Por Alice Sales
Colaboradora
Atividade de destaque no Rio Grande do Norte, a cajucultura enfrenta um dos principais desafios para manter-se produtiva: a seca. Por anos seguidos a irregularidade de chuvas assola o Semiárido brasileiro, dizimando pomares e comprometendo a qualidade e a quantidade das produções de caju. Entretanto, no Oeste do Rio Grande do Norte, mais precisamente no município de Severiano Melo, os clones de cajueiro anão BRS 226 (Planalto) e Embrapa 51 vêm ganhando espaço por se mostrarem resistentes à escassez hídrica, trazendo aos produtores rurais a possibilidade de uma boa produtividade, a despeito da crise climática na região.
Na Fazenda Nossa Senhora Aparecida, propriedade do engenheiro agrônomo Tertulino de Oliveira, situada nos limites dos municípios de Severiano Melo (RN) e Alto Santo (CE), são 216 hectares de pomares com diferentes variedades de cajueiros, nos quais a irrigação depende exclusivamente da água da chuva (sequeiro). Entretanto, segundo o produtor, somente os clones de cajueiro anão BRS 226 e Embrapa 51 se mostram resilientes à ausência de precipitações.
“Os dois clones são muito resistentes durante a seca, diferentemente de outras variedades que não toleram grandes períodos de estiagem. O CCP 76, por exemplo, quando as precipitações são abaixo de 400 mm, não há produção, enquanto o BRS 226 e o Embrapa 51 produzem de forma economicamente vantajosa”, destaca.
Tertulino de Oliveira observa que ambos os clones são resistentes à resinose (Lasiodiplodia theobromae), uma das principais doenças que afetam a produtividade. Além disso, as duas variedades possuem características semelhantes e um grande diferencial por terem uma safra antecipada, que, em sua propriedade, começa em maio e vai até janeiro do ano seguinte.
De acordo com ele, é possível observar, num mesmo cajueiro, todas as fases de produção: “Numa mesma planta temos inflorescência, brotos, maturi jovem, maturi e caju. Temos uma produção distribuída pela maior parte do ano. Nunca falta caju nos pomares, o que para nós é economicamente vantajoso”.
Para o produtor, a principal diferença entre os dois clones é a amêndoa. Segundo ele, o Embrapa 51 produz uma castanha de excelente qualidade, mas de uma aparência não tão atraente para a comercialização quanto a castanha do BRS 226.
Destinada principalmente à indústria de sucos e ao beneficiamento da amêndoa da castanha, a produção da Fazenda Nossa Senhora Aparecida, na última safra, chegou a render aproximadamente 1.200 kg de caju por hectare, com total de 80% de aproveitamento do pedúnculo, em um período que registrou precipitações de 500 mm.
Adaptação em diferentes regiões
De acordo com o pesquisador da Embrapa Luiz Serrano, o clone Embrapa 51 foi selecionado em Pacajus, no Ceará, enquanto o BRS 226 foi lançado no município de Pio IX, no Piauí. Serrano ressalta que ambas as regiões de seleção dos clones são muito secas, com precipitações médias anuais de 700 mm, e, que foi constatada uma boa adaptação ao observar a desenvoltura das duas variedades em outros lugares, sendo que o Embrapa 51 se destaca em locais de altitude média com até 400 m. Já o BRS 226 possui boa adaptação em regiões de mais altitude e noites frias.
Segundo ele, nos últimos anos, principalmente entre os anos de 2012 e 2017, que foi um período de poucas chuvas, foi possível observar que esses dois clones se desenvolveram muito bem, apesar da carência de água. “O Embrapa 51 está presente no Ceará, Rio Grande do Norte e Piauí, mas tem se destacado nas imediações da Chapada do Apodi, na região da Serra do Mel (RN) e no Cariri cearense”.
De acordo com o pesquisador, a adaptação dessa variedade se sobressai nas proximidades da Chapada do Apodi, onde estão situados os municípios de Severiano Melo (RN) e Alto Santo (CE), desde que que os produtores adotem práticas de manejo, principalmente para o controle de oídio, doença fúngica que afeta os cajueiros.
Quanto ao BRS 226, Serrano afirma que se trata de um clone mais novo, muito cultivado no Piauí, que agora dá bons resultados no Ceará e em todas as regiões produtoras no Rio Grande do Norte.
“É um clone que ainda está em fase de avaliação, mas os resultados dos nossos experimentos já comprovam uma excelente adaptação dessa variedade em diferentes regiões”, explica.
O pesquisador recomenda o clone Embrapa 51 em regiões em que as noites possuam temperaturas moderadas e o BRS 226 em todas as regiões produtoras do Piauí, Rio Grande do Norte e Ceará.
Produção de mel consorciada com a cajucultura
Ainda na Fazenda Nossa Senhora Aparecida, a presença da cajucultura atrai uma outra atividade: a produção de mel de abelhas africanizadas, que se beneficiam das flores e do pedúnculo dos cajueiros. Como estratégia, as colmeias são instaladas entre a mata nativa e os pomares, para quando as plantas da mata não estiverem em períodos de floração e frutificação as abelhas tenham os cajueiros como opção para produzir.
Para Tertulino de Oliveira, o consorcio entre as duas atividades tem dado bons resultados e é possível obter até dois períodos de produção de mel ao ano. “As abelhas consorciadas aos cajueiros é um ótimo método para que ambos se beneficiem. Há pesquisas científicas que apontam que a produção das abelhas resulta em um significativo aumento na produtividade dos cajueiros”, explica.
Cajueiro anão BRS 226
Lançado em 2002, O BRS 226 é recomendado para plantio comercial de sequeiro (plantio que depende exclusivamente da água da chuva) no Semiárido. É de pequeno porte e na fase adulta raramente ultrapassa os três metros de altura, permitindo a colheita manual. O clone é recomendado para o mercado de amêndoa, mas seus pedúnculos vêm agradando também as indústrias de sucos.
Cajueiro anão Embrapa 51
O clone Embrapa 51 foi lançado pela Embrapa Agroindústria Tropical para plantio comercial em cultivo de sequeiro no Semiárido. Além de ser resistente à resinose e à estiagem. Outra vantagem é que a safra ocorre quase sem interrupções por até dez meses, porque as etapas de desenvolvimento do fruto ocorrem simultaneamente.
O clone apresenta como características plantas de porte baixo, com altura média de 3,5 m no sexto ano de idade. No quinto ano, sua produtividade média é de 1.510 kg de castanha por hectare. Dependendo da localidade, a safra varia entre julho e novembro.