Conflitos comprometem atividades do Instituto Nacional do Semiárido

Recentemente o site revistanordeste.com.br revelou a existência de uma crise de gestão no Instituto Nacional do Semiárido (Insa), unidade de pesquisa ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), com sede em Campina Grande, cidade da Paraíba que concentra um polo de ensino superior. Um documento assinado por servidores do Insa, enviado à Subsecretaria de Unidades de Pesquisa do Ministério, denuncia que “parte do corpo funcional desta unidade de pesquisa vem passando por constrangimentos e circunstâncias desafiadoras que demandam um olhar mais atento por parte do MCTI”.

O documento revela que “mais da metade dos servidores da área finalística estão arrolados em alguns processos acusatórios baseados em denúncias fantasiosas e sem materialidade”. E aponta para um dos inquéritos conduzidos pela Polícia Federal que destaca, após analisar o conjunto de dados presente no inquérito: “parece de fato existir uma situação de tensão elevada e desinteligência na unidade de pesquisa”.

Herança intelectual de Celso Furtado

O raio de ação do Insa é um território onde vivem cerca de 28 milhões de pessoas e que ocupa10 estados brasileiros, um dos semiáridos mais povoados do mundo, segundo dados da própria Instituição. Uma imagem aérea das instalações do Insa revela o desenho da palma de uma mão, em Campina Grande, cidade polo em ações de inovação no interior da Paraíba, mas no coração do Semiárido, objeto da missão para o qual foi designado.

Mão remete ao trabalho, “mãos à obra”; a auxílio, “dar uma mãozinha”; à fraternidade, “mão amiga”, e foi com tais referências que o projeto arquitetônico do Insa foi executado. O legado para o desenvolvimento social e econômico não veio por força da Lei que instituiu a unidade de pesquisa em 2004 (Lei Nº 10.860, de 14 de abril de 2004), mas foi inspirado no pensamento do estudioso que se debruçou para planejar soluções para o desenvolvimento do Brasil, como um todo, mas, especificamente, do Nordeste: Celso Furtado. Um busto em bronze do economista reluz na praça central do instituto. De certa forma, dali se expande a dimensão política das forças sociais.

O Insa representa uma fonte fidedigna de informação para o serviço jornalístico prestado pela Eco Nordeste. É promotor de pesquisas com metodologia científica e desenvolvimento tecnológico e inovador relacionado dentre as fontes científicas para diversas reportagens realizadas. Portanto, é de interesse deste veículo entender e noticiar o que está ocorrendo na instituição.

Até o momento, a Eco Nordeste apurou a existência de um inquérito policial representado pela diretora, Mônica Tejo, contra um servidor e um processo judicial impetrado por um servidor contra a diretora, por danos morais. Além disso, há mais de 10 processos administrativos contra quatro servidores registrados no Sistema Eletrônico de Informações desde 2020. Antes disso, o número de processos com esse propósito era zero. Desde 2020, pelo menos seis servidores deixaram o Instituto com a justificativa de impossibilidade de exercer as funções sem sofrerem alguma forma de opressão, de acordo com informações de servidores.

Inquérito na Polícia Federal

Um inquérito aberto pela Polícia Federal para investigar a acusação por parte da diretora Mônica Tejo de crimes de Ameaça e de Perseguição, ações supostamente executadas por uma servidora, foi encerrado por falta de provas, “não sendo possível confirmar a versão dos fatos apresentada”. Neste caso foram colhidos depoimentos de servidores ligados ao Insa e o delegado relatou: “se depreende das inquirições que há hoje no Insa um ambiente conflagrado, inflamado, permeado por conflitos envolvendo diversas questões do cotidiano da unidade de pesquisa”.

Mais adiante conclui: “O conjunto de dados presente no inquérito ilustra que parece de fato existir uma situação de tensão elevada e desinteligência na unidade de pesquisa onde os envolvidos dão expediente, mas se trata de fatos que em si não têm relevância penal, e já são do conhecimento da corregedoria do MCTI. Tendo isso tudo em vista, sugiro o arquivamento deste inquérito policial”.

Os servidores alegam que a corregedoria do MCTI não está em posição de equilíbrio para a solução destas ocorrências e que, apesar de os fatos terem sido informados ao MCTI, este não respondeu a nenhum comunicado. A Eco Nordeste questionou a corregedoria por e-mail e como resposta recebeu a orientação de encaminhar a solicitação desta informação por meio do site falabr.cgu.gov.br. O procedimento foi executado segundo a instrução. O prazo informado para o retorno é de 30 dias, prorrogável para mais 30. Contudo um aviso no momento do acesso explica que esse prazo poderá se entender devido à situação de calamidade enfrentada pela população do Rio Grande do Sul.

Ao site revistanordeste.com.br, a diretora do Instituto, Mônica Tejo declarou: “quando chegamos ao Insa, em 2020, havia um clima de fechamento do Instituto, entretanto, graças à nossa dedicação e apoio de setores gerais, “superamos todas as adversidades possíveis, inclusive com quem nunca demonstrou interesse em contribuir com as mudanças indispensáveis”.

Os servidores desconhecem se houve estudo sobre a possível descontinuidade das operações do Insa por parte do MCTI. O Ministério foi questionado, no dia 2 de junho, também por e-mail, mas até o momento não obtivemos resposta.

No site, “Mônica Tejo repetiu que o Insa vive “os efeitos da reconstrução de muitos projetos relevantes, mas que, mesmo assim, numa instituição democrática precisamos conviver com quem prega a discórdia exatamente pela falta de comprometimento com as ações e projetos fundamentais para a existência de resultados por parte do Insa”.

Contudo, o comprometimento dos servidores com a pesquisa se revela pelos resultados publicados no site do MCTI em documentos como o Termos de Compromisso de Gestão (TCG). No mais recente, de 2023, consta o registro da “publicação de 24 artigos em reconhecidos periódicos nacionais e internacionais”. Informa que os servidores participaram e realizaram palestras, eventos e processos de capacitação. Na conclusão, destaca o projeto Saneamento Ambiental e Reuso de Água (Sara), uma tecnologia que amplia o acesso à água para o tratamento de esgoto no Semiárido. O pesquisador que deu início a esse estudo foi um dos que se retiraram do Insa por motivos declarados pelos servidores.

Concurso público adiado

Em 2023 o MCTI abriu processo para realização de concurso público para o provimento de dez vagas de pesquisador, nove de tecnologista e 13 de Analista em C&T (Portaria MCTI Nº 7.227, de 12.07.2023). Era necessário o envio pela diretoria de proposta de edital ao MCTI, o que não foi efetivado dentro do prazo estabelecido.

De acordo com a Portaria: “no âmbito das Unidades de Pesquisa para o provimento de 253 cargos de Pesquisador, da Carreira de Pesquisa em Ciência e Tecnologia, 265 cargos de Tecnologista, da Carreira de Desenvolvimento Tecnológico, e 196 cargos de Analista em Ciência e Tecnologia, da Carreira de Gestão Planejamento e Infraestrutura em Ciência e Tecnologia”, em 17 unidades de pesquisa.

Ao ser consultado, o MCTI declarou que apenas três unidades de pesquisa não enviaram a proposta de edital no prazo, uma delas foi o Insa. E há tratativas para nova autorização para o concurso na Instituição. A diretoria do Insa também foi questionada pela Eco Nordeste sobre esse fato por e-mail encaminhado por meio da assessoria de comunicação, mas não teve retorno até o momento.

“Atualmente, o Insa conta com dois pesquisadores e cinco tecnologistas efetivos, que atuam na produção científica dentre outras ações”, segundo o TCG 2023. Os demais pesquisadores são bolsistas por meio do Programa de Capacitação Institucional (PCI), “mais de 50”.

Outro processo judicial

Em outro caso, um pesquisador relatou a injusta acusação oficializada pelos instrumentos de correção do Insa, por parte da diretora Mônica Tejo, por furto de reagentes de laboratório e por ter “adentrado” no laboratório, palavra interpretada como ação invasiva.

O pesquisador foi avisado sobre esse processo por outros colegas. Mas ele era o responsável técnico pelo Complexo Laboratorial do Instituto, nomeado pelo diretor anterior, cargo esse sem remuneração. Portanto, qualquer movimentação nos laboratórios do Insa estava sob sua responsabilidade.

O pesquisador realocou os reagentes de um laboratório para outro. A desavença foi judicializada pelo pesquisador contra a pessoa física Mônica Tejo, por danos morais. Esta ação perdurou por um ano e foi encerrada em 2021.

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