As recentes tragédias ambientais que temos enfrentado no Brasil e no mundo são o alerta definitivo de que precisamos tomar medidas urgentes para mitigar as consequências da crise climática. A prevenção de novas calamidades passa pela conservação de nossos biomas, assim como nos ensinam há gerações os povos originários e nos alerta a comunidade científica.
Dentro deste contexto, neste mês de maio, Fortaleza recebeu a notícia, pelas redes sociais de diversas entidades ambientalistas da cidade e também do vereador Gabriel Aguiar, do Psol, de que, em área próxima ao Aeroporto Internacional de Fortaleza Pinto Martins, seriam derrubados 200 mil metros quadrados de floresta, com uma rica biodiversidade de animais silvestres, para a realização dos quatro dias de festa do Fortal.
O superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no Estado do Ceará, Deodato Ramalho, se manifestou, no fim da quarta-feira (15), no Instagram. Ele afirmou ter recebido a denúncia de um crime ambiental em área próxima ao Aeroporto Internacional de Fortaleza e que, depois de duas visitas técnicas, foi constatada a supressão de vegetação sem autorização, o que resultou em autuação e embargo da obra.
Ele declarou, ainda, que também iria ouvir a empresa, continuar acompanhando o caso e comunicar ao Ministério Público Federal e Estadual a questão. Ele informou, também, que área embargada, que seria destinada à obra é de 3 hectares, dentro de uma área mais ampla de 17 hectares, segundo informado pela Fraport, concessionária do Aeroporto.
Geógrafa, doutora em Desenvolvimento e Meio Ambiente, escritora e fundadora da Escola Beeosfera, Magda Maya destaca que Fortaleza vem, ao longo de seu histórico de urbanização, perdendo sua cobertura vegetal, aterrando lagoas, canalizando rios, dentre outras alterações no seu território natural, cujas repercussões serão sentidas cada vez mais dentro de um cenário de mudanças climáticas.
“Somando-se a tudo isso o fato de ser uma cidade litorânea e plana, o resultado é que aquilo que estamos testemunhando hoje no Rio Grande do Sul é também um risco real para nossa cidade que não pode mais permitir qualquer perda na cobertura vegetal, impermeabilização de solos ou aterramentos, porque somente a natureza preservada poderá nos ajudar no processo de adaptação e resiliência daqui para frente. Não é à toa que cidades inteligentes e sustentáveis aplicam Soluções Baseadas na Natureza”, declara.
Nesta quinta-feira (16), 88 biólogos assinaram uma carta aberta à sociedade pela preservação das áreas verdes de Fortaleza. Na carta, eles destacam a área em questão “pela sua importância para a biodiversidade local e para a qualidade de vida urbana, assim como por sua importância biogeográfica, visto que representa um dos poucos fragmentos de Mata Atlântica restantes na capital cearense, sendo assim, protegida pela Lei Nº 11.428, de 22 dezembro de 2006, conhecida como Lei da Mata Atlântica”.
Os biólogos destacam que, além de sua importância ecológica, “as áreas verdes em zonas urbanas desempenham um papel fundamental na prestação de diversos serviços ecossistêmicos essenciais para a sociedade que em caso de interrompimento, certamente demandaria grande aporte econômico para substituí-los, afora outros prejuízos incalculáveis. Essas áreas atuam como reguladoras do microclima urbano, mitigando os efeitos das ilhas de calor e contribuindo para a melhoria da qualidade do ar ao absorver dióxido de carbono e outros poluentes atmosféricos. Além disso, também atuam como importantes filtros naturais, auxiliando na infiltração de água no solo e na recarga de aquíferos, contribuindo assim para a segurança hídrica das cidades”.
Leia a carta dos biólogos na íntegra:
Carta Aberta à Sociedade: Pela Preservação das Áreas Verdes em Fortaleza, Ceará!
Nós, um coletivo de biólogos e biólogas do estado do Ceará, expressamos através desta carta abaixo assinada nossa profunda preocupação com o avanço contínuo dos desmatamentos de remanescentes florestais na cidade de Fortaleza.
Neste momento, a atividade que requer toda a atenção é o desmatamento de uma área florestal de, aproximadamente, 20 hectares, localizada no Aeroporto Internacional de Fortaleza – Pinto Martins. Esta área se destaca pela sua importância para a biodiversidade local e para a qualidade de vida urbana, assim como por sua importância biogeográfica, visto que representa um dos poucos fragmentos de Mata Atlântica restantes na capital cearense, sendo assim, protegida pela Lei nº 11.428, de 22 dezembro de 2006, conhecida como Lei da Mata Atlântica.
Esse importante fragmento florestal está sob ameaça devido aos planos da FRAPORT, empresa detentora da concessão do aeroporto Internacional de Fortaleza, que disponibilizou a área para realização de um festival de música, o Fortal, com duração de quatro dias por ano. Essa decisão não é apenas prejudicial para o ecossistema local, mas também contradiz os valores de preservação ambiental que a FRAPORT alardeia para seus acionistas e clientes, tanto no Brasil quanto na Alemanha. Em alguns anos, sua concessão irá expirar e a sociedade fortalezense ficará com esse passivo ambiental.
Além de sua importância ecológica, as áreas verdes em zonas urbanas desempenham um papel fundamental na prestação de diversos serviços ecossistêmicos essenciais para a sociedade que em caso de interrompimento, certamente demandaria grande aporte econômico para substituí-los, afora outros prejuízos incalculáveis. Essas áreas atuam como reguladoras do microclima urbano, mitigando os efeitos das ilhas de calor e contribuindo para a melhoria da qualidade do ar ao absorver dióxido de carbono e outros poluentes atmosféricos. Além disso, também atuam como importantes filtros naturais, auxiliando na infiltração de água no solo e na recarga de aquíferos, contribuindo assim para a segurança hídrica das cidades.
Adicionalmente, áreas verdes proporcionam espaços de recreação e lazer, promovendo o bem-estar físico e mental da população, e são cruciais na promoção da resiliência urbana frente a eventos climáticos extremos, como as inundações e deslizamentos. A destruição dessas áreas representa não apenas uma perda irreparável em termos de biodiversidade, mas também a privação dos benefícios ecossistêmicos vitais que elas proporcionam à sociedade.
Considerando o exposto, afirmamos que há alternativas locacionais para este evento, bem como para projetos imobiliários, que não demandam a derrubada de áreas verdes.
Destacamos que nossa opinião enquanto biólogos e biólogas, profissionais dedicados à proteção e conservação da natureza, não é um empecilho ao desenvolvimento, mas sim uma voz em defesa do equilíbrio entre o progresso humano e a preservação ambiental. Em tempos em que as mudanças climáticas são claramente um desafio à nossa sobrevivência enquanto espécie, a ciência deve ser voz ativa e norte para tomada de decisões que tenham impacto direto para a nossa e para futuras gerações.
Por meio desta carta, convocamos a sociedade, os órgãos ambientais competentes, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE), Secretaria do Meio Ambiente e Mudança do Clima (SEMA), Secretaria Municipal do Urbanismo e Meio Ambiente (SEUMA), Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), os organizadores do Fortal, os artistas envolvidos e todos os cidadãos impactados por essa ação a se manifestarem e a garantir que essa área não seja destruída. Precisamos agir agora para proteger nosso patrimônio natural e garantir um futuro sustentável para as gerações vindouras.
Juntos, podemos fazer a diferença. A preservação da natureza é responsabilidade de todos nós!
Atenciosamente, Biólogos e Biólogas do estado do Ceará.