Projeto Golfinho Rotador celebra 30 anos de atuação

O maior projeto de conservação de golfinhos do Brasil completa três décadas com lançamento de livro, documentário e exposição sobre a importância da conservação da espécie

A longevidade do trabalho com a mesma população de golfinhos ao longo de 30 anos vem revelando descobertas científicas exclusivas no campo da ecologia comportamental | Foto: Projeto Golfinho Rotador

Por Andréia Vitório
Colaboradora

Fernando de Noronha – PE. O Projeto Golfinho Rotador (PGR), que é hoje um dos maiores programas de pesquisa ecológica de longa duração de golfinhos do mundo, comemora 30 anos de vida. Pesquisando e protegendo a única comunidade oceânica civil do País, o PGR já monitorou mais de dois milhões de vindas de golfinhos rotadores ao Arquipélago de Fernando de Noronha, um dos principais pontos de biodiversidade marinha do País, num trabalho que já soma mais de 70 mil horas de pesquisa e expedições.

A longevidade do trabalho com a mesma população de golfinhos ao longo de 30 anos vem revelando descobertas científicas exclusivas no campo da ecologia comportamental, da genética e da interação com o turismo. Pesquisas evidenciaram, por exemplo, que os rotadores de Noronha são geneticamente diferenciados de outras populações de rotadores do mundo.

Sobre o futuro, o presidente do Centro Golfinho Rotador, Flávio Lima, diz que “continuar fazendo o que atualmente fazemos, já é uma grande vitória, mas pretendemos incrementar a atividade de pesquisa com tecnologias modernas, uso mais intenso de drone, rastreamento por satélite dos deslocamentos dos rotadores, monitoramento acústico passivo dos cetáceos em Noronha e análise biológica para ver o acúmulo de microplástico nos golfinhos”.

Novidades marcam a data

Para marcar o aniversário, foram lançados o documentário Projeto Golfinho Rotador: 30 anos e o livro Golfinhos do Nordeste do Brasil, ambos disponíveis no site www.golfinhorotador.org.br. O vídeo traz imagens do início do Projeto até os dias atuais, enquanto o livro aborda 17 das 21 espécies de golfinhos com ocorrência comprovada no Brasil. Cópias físicas da publicação serão enviadas para universidades e escolas da Região Nordeste.

Instalada em 22 de agosto na base do Projeto Cetáceos da Costa Branca, em Natal, no Rio Grande do Norte, a exposição 30 anos do Projeto Golfinho Rotador vai até janeiro de 2021. Outra novidade é o Conhecendo Noronha, primeiro aplicativo sobre o arquipélago que promove um tour virtual que inclui fotos, vídeos, mapas e informações sobre a região, ainda sem previsão para lançamento.

A celebração desse trabalho tão importante para a conservação marinha acontece nas vésperas da Década Internacional da Oceanografia para o Desenvolvimento Sustentável, em 2021. Instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU), a iniciativa tem a proposta de ampliar a cooperação internacional em pesquisa para promover a preservação dos oceanos e a gestão dos recursos naturais de zonas costeiras.

Conhecer para proteger

Segundo Lima, muita coisa mudou desde o início do Projeto. Fica, no entanto, o compromisso em promover conhecimentos sobre a espécie e seu ambiente para melhor conservá-los: “De 1990 para cá incrementamos nossas pesquisas com o advento de novas tecnologias de captação de imagem e de análise de dados, com computadores e programas mais potentes, e biológicas, a partir de métodos de coleta e de análise de material genético mais eficientes”.

A pesquisa, que é a espinha dorsal do Projeto, consiste no estudo da história natural dos golfinhos-rotadores por meio de sete subprogramas:

  • Ocupação e distribuição de cetáceos (golfinhos e baleias) em Fernando de Noronha
  • Ecologia comportamental
  • Foto e vídeo identificação
  • Caracterização genética
  • Estudo do comportamento trófico dos golfinhos-rotadores
  • Interação do turismo com os golfinhos
  • Rede de Encalhes de Mamíferos Aquáticos

Ao longo desses 30 anos, já são mais de 8 mil dias e 70 mil horas de pesquisa, incluindo monitoramentos de ponto fixo da Baía dos Golfinhos e da Baía de Santo Antônio, em Noronha, expedições de barco e mergulhos com golfinhos.

Já são mais de 8 mil dias e 70 mil horas de pesquisa, incluindo monitoramentos de ponto fixo da Baía dos Golfinhos e da Baía de Santo Antônio, em Noronha, expedições de barco e mergulhos com golfinhos | Foto: Projeto Golfinho Rotador

Identificação

No catálogo de identificação gerido pelo Projeto, são mais de 10 mil fotografias tiradas em mergulho livre na Baía dos Golfinhos e em expedições de barco entre os anos de 1990 e 2020. São cerca de 1.000 indivíduos cadastrados e a identificação dos animais se dá em função de classe etária, sexo e marcas naturais.

Alguns golfinhos já são velhos conhecidos dos pesquisadores. É o caso do filhote avistado em 2000 acompanhado de uma fêmea e de um golfinho híbrido e que na oitava avistagem, em 2002, já era subadulto e foi visto mamando e copulado com a mesma fêmea (mãe).

Genética

O Projeto avaliou geneticamente os rotadores de Noronha e comparou o DNA mitocondrial dos golfinhos do Arquipélago ao de 893 indivíduos de 14 localidades em todo o mundo. O estudo apresenta uma das análises mais completas da diversidade de golfinhos-rotadores em termos de tamanho amostral (893 indivíduos) e cobertura filogeográfica (15 populações), cruzando dados de três bacias oceânicas.

O DNA mitocondrial revelou baixa diversidade, alta diferenciação e alto isolamento dos golfinhos de Noronha em relação a outras populações do mundo. Níveis moderados de diversidade foram detectados pelo DNA nuclear. De acordo com pesquisadores, esses achados enfatizam a vulnerabilidade dos golfinhos-rotadores aos processos genéticos e destacam a importância do desenvolvimento de programas de conservação para essa população.

Pesquisas genéticas indicam também que os golfinhos-rotadores de Noronha formam sociedades com forte fidelidade à Ilha, sendo essa característica mediada pelas fêmeas.

Comportamento de guarda

De 300 golfinhos-rotadores catalogados em excursões de barco e identificados sexualmente, 70% eram machos adultos. O predomínio de machos adultos entre os golfinhos-rotadores que acompanham embarcações indica que este comportamento possui a função de proteção dos demais indivíduos do grupo do molestamento causado pela perseguição de embarcações, sendo destacado um “comportamento de guarda”.

Educar para transformar

Cynthia Gerling, coordenadora de Educação Ambiental e Sustentabilidade, destaca que, ao longo dos anos, aumentou a permeabilidade do Projeto na sociedade noronhense por meio da Educação Ambiental e dos programas de envolvimento comunitário. Entre os desafios dessa trajetória, ela aponta “o crescimento desordenado do turismo no Arquipélago, decorrente de grandes empresários de fora da Ilha.”

Se é verdade que quem não conhece não protege, é indiscutível que sem educação não há mudança. E é pensando nisso que o Golfinho Rotador busca sensibilizar ilhéus, profissionais do turismo, estudantes, professores locais e turistas quanto à necessidade de se preservar os golfinhos e o planeta, destacando os benefícios econômicos, sociais, culturais e de saúde provenientes do meio ambiente equilibrado. Desde 2018, o PGR intensifica suas ações também com a primeira infância.

Além disso, já promoveu mais de 70 cursos profissionalizantes em ecoturismo capacitando 4 mil inscritos. Os cursos de formação em profissões relacionadas ao turismo local – como condutor de visitantes no Parque Nacional Marinho, instrutor de mergulho e conversação em inglês – são gratuitos.

O Projeto Golfinho Rotador conta com o patrocínio oficial da Petrobras, por meio do Programa Petrobras Socioambiental, desde 2001. Ele integra a Rede de Projetos de Biodiversidade Marinha (Rede Biomar), fruto da parceria entre a Petrobras, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) para juntar esforços em prol da conservação marinha no Brasil. Atualmente fazem parte os Projetos Albatroz, Baleia Jubarte, Coral Vivo, Golfinho Rotador, Meros do Brasil e Tamar.

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