Estudo revela que água de Fernando de Noronha possui níveis elevados de metais

Levantamento geoquímico do SGB-CPRM identifica níveis elevados naturalmente de metais em solos. Impacto pode atingir as águas já escassas do arquipélago

No estudo, foram identificadas fontes de contaminação nas escassas fontes de águas superficiais do arquipélago | Foto: Hesíodo Góes

O Serviço Geológico do Brasil (SGB-CPRM) divulgou dados geoquímicos de toda a superfície do Arquipélago de Fernando de Noronha. O estudo possibilitou o estabelecimento de níveis de referência ou background dos teores elementares em solos e sedimentos de drenagem, além da identificação de possíveis fontes de contaminação nas escassas fontes de águas superficiais. O Atlas Geoquímico do Arquipélago de Fernando de Noronha, que tem como autor principal o geólogo Enjôlras Medeiros Lima, está disponível no site do SGB-CPRM, na área do Rigeo.

O recobrimento geoquímico superficial contemplou a determinação dos teores de 53 elementos químicos em 71 amostras de solos, 16 de sedimentos ativos de drenagem, seis de águas superficiais e duas de águas de abastecimento. De acordo com a geóloga do SGB-CPRM Melissa Franzen, a dispersão dos elementos químicos no ambiente é controlada inicialmente pelos processos naturais, porém, a atividade humana contribuiu em áreas específicas para a alteração do ambiente geoquímico a partir dos núcleos habitacionais e das atividades instaladas.

A partir das análises, a pesquisadora Melissa Franzen alerta sobre o fósforo, nutriente desejável em solos e prejudicial em águas superficiais devido ao risco de eutrofização, situação em que determinadas espécies como as cianobactérias desenvolvem estratégias de adaptação, como a liberação de toxinas, que não são eliminadas no tratamento de água convencional. Os resultados apontam excesso na forma de fosfato em todas as drenagens – riachos e açudes. Nos açudes, a baixa velocidade da água, aliada ao excesso de nutrientes, insolação e temperaturas elevadas, propiciam as condições ideais para a ocorrência da eutrofização.

Foram identificados níveis de background naturalmente elevados de alguns metais (cromo, cobre, manganês, níquel, zinco e ferro), devido à composição do substrato vulcânico básico-ultrabásico predominante na ilha, onde sobressaem especialmente os teores de cromo e níquel, que se encontram uma ordem de grandeza acima dos limites de segurança ambiental.

Níveis muito altos de fósforo em solos e sedimentos, e teores pouco acima da referência ambiental de cádmio, amplamente distribuídos na ilha principal, cuja origem está associada à deposição de guano (dejetos de aves) também foram identificados. Já os teores pouco acima da referência ambiental de arsênio, em pontos isolados, devem ser creditados a uma possível influência antrópica (humana). A situação não representa risco imediato à saúde humana, desde que os solos não sejam utilizados para a produção de alimentos.

Com uma extensão territorial de 26 Km², dos quais 17 km2 são da ilha principal e 9 km2 são distribuídos entre as ilhas menores, ilhotas e rochedos, e uma densidade demográfica que ultrapassa os 154,55 hab/km2 [Censo de 2010], a população (nativa e residente) foi estimada em 2019 em 3.061 habitantes. Com o fluxo de turistas, entretanto, estima-se em cerca de 5.000 os usuários de água potável nos períodos normais, chegando a 8.000 na alta estação.

A disponibilidade de água é muito restrita e o abastecimento público faz uso do Açude Xaréu, de maior volume e responsável por cerca de 60% do atendimento, complementados com água do mar dessalinizada na Estação de Tratamento da Água (ETA). Das fontes de abastecimento, foram amostrados o Açude Xaréu e a água bruta da ETA, que corresponde a uma mistura de água doce e dessalinizada. No Açude Xaréu, apesar de melhor qualidade, também havia excesso de fosfato e baixos níveis de oxigênio dissolvido, que expressam a dificuldade de depuração da matéria orgânica frente ao excesso de produtividade e a baixa taxa de renovação da água.

A escassez de água potável se deve em parte ao clima tropical, com temperaturas elevadas e acentuada estiagem, magnificada pela reduzida capacidade de retenção, resultando que praticamente inexistem cursos de água perenes – aqueles cujas águas correm durante todo o ano. Na ilha principal foram localizadas apenas 16 drenagens, a maioria delas intermitentes ou temporárias, pois a água só escorre na estação chuvosa. No período coincidente com o início da estação seca, apenas seis delas estavam com alguma água corrente. Nos riachos, foram encontrados indícios de contaminação por resíduos domésticos no Boldró (cloretos e nitratos) e de dejetos recentes de animais no Atalaia (nitritos), este último, sem ocupação urbana.

procedimento de amostragem de solo | Foto: SGB-CPRM

Dentre as ações do Levantamento Geoquímico de Baixa Densidade no Estado de Pernambuco, o Atlas Geoquímico do Arquipélago de Fernando de Noronha visou o conhecimento da paisagem geoquímica deste delicado e isolado ecossistema insular, com o objetivo de prover subsídios à sustentabilidade ambiental. “O reconhecimento de forma integrada das suas peculiaridades geoquímicas naturais, com a convivência do ser humano e da população animal, associada à atividade de turismo, possibilita o direcionamento da aplicação futura de recursos públicos e privados, com a indicação de alvos para investigações mais detalhadas de prevenção de sanidade ambiental”, finaliza Franzen.

Com informações do Serviço Geológico do Brasil (SGB-CPRM)

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