsável por gerir e fiscalizar as atividades no Parque Nacional Marinho. Já na Área de Proteção Ambiental (APA), a gestão é compartilhada entre o ICMBio e o Governo de Pernambuco. “Há 15 anos, o número de embarcações que trabalham no Parque se limita a 13. Porém, na APA, esse quantitativo passou de cinco para mais de 80”, alerta Martins.
“Quem deve definir o número máximo de embarcações na APA é o ICMBio. Essa determinação está no Plano Manejo, de 2017. Cabe à administração manter o controle de cadastro dessas embarcações, sendo reguladas pela administração do Porto de Fernando de Noronha. É importante destacar que estamos firmando a parceria com o CPRH para confecção de um novo estudo de capacidade de suporte da Ilha, incluindo embarcações. A respeito ao número de visitantes, a administração está tomando todas as medidas cabíveis para cumprir o que está determinado pelo Plano de Manejo”, declarou a administração de Noronha em nota oficial.
Contagem
As observações são feitas diariamente durante o nascer e pôr do sol
- Pelo menos, dois pesquisadores do projeto seguem uma pequena trilha, que leva ao Mirante de Observação, para fazerem estudos sobre os golfinhos
- Para contar, mira-se sempre no primeiro golfinho do grupo. Eles se deslocam mais organizados. Então, tem sempre um golfinho na ponta, fechando o grupo
- O binóculo fica parado neles e conta conforme os outros vão passando no campo do binóculo
- Conforme o contador e apertado, registra-se o número de golfinhos nas praias de Noronha
- Num dia, os rotadores podem ocupar um ponto até dez horas. Num ano, a frequência pode ser até 95% dos dias
Objetivo
- As observações servem para estudar o comportamento da espécie na ilha para, então, saber o que ela está fazendo e quais os fatores naturais e de origem humana que influenciam no comportamento natural do mamífero. São esses estudos que dão origem a atividades de educação ambiental e medidas de conservação em prol da espécie.
Fonte: Projeto Golfinho Rotador