Pesquisadores e ativistas alertam sobre riscos da poluição crescente em rios e no oceano

Areia da praia com garrafas plásticas e outros resíduos em primeiro plano, pessoas sentadas mais ao fundo e, mais atrás, prédios. Uma pequena área do mar aparece quase no alto, no canto superior esquerdo com algumas pessoas em pé à margem

Paisagem da orla marinha de Fortaleza(CE) afetada por resíduos descartados na praia | Foto: Juaci de Oliveira

O mês de setembro, todos os anos, convida o mundo inteiro a refletir sobre a poluição que causamos aos nossos rios e mares. Essa reflexão é promovida globalmente pelos movimentos World Cleanup Day e International Coastal Cleanup, iniciativas internacionais que já envolveram milhões de voluntários em mais de 190 países, com ações de limpezas de rios e praias em diferentes locais do Planeta.

Além de mobilizar a sociedade em mutirões de limpeza, o objetivo é ressaltar a importância das ações individuais e dos governos na conservação desses ambientes, e sobretudo, alertar para o fato de que grande parte de todos os resíduos que descartamos acaba indo parar nos rios e oceano, o que afeta todas as formas de vida que dependem desses ecossistemas, inclusive a nossa.

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As fontes dos resíduos que chegam ao mar são diversas. A maioria está em terra. Eles podem chegar ao oceano por meio de rios, por exemplo. Um estudo realizado pelo Projeto Blue Keepers, ligado à Plataforma de Ação pela Água e Oceano do Pacto Global das Nações Unidas (ONU) no Brasil, realizado em parceria com o Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP), aponta que 3,44 milhões de toneladas de plástico podem chegar ao oceano, por ano, no Brasil. Essa quantidade equivale a 33% de todo o plástico que entra no mercado brasileiro anualmente.

Além disso, a pesquisa sugere que mais da metade (52,26%) dos municípios brasileiros apresentaram uma liberação potencial de mais de 100 ton/ano de plástico no meio ambiente. O estudo revela, ainda, quais são as cidades no Brasil que mais poluem o oceano com plástico, o que demonstra que as capitais e grandes cidades são as mais propensas a que isso ocorra. Zonas costeiras e os rios amazônicos estão entre as regiões com maior risco de levarem a poluição plástica para o oceano. Cerca de 67% dos resíduos plásticos propensos ao escape para o meio ambiente estão nessas bacias hidrográficas com maior risco.

Porto Alegre (RS), Curitiba (PR), São Paulo (SP), Campinas (SP), Rio de Janeiro (RJ), Campo Grande (MS), Contagem (MG), Belo Horizonte (MG), Brasília (DF), Goiânia (GO), Salvador (BA), Aracaju (SE), Maceió (AL), Recife (PE), João Pessoa (PB), Natal (RN), Fortaleza (CE), Teresina (PI), Belém (PA), Manaus (AM), estão entre as cidades com maior potencial de poluírem seus rios e mares com resíduos plásticos.

Adriana Lippi, oceanógrafa e membra da secretaria executiva da Liga das Mulheres pelo Oceano, observa que, a partir do relatório da pesquisa, podemos observar que áreas do Nordeste que possuem escape mais altos com relação ao número de habitantes, como Fernando de Noronha (PE) e Barra de São Miguel (AL), são bastante impactadas pelo turismo.

Frente ao cenário crescente do descarte de resíduos sólidos que ameaçam a vida marinha, Juaci de Oliveira, coordenador do Projeto Limpando o Mundo Ceará, manifesta a preocupação com a previsão de que esses números aumentem nas próximas décadas:

“É um problema que recai no consumo e na produção de plástico pelas indústrias. Somada a isso há a relação da cultura de uma sociedade que precisa de educação ambiental, e a governança dos estados e municípios para reduzir, reciclar e repensar a forma de tratar seus resíduos. A mesma garrafa plástica que encontramos há 20 anos está em maior quantidade nos ambientes naturais. Em julho retiramos mais de 2.000 itens da Praia de Iparana (Litoral Oeste do Ceará), cerca de 80% eram de material plástico”.

Juaci relembra que, de 1996, quando o Projeto Limpando o Mundo Ceará teve início, aos dias atuais, tivemos o fortalecimento de leis e políticas públicas internacionais, mas pontua que pouco se avançou no Nordeste em relação a fechamento de lixões, avanço na reciclagem e cooperativas de coleta seletiva. “Há um mercado fechado só para empresários que ganham licitações para tratar os resíduos sólidos”, detalha.

O ativista ressalta que o movimento no Ceará começou com a sociedade civil preocupada em proteger os ecossistemas costeiros. “Hoje temos governo, prefeituras, empresas e voluntários na causa. Mas o que precisamos é de um avanço nas políticas públicas e efetivação das leis que já existem. Temos uma frota pesqueira, orlas urbanas com eventos e bairros sem saneamento, sem limpeza pública adequada que trazem impactos enormes e mais resíduos indo parar nos rios e mares. Há mais de 10 anos anunciamos os danos ambientais regionais e locais. São mais de 1 milhão de animais marinhos que morrem por ano ao comerem plástico”, completa.

O micro plástico é um problema que a sociedade enfrenta silenciosamente, destaca: “Comemos plástico por alimentos como peixe e bebemos plástico na água que tomamos hoje. Onde vai nos levar tudo isso? Aumentar a pressão por políticas públicas e a educação ambiental são o caminho”.

Adriana Lippi considera que, em nível local, uma das principais estratégias de mitigação é ter uma ótima gestão de resíduos sólidos para evitar que alcancem o meio ambiente e acabem chegando nos rios e oceano.  Para ela, também é importante atentar para lugares turísticos, já que geralmente os turistas levam muitas coisas plásticas pela praticidade.

“É importante que haja um estímulo para um turismo de menor impacto e que essa gestão seja feita de forma especializada. Precisamos repensar a produção e consumo do plástico, principalmente esses de uso único. É importante que tenhamos uma regulamentação e práticas de logística reserva, onde os produtores desses materiais se responsabilizem pelo destino final do resíduo após o consumo, caso contrário nunca fecharemos a conta dessa grande produção de plástico junto com uma má gestão e não ter onde colocar esse material, levando em consideração a demora que leva para se degradar. É importante pensarmos em longo prazo. Será que conseguimos substituir esses materiais?”, pondera.

Ações em Setembro

Até o fim do mês de setembro, a Associação Brasileira de Combate ao Lixo no Mar (ABLM), por meio do Projeto Limpando o Mundo Ceará, em comunhão com uma rede de parceiros, promoverá diversas atividades de sensibilização ambiental, incluindo mutirões de limpeza, capacitações “Guardiões dos Mares e Rios”, atividades artísticas e lúdicas.
O encerramento dessas atividades será no dia 30, com a ação “Limpeza de Áreas Naturais e Ações Educomunicativas”, às 14h30, na Apa Estadual do Estuário do Rio Ceará, na Barra do Ceará.

Com o apoio do Projeto Coral Vivo, patrocinado pela Petrobrás, a Rede Biomar também realizou ações múltiplas de limpezas de praia em dez cidades brasileiras, com cerca de 35 pontos de limpeza, no último dia 16, data escolhida como dia D de limpeza neste ano.

“Essa é uma ação que já é realizada há muitos anos e o Coral Vivo foca em formar pessoas para serem líderes em eventos nas suas localidades, o que faz com que a gente consiga alcançar mais quilômetros de praia em cidades onde não estamos presencialmente. Conseguimos monitorar esses lugares a partir desses parceiros. É um evento que mobiliza as pessoas, que saem das suas casas para limpar as praias. Nós percebemos esse interesse no assunto e vemos uma mudança de comportamento na sociedade, o que esperamos é que essa mudança seja levada para dentro de casa também”, conta Flávia Guebert, oceanógrafa e coordenadora geral do Projeto Coral Vivo.

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