Descarte careta

Foto colorida de um carrinho de supermercado de lado, no corredor formado por gôndolas. Ele está pela metade de compras de frutas, legumes, vegetais, ovos, pão. Depois dele aparece a parte inferior da silhueta de um homem observando a gôndola ao lado direito
Imagem meramente ilustrativa de um carrinho com compras no supermercado | Foto: Freepik

No supermercado, pago as compras e constato que não há como empacotar. Estou em Brasília e, como não moro mais lá initerruptamente, fico para lá e para cá, e para acolá, esqueci-me desse detalhe. É lei antiga, tem uns quatro anos. O cumprimento começou com advertências, ações educativas. Depois passou-se a cobrar pelas sacolas e no momento não as há, simplesmente.

Avalio a minha situação e fico meio desesperada. Como vou carregar tudo aquilo até o apart hotel, sem embalagens? A senhora do caixa oferece recipientes de papelão, aqueles que abrigaram os produtos vindos dos fornecedores. Não tenho opção e aceito. Carregá-los até o UBER é incômodo. Além dos olhares de condenação, para não falar dos comentários indignados.

– Desculpem, não moro aqui, não sabia, defendo-me. Só piora. De qual buraco venho eu, onde se usa sacolas suspeitas para embalar as compras? Boa pergunta. Independentemente de lei, eu só uso retornáveis. Eu e muita gente. Nesse lugar de onde venho e para onde volto. Juro! Em silêncio, justifico-me de mim para mim.

Compras arrumadas nos armários da mini cozinha, não consigo livrar-me do desconforto de ter cometido infração, agido com incivilidade. Volto à infância, quando as garrafas eram devolvidas à loja que as devolvia às fábricas que as higienizava para reúso. Naquele tempo em que as gerações desconheciam sustentabilidade, o petróleo não era soberano e os manifestos tinham sido orquestrados, da esquerda à direita, pela sua legalização.

Daí percebo que não será difícil voltar a reusar. A roupa era seca ao sol e ao vento, nos varais dos quintais. Não havia máquinas, robôs domésticos, Alexias, Magalus. Não é ruim ter facilidades. Porém, podemos ficar com a inclusão sem o desperdício, sem o veneno, salvar os peixes envenenados pelo plástico espalhado aos sete mares.

Sinceramente, acho enjoado esse papo de no meu tempo é que era bom, justo, seguro. O meu tempo é hoje, ontem e amanhã. Sinto que tudo melhorou. Só temos que fazer a coruja e deitar olhos, agir com bicos de beija-flor, ao invés de gralhar ao vento.

Tuty Osório é jornalista, especialista em pesquisa qualitativa e escritora. Publica crônicas em Blogs de Interesse Geral e neste Portal especializado em Meio Ambiente e Sustentabilidade. São de sua lavra “Quando fevereiro chegou” (contos de 2022); “Sônia Valéria, a cabulosa” (quadrinhos com desenhos de Manu Coelho de 2023) e “Memórias sentimentais de Maria Aguda”, dez crônicas, um conto e um ponto (crônicas e contos, também de 2023), todos em formato digital.

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