Inovações inspiradas na natureza são desenvolvidas durante maratona de ideias em Fortaleza

Fundo do mar, com grande esponja marinha de tons alaranjados e formatos cilindricos. Ao fundo há um mergulhador fazendo um coração com as mãos

Uma das inovações se inspirou no mecanismo de esponjas marinhas para conter microplásticos existentes na água | Foto: Marcus DavisFortaleza – CE. Já imaginou que a solução para alguns problemas enfrentados pela sociedade pode ser encontrada na natureza? Esse princípio é conhecido como Biomimética, área da ciência que se inspira em funções e mecanismos da natureza para a criação de tecnologias e inovações sustentáveis. É só lembrarmos de quando Leonardo Da Vinci esboçou máquinas voadoras inspiradas no movimento natural do voo das aves. Outro exemplo mais moderno, é o trem bala japonês, que inspirado no bico do pássaro martim pescador, hoje opera em alta velocidade sem emitir o estrondoso barulho, que antes era um problema.

Essa apropriação da inteligência natural para criar soluções foi o fio condutor para inspirar cientistas de diferentes áreas durante a primeira edição do Thinkathon, realizada durante os Encontros Universitários 2023, sediado pela Universidade Federal do Ceará (UFC), por meio da Pró-Reitoria de Relações Interinstitucionais (Prointer). A maratona de ideias foi realizada em parceria com a Escola de Sustentabilidade 4.0 e teve a Eco Nordeste como uma das apoiadoras. O intuito foi estimular a criação de novos modelos de negócios sustentáveis, a partir da mentoria ministrada por Magda Maya, ambientalista, fundadora da Escola de Sustentabilidade 4.0 e Pesquisadora Biomimeticista.

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“Precisamos deixar de ambientalismo ingênuo. Precisamos mudar o nosso modelo econômico e pensar em negócios com propósito. Pensar no propósito antes do negócio e mudar o nosso mindset nesse sentido”, ressaltou Magda Maia, durante a mentoria.

Inovações de destaque

Sete pessoas em pé, lado a lado, entre homens e mulheres. Dois deles estão vestidos de branco, os demais vestem azul. Um deles fala ao microfone, ao fundo há um painel onde há uma imagem rosa projetada, com os dizeres: 'Thinkathon, maratona de ideias para a Sustentabilidade 4.0'

Equipes falaram sobre seus projetos na presença do pró-reitor adjunto de Relações Interinstitucionais da UFC, professor Barros Neto | Foto: Alice Sales

Em dois dias, as cinco equipes participantes se reuniram para pensar sobre as mais criativas soluções sustentáveis inspiradas na natureza, com o desafio de solucionar três grandes problemas ambientais: a redução da poluição por plásticos, a criação de energias sustentáveis e a neutralização da emissão de gases de efeito estufa, como o gás carbônico.

O destaque foi para a telha vegetal desenvolvida pela equipe campeã da maratona, pensada por estudantes da graduação em Ciências Ambientais e de pós-graduação em Ciências Marinhas Tropicais do Instituto de Ciências do Mar (Labomar)/UFC. A tecnologia idealizada durante a maratona promove a eficiência térmica e energética de construções. Integram o time campeão os estudantes de graduação Geann Pablo de Sousa Duarte, Pedro Renato Câmara da Silva e Lorena Kelvia de Paula Muniz e os doutorandos Kelven Pinheiro de Sousa e Anderson Nonato de Freitas.

“O telhado sustentável proposto pela equipe vencedora do 1° Thinkathon se baseia nos princípios da fotossíntese, com composição de fibra vegetal e de receptores da energia solar. O produto prevê a melhoria térmica para o domicílio/imóvel, bem como a produção de energia por meio da conversão de luz solar em elétrica. Assim, além de proteger a casa/domicílio o produto satisfará a necessidade de consumo de energia em parte ou em todo, a depender do porte do imóvel contemplado”, explica um dos membros da equipe vencedora, Kelvin Pinheiro, graduado em Saneamento Ambiental e mestre em Tecnologia e Gestão Ambiental.

O troféu de segundo lugar na maratona foi para a tecnologia que funciona como um filtro para microplásticos presentes na água. A inovação se inspirou na morfologia de placóides presentes na pele de tubarão e no corpo de esponjas marinhas capazes de absorver e reter o plástico existente na água.

“Visto que essas duas estruturas já tiveram alguns estudos que mostraram a presença de microplásticos na sua composição, pensamos em como eles conseguem absorver o microplástico de uma maneira tão eficiente para se criar modelos que podem ser utilizados para filtrar estes microplásticos na entrada e na saída de água das nossas residências”, destacou o integrante da equipe, Hellyson Lucas, químico e doutorando do Programa de Pós-Graduação em Medicina Translacional da UFC.

Em terceiro lugar teve destaque o “Sereno”, uma proposta inovadora desenvolvida por estudantes de pós-graduação em Ciências Morfofuncionais da Faculdade de Medicina e de Graduação em Medicina (UFC). A tecnologia é uma contribuição científica ao esforço social para o enfrentamento de um dos maiores desafios no Semiárido brasileiro: o abastecimento de água para as cidades, indústrias e a agricultura, em um momento de agravamento das mudanças climáticas.

“Neste cenário, cada gota de água conta. O Sereno é como o sertanejo chama o orvalho depositado nas folhas das plantas. É o processo natural de captação da umidade atmosférica que as folhas captam e armazenam. O homem capta água dos rios e poços, mas despreza o manancial do ar. Mesmo estando no Semiárido, boa parte de nosso Ceará apresenta umidade relativa do ar média acima de 70%, o que revela nossa capacidade de produzir água a partir da umidade atmosférica,” detalha Ismael Furtado, estudante de pós graduação em Ciências Morfofuncionais da Faculdade de Medicina da UFC.

A tecnologia foi desenvolvida para captar água da atmosfera de forma a reproduzir o processo natural de captação de água pelas folhas, ao criar um material com propriedades semelhantes às das folhas, com um composto formado pela casca de crustáceos. A proposta é revestir com este material superfícies modulares e escaláveis para captar e armazenar água, para diversos usos, de forma biomimética e sustentável.

Outras duas ideias inspiradas na natureza foram apresentadas durante a maratona e receberam menções honrosas, sendo uma delas uma tecnologia inspirada no trajeto das formigas para reduzir a queima de combustível de caminhões que transportam cargas e uma película para janelas capaz de produzir energia solar.

Soluções interdisciplinares

Um grupo de pessoas, entre homens e mulheres, vestindo roupas de diferentes cores, reunidos lado a lado, uma fila em pé, uma agachada e uma sentada no chão, posa para a foto

O evento reuniu cientistas de diferentes áreas para pensar sobre soluções para a sustentabilidade 4.0

A coordenadora de Empreendedorismo e Inovação da Prointer, professora Conceição Oliveira, ressalta que Thinkathon surgiu de uma proposta de incluir a sustentabilidade do Planeta na programação dos Encontros Universitários 2023, em um formato que deverá continuar nas próximas edições. Segundo ela, a iniciativa segue a tendência atual de empresas de se guiar pelos princípios de sustentabilidade ambiental, social e de governança corporativa, da sigla em inglês ESG (Environmental, Social and Governance).

“No Thinkathon, surgem negócios sustentáveis, e o que vem em primeiro lugar não é o lucro, mas o propósito de resolver problemas graves para os quais urgem soluções”, pondera.

Para Magda Maya, mentora da metodologia que norteou a maratona de ideias, o evento superou as expectativas: “apesar de a gente já conhecer muito bem a potência que é a metodologia da Biomimética para ter essas soluções de Sustentabilidade 4.0, essa foi a primeira vez que rodamos no campo científico, dentro de uma universidade com equipes de diversas áreas do conhecimento e que estavam tendo contato pela primeira vez com a temática. Inclusive áreas de conhecimento que não estão diretamente relacionadas à Sustentabilidade. Sentimos um acolhimento muito grande por parte dos participantes que relataram que conhecer a Biomimética, e a Sustentabilidade 4.0 abriu os olhos deles de uma forma que eles jamais pensaram antes”.

Magda ressalta que o resultado foram essas inovações incríveis como contribuição para melhorar o que já temos de Sustentabilidade. “Muitas vezes temos soluções, por exemplo, de energias renováveis, mas que ainda se valem de tecnologias que não são tão sustentáveis assim ou geram problemas relacionados a resíduos. A proposta dessa maratona de ideias foi justamente aprimorar qual é o próximo passo que podemos dar na Sustentabilidade. Tivemos um júri com grandes nomes da inovação do Estado, acostumados com metodologias específicas para esses hackathons e que também se surpreenderam ao conhecer a potência e as possibilidades trazidas por essa metodologia que é a Biomimética”.

Camila Forte, administradora e coordenadora de projetos do Instituto Senai de Tecnologia, participou da banca avaliadora e destaca que os projetos apresentados possuem alto potencial de mercado, com soluções muito bem pensadas e executadas. “O Thinkatlon é um evento que trouxe impacto para a Universidade, mas acima de tudo, para as pessoas que participaram. Tivemos aqui trabalhos que a gente já consegue até vislumbrar potencial de desenvolvimento, busca de fomento, editais de submissão econômica para que eles possam submeter essas ideias e de fato transformá-las em projetos e em soluções no mercado.”

A professora Ozileia Menezes, ex-diretora do Labomar e Pro-Reitora Adjunta de Extensão da UFC, também participou da banca e atenta para o fato de que as equipes que se apresentaram são de áreas bem diferentes, inclusive algumas que não possuem foco nos negócios e empreendedorismo, como é o caso de equipes formadas por profissionais da saúde. “Considero muito importante que as soluções estejam alinhadas com a Agenda 2030 da ONU e com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Vimos aqui soluções com foco no objetivo 13 (que se refere à redução de impactos das mudanças climáticas) e o 14 ( que se refere à conservação da vida marinha). Foi muito bom, muito produtivo, ideias maravilhosas, tenho certeza que daí surgirá um bom negócio socioambiental e também econômico”, frisa.

Virginia Girão-Carmona, professora da Faculdade de Medicina da UFC, junto com sua equipe conquistou o terceiro lugar na maratona. Ela pontua que esta foi a primeira vez que seu time pensou em soluções para a Sustentabilidade:

“Na nossa equipe somos todos da área da Saúde, nunca tínhamos realizado nenhum trabalho ou tido a oportunidade de trabalhar ideias para a Sustentabilidade. Sob esse ponto de vista foi importante pra gente a experiência de trabalhar em equipe, em estilo maratona, tentando responder a um desafio totalmente fora da nossa zona de conforto. Ficamos extremamente felizes em termos sido reconhecidos como uma das equipes que conseguiu captar a ideia e apresentar um pitch. Tivemos a melhor impressão possível com relação à iniciativa da coordenação de empreendedorismo e inovação da UFC em propor a maratona, como também sobre a Escola de Sustentabilidade 4.0, que foi fundamental para nos mostrar novos horizontes”.

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