Por Alice Sales
Colaboradora
Fortaleza- CE. A principal preocupação dos ativistas que atuam no movimento popular contra o novo aterro da Praia de Iracema são os riscos de impactos ambientais negativos sobre a biodiversidade marinha local. Em nota enviada à Agencia Eco Nordeste, na última segunda-feira (7), a Prefeitura Municipal de Fortaleza afirma que nos estudos liderados por Fábio Perdigão, professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece), não há risco de impactos ao meio ambiente com a realização da obra, não existindo, inclusive, a necessidade de discutir uma eventual compensação ambiental.
“O estudo identifica que quando a maré baixa, nós temos em torno de 50 a 60 metros de área de praia e o que estamos fazendo, de fato, é uma engorda da faixa de praia para trazer benefícios para a cidade e que já foi comprovado que não tem corais nessa área”, ressalta a prefeitura.
No entanto, a análise feita pelo Instituto de Ciências do Mar (Labomar), da Universidade Federal do Ceará (UFC), instituição convidada pela própria Prefeitura de Fortaleza para realizar o estudo e monitoramento de impactos sobre o meio ambiente, decorrentes da engorda de praia, revela o contrário.
Segundo o corpo técnico do Labomar, os recifes de arenito que serão cobertos pelo aterro deixarão de existir, e com monitoramento das áreas recifais do entorno ao aterro que restarem será possível avaliar o quanto destes ecossistemas ainda será mantido e o que pode representar um refúgio para espécies típicas desses ambientes, como lagostas, esponjas, corais, lírios-do-mar e peixes.
Quanto à faixa de praia arenosa, que muitos consideram desprovida de vida e que se trata apenas de areia, a pesquisa aponta que ela é constituída por uma biota rica e muita bem adaptada às condições da praia. Esta biota será perdida pelo recobrimento com areia, da mesma forma toda a faixa abaixo da linha da maré baixa até a extensão do aterro mar a dentro.
“Não é possível prever, neste momento, que espécies irão se estabelecer e como será a sua dinâmica. Isto vale para organismos que vivem enterrados, como moluscos, poliquetas, crustáceos e equinodermos assim como para aqueles que estão na coluna d’água, como plâncton e até peixes”, destaca o corpo técnico do Labomar.
E completa: “Com toda certeza, o surgimento de novos habitats após a construção do aterro só será possível se houver medidas de despoluição da orla, com a retirada ou tratamento dos canais pluviais contaminados por esgotos domésticos, retirada de lixo da faixa de praia e dos recifes de arenito, entre outras medidas. Só assim, a recolonização da área por larvas importadas de áreas saudáveis adjacentes poderá ser bem sucedida.”
Dentre os impactos negativos ao meio ambiente provenientes da construção do novo aterro listados pelo Labomar destaca-se:
- Risco de compactação da camada superficial da areia na área destinada ao reforço do leito da praia
- Alteração da qualidade da água
- Geração de efluentes e resíduos sólidos decorrentes da obra
- Alteração da qualidade do ar (emissão de gases e material particulado)
- Risco de alteração da qualidade da água quanto a contaminantes
- Na área entre a praia e o alto-mar, poderá ter alterações nos parâmetros físicos, químicos ou biológicos
- Mudança da área de alimentação e reprodução de espécies
- Interferências sobre a fauna associada
- Interrupção da migração de espécies
- Alterações na diversidade biológica
- Interferência sobre os botos-cinzas
Como compensação ambiental diante dos danos causados ao meio ambiente, o Labomar recomenda um projeto que promova a balneabilidade das praias de Fortaleza, restauração marinha com recifes artificiais como instrumento de reforço ao turismo, maricultura e sequestro de carbono e a implantação de um santuário subaquático em Fortaleza com rotas.
Novo aterro
O novo aterro da Praia de Iracema faz parte do projeto de Requalificação da Avenida Beira-Mar. O empreendimento prevê um avanço de 80 metros mar adentro, com extensão de 1,2 mil metros, totalizando uma área de 96 mil metros quadrados.
Um equipamento retira areia do fundo do mar e remaneja para a beira da praia, resultando no aterro que ficará no mesmo nível do já existente. A engorda da faixa de areia está sendo executada entre os espigões das avenidas Desembargador Moreira e Rui Barbosa. A obra é orçada em R$ 70 milhões.
O empreendimento vem causando grande mobilização entre ativistas e pesquisadores e é questionado por um processo judicial promovido pelo Instituto Verdeluz, Associação Brasileira dos Defensores dos Direitos e Bem-Estar dos Animais e a Organização Não Governamental (ONG) Deixa Viver.
Como forma de dar mais transparência, respaldo técnico ao projeto a Prefeitura de Fortaleza firmou parceria com o Labomar/UFC, com a Uece e a Associação de Pesquisa e Preservação de Ecossistemas Aquáticos (Aquasis), a fim de desenvolver estudos acessórios e adicionais sobre os impactos causados pela obra.