Ambiente e comunidades ficam vulneráveis a nova exploração de petróleo no RN

Imagem aérea de terreno avermelhado com dunas de areia clarinha ao centro e vegetação em direção à praia, onde a areia clara ressurge

claros, quase brancos, aos avermelhados. Os claros são de areias marinhas, lavadas; os avermelhados, das falésias (inativas) | Foto: Marco Túlio Diniz

Areia Branca / Assu / Baraúna / Macau / Mossoró / Guamaré/ Porto do Mangue – RN. A notícia da aquisição de blocos ao lado, próximos e em zona de amortecimento de Unidades de Conservação do Rio Grande do Norte (RN) na Oferta Permanente da Agência Nacional de Petróleo e Gás, no último dia 13 de abril, deixou pesquisadores que atuam na região apreensivos.

“Sem dúvida, qualquer cientista da área ambiental recebe com preocupação a notícia sobre áreas naturais sendo leiloadas para exploração de combustíveis fósseis, especialmente nas proximidades, ou pior ainda, nos limites imediatos de áreas protegidas, como ocorre no RN especialmente nos casos da Área de Proteção Ambiental (APA) Dunas do Rosado e da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Ponta do Tubarão, onde populações tradicionais que vivem da pesca coabitam com espécies relevantes da flora e da fauna em duas das poucas áreas do Nordeste onde a vegetação semiárida da Caatinga se entrelaça com extensas e exuberantes dunas litorâneas e se encontra com áreas de manguezais, ecossistemas sensíveis e raros que nos fornecem importantes serviços como a recarga de aquíferos e o cenário ideal para a procriação de peixes e frutos do mar, respectivamente”, afirma Paulo Marinho, que é doutor em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e professor de Biologia do Estado do Ceará.

Considera este conteúdo relevante? Apoie a Eco Nordeste e fortaleça o jornalismo de soluções independente e colaborativo!

E conclui: “No RN, a situação é ainda mais grave pelo cenário ambiental desfavorável, já que menos de 1% do território do bioma Caatinga no Estado é protegido em unidades de conservação, e grande parte das áreas sensíveis e prioritárias para a conservação deste bioma no Estado não são efetivamente protegidas, sendo progressivamente ocupadas por empreendimentos como parques eólicos e solares, que acabam contribuindo significativamente para a degradação ambiental. Então, além de ameaçar ecossistemas frágeis das UCs já estabelecidas e seu entorno, com potencial de perda de habitat para espécies e de poluição do solo, a exploração dos blocos de petróleo recentemente leiloados deve se somar a várias outras ameaças para as áreas naturais relevantes que permanecem desprotegidas no Estado”.

Mapa do Brasil com recorte da Bacia Potiguar e imagem de satélite especificando as áreas com legendas

No mapa elaborado pelo Instituto Arayara é fácil identificar que blocos adquiridos na Oferta Permanente da Agência Nacional de Petróleo e Gás ficam ao lado, próximos e em zona de amortecimento de Unidades de Conservação do RN

Além da APA Dunas do Rosado e da RDS Ponta do Tubarão, o Parque Nacional (Parna) Furna Feia e a Floresta Nacional (Flona) do Açu são ambientes biodiversos, com habitantes que vivem do mar e do campo, pessoas de vida simples, que preservam seu espaço de moradia.

A região da APA do Rosado fica nos municípios de Porto do Mangue e Areia Branca. A UC que terá em seus limites áreas de extração de petróleo, abriga não apenas pescadores. Muitos exercem outras atividades econômicas, como o turismo, graças ao monumento geológico de valor cênico-paisagístico. A APA Dunas do Rosado é uma categoria de UC, que permite múltiplos usos. Essa APA se consagra como um patrimônio geológico potiguar.

Típico de áreas do interior nordestino, o bioma Caatinga, neste ponto do litoral brasileiro, avança até bem próximo à linha da costa, sem que haja entre os dois ambientes uma vegetação de transição, como ressalta o professor Paulo Marinho. Este cenário ocorre em raros locais do mundo, sendo uma característica que corre um sério risco de ameaça de extinção, explica o técnico em Biodiversidade e Conservação Ambiental da Arayara, Thiérs Wilberger. A região é extremamente sensível também por ser uma zona de transição entre a Caatinga e a Mata Atlântica.

Segundo o Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema) do Rio Grande do Norte, essa vegetação se distribui em área exatamente posterior a dunas de aproximadamente três metros, fixadas em solo raso e pedregoso. A vegetação está intimamente relacionada com o campo de dunas, pois toda a cobertura vegetal existente se configura como uma barreira que impede as areias de avançar sobre o continente. É a vegetação que, ao coabitar as “bordas” do campo de dunas, evita que a areia se desloque em direção às plantações e até mesmo a poços de petróleo, o que prejudicaria a produção.

A área da Ponta do Tubarão, que abrange um campo de aproximadamente 12.940 hectares, localiza-se entre os municípios de Macau e Guamaré, abrange seis comunidades tradicionais que estão inseridas nos limites da Reserva. Foram identificados distintos ambientes naturais, dunas, estuário e lagoas, manguezal e restinga, ecossistemas associados à Mata Atlântica, considerados pela Lei como Áreas de Preservação Permanente (APPs). Cada ambiente apresenta uma rica quantidade de espécies e uma vasta biodiversidade, que a interface mar-continente proporciona a proliferação da vida.

Já a área Flona de Açu, que fica no município de Assu,  apresenta importantes espécies vegetais típicas da Caatinga com fisionomias variadas, desde arbóreas até abertas. O remanescente da Caatinga da Flona contribui para a conservação de mais de 25 espécies-chaves da fauna e da flora. Muitas dessas espécies da flora encontram-se vulneráveis ou em perigo de extinção, como a catingueira, a aroeira-do-sertão e a baraúna. A fauna também tem espécies ameaçadas, tais como as aves arapaçu-do-nordeste, sebinho-de-olho-de-ouro e pica-pau-anão-da-caatinga, além de felinos como gato-do-mato-pintado e gato-mourisco.

Garantir a conservação e o desfrute público dos recursos e valores da Flona é fundamental, pois, se forem degradados, tanto o propósito quanto o significado da existência da UC podem estar em risco com a exploração do petróleo na região.

O Parna Furna Feia, inserido no Semiárido nordestino, nos municípios de Baraúna e Mossoró, possui formação predominante do tipo caatinga arbustivo arbórea. É importante destacar a ocorrência do cedro, espécie ameaçada de extinção nacionalmente, e da aroeira-do-sertão, espécie declarada imune ao corte. Na região da UC foram identificadas 31 espécies de mamíferos, 176 de aves e 16 espécies de invertebrados troglóbios, que são aqueles que vivem apenas no meio subterrâneo, incapazes de completar seus ciclos de vida fora de cavernas.

Este Parna apresenta 14 espécies de troglóbios endêmicos da UC. Há registro também de porco-do-mato, que atualmente é pouco observado no bioma Caatinga. Destacam-se os rivulídeos, que são espécies de peixes ameaçadas de extinção e carente de estudos. Além desses, existem outros animais que estão ameaçados de extinção como os felinos jaguarundi e gato-do-mato; a ave conhecida como jacucaca; e o roedor mocó que é endêmico da Caatinga.

Dimensão

A região nordeste será a mais impactada na perfuração de poços. No Rio Grande do Norte, uma área de oito blocos negociados, que corresponde a 222,76 quilômetros quadrados, encravada na Caatinga, sem consulta às comunidades que serão impactadas, o que fere a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. Esse parecer, por si, já poderia inviabilizar a legalidade deste leilão.

Com informações do Instituto Arayara

Quer a apoiar a Eco Nordeste?

Seja um apoiador mensal ou assine nossa newsletter abaixo: