Este conteúdo é o segundo de uma série de três especiais do jornalista Flamínio Araripe, em colaboração para a Eco Nordeste, fruto de viagem a São Raimundo Nonato, no Piauí, onde fez uma imersão na natureza do presente e do passado e em intervenções importantes e necessárias para a preservação de um patrimônio singular.
Rute Andrade, bióloga com especialização em Entomologia, ciência que estuda os insetos, trabalhou no laboratório de Imunologia do Instituto Butantã, onde estudava aranhas. Em 2007, soube da presença de aranha marrom, a mais venenosa no Brasil, na Serra da Capivara.
Na época, o edital para criação dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT), pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), garantiram recursos para a sua pesquisa e passou a coordenar o projeto da área de Biodiversidade no INCT Toxinas, e fazer o levantamento dos aracnídeos importantes para a saúde na região da Serra da Capivara, onde encontrou dois exemplares (macho e fêmea) de uma espécie de aranha marrom, ainda não descrita na ciência, que denominou Loxosceles niedeguidonae.
Foi uma homenagem a Niède Guidon, que criou o Parque Nacional Serra da Capivara e incentivou a abertura do campus da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) em São Raimundo Nonato. Rute Andrade hoje é secretária regional da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) no Piauí.
Rute Andrade resolveu submeter um artigo a respeito na revista ZooKeys, publicação científica bem classificada em rankings de impacto. Uma dúvida fez com que não enviasse logo o original à redação. Precisava perguntar a Niède Guidon o que achava de dar o nome da arqueóloga à descoberta do aracnídeo encontrado, Loxosceles niedeguidonae.
A pesquisadora temia que Niède Guidon pudesse julgar de forma pejorativa que a aranha fosse batizada com o seu nome. “Receei que ela pudesse pensar que eu a estava chamando de venenosa”. Deste modo, antes de enviar o artigo para publicação, Rute Andrade conta que julgou importante perguntar à homenageada se ela não se sentiria ofendida.
“Para minha surpresa, Niède adorou a homenagem e disse que não era para descobrir o soro (antídoto) para o veneno da aranha, pois o Homo sapiens destrói a natureza!”, revela a autora. Rute Andrade explica que esta aranha marrom é a que tem o veneno mais tóxico no Brasil, e também a responsável pelo maior número de acidentes.
O artigo “Loxosceles niedeguidonae (Araneae, Sicariidae) a new species of brown spider from Brazilian semi-arid region”, publicado na revista ZooKeys, em 2012, descreve a espécie de aranha marrom, Loxosceles niedeguidonae, descoberta no Parque Nacional Serra da Capivara, no Piauí, pesquisa foi liderada por Rute Maria Gonçalves de Andrade, do Laboratório de Imunoquímica do Instituto Butantan, em São Paulo.
A Loxosceles niedeguidonae é a primeira espécie de aranha marrom endêmica do Semiárido brasileiro. A descoberta é relevante, pois amplia o conhecimento sobre a diversidade de aranhas marrons, um grupo de grande importância médica. A aranha se destaca por apresentar características que a diferenciam de outras espécies do grupo “gaucho”, a que ela pertence.
A pesquisa de Rute Maria Gonçalves de Andrade contribui para o conhecimento da fauna de aranhas marrons no Brasil, amplia o entendimento sobre a diversidade e a evolução desses aracnídeo e também ressalta a necessidade de continuar o investimento nessas pesquisas, principalmente no que diz respeito à sua distribuição geográfica, comportamento e impacto na saúde humana.
Consta no artigo que a pesquisa foi realizada no Parque Nacional Serra da Capivara, uma área federal protegida no Sudeste do Estado do Piauí, Brasil, com 129.953 hectares nos municípios de São Raimundo Nonato, Coronel José Dias, João Costa e Brejo do Piauí. “Juntamente com o Parque Nacional Serra das Confusões, também no Piauí, é uma das maiores áreas protegidas do mundo com vegetação da formação ‘Caatinga’, situada entre a depressão ‘Médio São Francisco’ (Pré-cambriana) e a bacia sedimentar Piauí-Maranhão (Siluriano-Devoniano), as duas maiores formações geológicas do Nordeste brasileiro”.
Leia a primeira matéria desta série aqui:
Bióloga inicia, no Piauí, a criação do Museu da Caatinga