O texto com novas regras da próxima resolução foi aprovado nesta quinta-feira (11), em reunião do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Coema) | Foto: Monique Linhares

Por Monique Linhares
(Colaboradora)

A Agência Eco Nordeste acompanhou as duas últimas discussões acerca das alterações do licenciamento ambiental no Ceará, propostas pela Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace). O texto com novas regras da próxima resolução foi aprovado nesta quinta-feira (11), em reunião do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Coema), ainda que com algumas divergências entre representantes de instituições que compõem o colegiado e protestos da sociedade civil e outras entidades presentes, principalmente no que diz respeito à Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC) e o uso de agrotóxicos.

A proposta da Semace foi analisada e emendada durante cinco meses, a partir de um Grupo de Trabalho (GT) composto por 13 dos 37 conselheiros, além de consulta pública na internet, reuniões setoriais e audiências públicas, como a última que a Eco Nordeste acompanhou, no dia 27 de março, na Assembleia Legislativa do Ceará (AL-CE).

Críticas às alterações de regras no licenciamento ambiental do Ceará tensiona audiência pública na Assembleia Legislativa

A última revisão do documento, que teoricamente levou em conta o que foi sugerido ou criticado, inclusive na audiência passada, como anunciaram, foi apresentada para ser votada e encaminhada para sua publicação como nova resolução. Durante a leitura, se houvesse dúvidas ou erros, o colegiado poderia pedir destaque, comentar ou propor correção, para ser votada a modificação ou manutenção do texto.

Área com uso de agrotóxico é duplicada para licenças

Nicolas Fabre, representante da Associação de Municípios do Estado do Ceará (Aprece) no Coema, pediu destaque para questionar o aumento do tamanho da área irrigada com agrotóxico como ponto de corte para a LAC, licença que autoriza a localização, instalação e operação de atividade ou empreendimento, mediante declaração de adesão e compromisso do próprio empreendedor.

No texto apresentado, a área passou de 15 hectares para 30 ha (equivalente a 30 campos de futebol), e Fabre alerta que a defesa era pela redução, uma vez que não importa o tamanho do perímetro irrigado, se assentamento ou cultura de vazante, “o efeito cumulativo não é considerado um processo de licenciamento” nessa proposta.

“O Ceará não é uma ilha”, afirmou Henrique Torres de Melo, representante da Federação da Agricultura no Estado do Ceará (Faec) no Conselho e membro do GT, em defesa da duplicação do perímetro irrigado para LACs. Citou exemplos de outros estados, como São Paulo e o cultivo de flores em Holambra, local onde o ponto de corte para licenças autodeclaratórias é de 50 hac e de onde se importa para o Ceará toda a tecnologia para produção de flores.

“Disputamos essas possibilidades de investimento com muito mais estados. É muito mais interessante que a gente não perca competitividade”, afirmou Torres de Melo. Comentou ainda que o uso dos defensivos agrícolas “está extremamente politizado”, ao se referir às políticas e medidas de proteção a agricultores e ao consumo humano.

“Quando nós ventilamos o aumento de 15 ha para 30 ha, verificamos como comparativo outros estados. Quando fazemos uma crítica, acabamos ignorando que existem outros estados concorrendo pelos mesmos recursos”, reforçou André Montenegro, conselheiro, membro do GT e presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Ceará (Siduscon-CE), ao sustentar a manutenção da alteração.

Ele também argumentou sobre a limitação da capacidade técnica da Semace quanto ao monitoramento das licenças e quanto ao prejuízo ambiental. “Quando a Semace faz essa proposta, ela coloca duas condições: a capacidade técnica, ou seja, não tem técnicos para atender esses limites, e suplantar ou deixar isso não terá prejuízo à proteção ao meio ambiente. É essa questão. Quando eu coloco esse destaque, estou ignorando a capacidade de exercício da própria Semace”, discorreu Montenegro.

Movimentos socioambientais criticam atualização

“O uso de agrotóxicos não tem a ver tão somente com a área, mas com o tipo de cultura e o tipo de utilização de químicos, como apontado por Nicolas Fabre. O LAC foi utilizado para empreendimentos de baixo impacto, o que não contempla nossa preocupação. 30 hectares é muita coisa. E quando você tem vários próximos? Ao invés de uma fazendo de 3 mil hectares, você terá 10 de 30 hectares? Os agrotóxicos não poderiam nunca ter o tratamento simplificado, tem Lei específica sobre isso”, afirmou Soraya Tupinambá, advogada e ambientalista, sobre o principal ponto de divergência na reunião do Coema.

“A flexibilização das normas ambientais mais prejudica do que ajuda o desenvolvimento econômico no Ceará e no Brasil. Ninguém discorda de que as atividades econômicas possam ser fundamentais para o nosso País e Estado, importantes para a economia e para a geração de postos de trabalho”, diz a nota “Organizações da sociedade civil denunciam a flexibilização do licenciamento ambiental do Ceará”, assinada por movimentos, entidades e grupos acadêmicos de pesquisa, locais e nacionais, e distribuída durante a reunião no auditório do Coema, onde manifestantes colaram cartazes em protesto, gerando desconforto em alguns conselheiros presentes.

Uma das principais críticas apresentadas no documento é que o teor da atualização da Resolução do Coema tem foco no monitoramento, não na licença ambiental em si. Esse foco, segundo a nota, mostra o afrouxamento de condicionantes para o licenciamento, diminuindo a necessidade de fiscalização pelos órgãos competentes. Além de transferir para o empreendedor a capacidade de “automonitoramento”, pois o mesmo poderá apresentar seu laudo de fiscalização para o órgão licenciador.

Com relação a isso, a nota aponta para a fragilidade já apresentada por membros do Coema e pela própria Semace, a limitação de pessoal e equipamentos técnicos. “O investimento nos quadros técnicos dos órgãos ambientais e uma ciência e tecnologia também são essenciais ao desenvolvimento econômico. Nosso país e o Ceará precisam de ciência e tecnologia, inclusive para potencializar uma produção de bases mais sustentáveis”.

Ainda é ressaltado na nota que a flexibilização das regras poderia ser mais justa e adequada para pequenos empreendimentos de baixo Potencial Poluidor-Degradador (PPD), o que mostra que os movimentos socioambientais não são contrários à ideia de “tornar mais simples e ágil o processo de licenciamento nem para atividades de baixo impacto e para as micro e pequenas empresas de baixo impacto ambiental ou para agricultores familiares. (…) Para essas atividades é necessária uma reformulação de todo o processo de licenciamento considerando o acúmulo de informações dos órgãos ambientais e das novas tecnologias disponíveis de forma que o processo se torne mais célere, ágil e criterioso, com o objetivo de assegurar controles ambientais necessários”, conclui.

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