Carnaúba estimula trabalho exemplar de conservação da Caatinga

O objetivo inicial foi a preservação da carnaúba, árvore símbolo do Estado do Ceará, mas a criação da Associação Caatinga foi muito além | Foto: Eduardo Queiroz

 

A história da Associação Caatinga está estreitamente relacionada à vinda de Herbert Fisk Johnson, em 1935, ao Brasil, na Expedição Carnaúba. Em 1937 foi realizado um grande trabalho no Estado. Além de explorar a cera da carnaúba comercialmente, foram criados hospitais e escolas neste período. Esta é a primeira de uma série de matérias sobre essa trajetória de conservação no Sertão do Ceará e do Piauí.

 

Em seu diário de bordo, ele deixou ao filho, Samuel Johnson, uma dedicatória e um pedido para que refizesse essa viagem, que seria de grande crescimento pessoal e profissional e que fizesse algo pela espécie que deu tanto à família. Em 1998, Samuel Johnson não só refez a viagem, mas teve a ideia de criar uma área para preservar a espécie. Foi daí que nasceu, naquele mesmo ano, a Associação Caatinga, que buscou áreas prioritárias de preservação.

A área da Reserva Natural Serra das Almas (RNSA), em Crateús, englobava não só a carnaúba, mas a natureza como um todo. Ao todo, 98% do Estado do Ceará está na Caatinga, tirando a vegetação costeira e os encraves de Mata Atlântica. Quem nos conta essa história é Gilson Miranda do Nascimento, biólogo e coordenador de conservação da Associação Caatinga.

Com suas espécies adaptadas à semiaridez, o bioma Caatinga recobre praticamente 98% do território cearense | Foto: Eduardo Queiroz

Ela foi criada, em Fortaleza, em outubro de 1998, com o apoio do Fundo para Conservação da Caatinga, estabelecido por Samuel Johnson para a proteção da carnaúba. É uma entidade não-governamental, sem fins lucrativos, reconhecida como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) e faz parte do Cadastro Nacional de Entidades Ambientalistas (CNEA).

Além da Criação da Reserva Particular de Patrimônio Natural (RPPN) Serra das Almas, dois anos depois, onde concentra seu trabalho, a Associação continua atuando especificamente com a espécie que deu origem a tudo, apoiando o Carnaúba Sustentável, projeto conduzido em conjunto com o Sindicato das Indústrias Refinadoras de Cera de Carnaúba do Estado do Ceará (SindCarnaúba).

Valor da floresta em pé

Em 20 anos, já foram produzidas de 150 a 200 mil mudas de espécies nativas e restaurados mais de 100 hectares, isso inclui aproximadamente 50 mil carnaúbas | Foto: Eduardo Queiroz

Gilson explica que há diversas formas de se lidar economicamente com uma floresta mantendo-a em pé com a prestação dos seus serviços ecológicos, entre eles a manutenção da água. “Não é só explorar a madeira. Também tem outras fontes de renda, como o cultivo de sementes e mudas de espécies nativas para quem está produzindo e reflorestando”, destaca.

A Associação Caatinga vem trabalhando, nestes 20 anos, na produção de mudas e restauração florestal, com espécies como tamboril, aroeira, umburana de cheiro, sabiá, mororó, sabonete e catingueira, entre outras. “Já temos manuais que somam a produção de 40 espécies, um total de 150 a 200 mil mudas e restauramos mais de 100 hectares, isso inclui aproximadamente 50 mil carnaúbas”, informa Olavo Vieira, agente ambiental da Associação.

Ele conta que a irregularidade das chuvas andou afetando o trabalho de reflorestamento, mas buscou-se alternativa para isso também, afinal, floresta em pé significa mais água preservada também. “Em 2015, o nível baixou tanto que a água dos poços salinizou demais, daí precisamos pegar água de carro-pipa para balancear. Mas isso também ficou inviável. Nós arrendamos um hectare na cidade, perto da estação de tratamento de esgoto, e implantamos lá um viveiro temporário para manter com água de reúso, nos anos de 2015 e 2016”, conta.

Projeto se destaca na preservação do bioma

O Projeto ‘No Clima da Caatinga’ tem cinco anos já realizou muito pela conservação do bioma | Foto: Eduardo Queiroz

Em 2018, além dos 20 anos da Associação Caatinga e dos 18 anos da RPPN Serra das Almas, o Projeto “No Clima da Caatinga” (NCC) completou cinco anos. Ele tem como foco principal a valorização e proteção da Caatinga – único bioma exclusivamente brasileiro – aliando Tecnologias Sustentáveis à geração de renda familiar por meio de ações nos eixos de educação ambiental, comunicação, preservação, conservação e uso consciente de recursos naturais. Realizado pela Associação Caatinga, o NCC é patrocinado pela Petrobras, por meio do Programa Petrobras Socioambiental e Governo Federal.

Atualmente, o projeto encontra-se na sua terceira etapa (2017-2019) e alcançou números relevantes durante o ano de 2018. Ao todo, 54 pessoas foram capacitadas em resíduos sólidos, 15 em meliponicultura (criação de abelhas nativas da Caatinga) e 158 em coleta e manejo de sementes. Além disso, 30 cisternas de placas estão em fase de construção e 50 recipientes de coleta seletiva foram distribuídos. E para neutralizar as emissões de gás carbônico do Projeto, 500 mudas de plantas nativas também foram semeadas.

Novos vídeos de onças-pardas na Reserva Natural Serra das Almas (RNSA) foram marco em 2018, esses registros realizados por armadilhas fotográficas impulsionaram a pesquisa sobre felinos de grande porte na região. Em sintonia com esse feito, o “No Clima da Caatinga” também monitorou 61,9 hectares de áreas restauradas.

Quando se trata de educação ambiental os números também são animadores, 73 professores da região de Buriti dos Montes (PI) foram capacitados, quatro ferramentas lúdicas foram produzidas e estão disponíveis na RNSA. O No Clima da Caatinga desenvolveu duas oficinas de design em estampas de camisas.

Além disso, alcançou 366 pessoas pelas ações do Cine Tela Verde, que tem o objetivo de levar a exibição de curta metragens sobre meio ambiente, seguidos de uma produção do cinema nacional que retrate a região Nordeste e a Caatinga preferencialmente. Essa ação visa fortalecer a identificação das pessoas com sua terra, principalmente os jovens.

Quase 3 mil estudantes visitaram a exposição ‘Caatinga Um Novo Olhar’, na Seara da Ciência da Universidade Federal do Ceará (UFC), em Fortaleza. Já em relação à exposição de banners e réplicas de animais, 630 alunos foram alcançados durante 2018. Além disso, sete comunidades receberam a campanha Todos Contra a Caça.

Em todos os anos de projeto foram 1.600 pessoas capacitadas no uso e manejo de tecnologias sustentáveis, 409 professores habilitados em educação ambiental e 21 mil alunos sensibilizados. Já a exposição itinerante “Caatinga: Um Novo Olhar” impactou mais de 70 mil pessoas com as belezas da fauna e flora da Caatinga.

No eixo de preservação e conservação da Caatinga, foram recuperadas e protegidas 16 nascentes, 96 hectares de Reservas Legais (RL) e Áreas de Preservação Permanente (APP). O NCC também evitou a emissão de cerca de 152 mil toneladas de carbono (CO2), bem como o sequestro de aproximadamente 12 mil toneladas de CO2 e colaborou na criação de três novas RPPNs no município de Crateús (CE).

“Todos esses números só foram possíveis pelo pioneirismo do Projeto, dedicação da equipe colaboradora e envolvimento das famílias beneficiadas”, destacou Daniel Fernandes, coordenador geral da Associação Caatinga. Todas as ações são desenvolvidas em áreas do entorno da RNSA e na cidade de Fortaleza. Ao todo, são 40 comunidades são atendidas pelo projeto, sendo 30 em Crateús (CE) e dez em Buriti dos Montes (PI).

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