Orgulho que transforma: a luta LGBTQIAPN+ por justiça no NE

Bandeira do arco-íris, símbolo do orgulho LGBTQIAPN+, é erguida por duas mãos contra um céu azul com nuvens brancas. O tecido colorido balança ao vento, destacando-se em contraste com o fundo ensolarado
O Dia do Orgulho LGBTQIAPN+ simboliza a longa e contínua jornada por respeito, dignidade e direitos | Foto: Freepik com uso de IA

Celebrado em 28 de junho, o Dia do Orgulho LGBTQIAPN+ é mais que uma data comemorativa; é um poderoso ato político. Ele simboliza a longa e contínua jornada da comunidade por respeito, dignidade e direitos. No Nordeste, essa celebração ganha contornos próprios, mesclando-se às potências culturais e aos desafios sociais de uma região que luta por um desenvolvimento verdadeiramente inclusivo e sustentável.

Os obstáculos gerados pelo preconceito

Apesar dos avanços, a homofobia e a transfobia continuam sendo barreiras concretas. A violência, seja ela física ou verbal, ainda é uma triste realidade que ceifa vidas e gera medo. Dados do Atlas da Violência 2025 revelam um cenário alarmante: de 2022 para 2023, os casos de violência contra homossexuais e bissexuais registrados no sistema de saúde aumentaram 35%. No mesmo período, a violência contra pessoas transsexuais e travestis cresceu 43%.

Essa hostilidade se reflete no ambiente escolar, um espaço que deveria ser de acolhimento. A Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), citada no Atlas, aponta que 11,4% dos estudantes do nono ano já deixaram de ir à escola por não se sentirem seguros. O bullying motivado por identidade de gênero ou orientação sexual afasta jovens do aprendizado e compromete seu futuro, reforçando um ciclo de exclusão.

As barreiras se estendem ao acesso a serviços básicos. Na saúde, a falta de preparo de profissionais e o preconceito institucional dificultam desde o acolhimento respeitoso até o acesso a tratamentos específicos, como a terapia hormonal para pessoas trans. Essa exclusão sistêmica nega o direito fundamental à saúde e agrava as condições de vulnerabilidade social.

Famílias homoafetivas:
afeto que constrói a sociedade

As famílias formadas por casais LGBTQIAPN+ são uma realidade consolidada e representam um avanço para o conceito de núcleo familiar. São espaços de afeto, cuidado e formação de cidadãos, como qualquer outro. A luta pelo direito ao casamento igualitário e à adoção foram vitórias cruciais, garantidas pelo Judiciário com o reconhecimento da união estável em 2011 pelo STF e a resolução do CNJ em 2013, que determinou a celebração do casamento civil.

Proteger e valorizar todas as configurações familiares é fundamental para construir uma sociedade que se baseia no respeito e na diversidade. Fortalecer essas bases é um pilar indispensável para o desenvolvimento social sustentável, garantindo que crianças cresçam em ambientes seguros e acolhedores, independentemente da orientação sexual ou identidade de gênero de seus pais.

A importância de se orgulhar

O “orgulho” é a resposta direta a uma história de vergonha e invisibilidade imposta. É a afirmação pública de que não há nada de errado em ser quem se é. Essa palavra representa a transformação do estigma em potência e da opressão em luta por cidadania. Celebrar o orgulho é, acima de tudo, celebrar a vida e a coragem de quem abriu caminhos para que hoje seja possível resistir e avançar.

Essa manifestação de identidade é o motor para o avanço. Ao ocupar as ruas, as redes e os espaços de debate, a comunidade LGBTQIAPN+ pauta suas demandas e mostra sua força. O orgulho é o que move a busca contínua por direitos, visibilidade e por uma participação plena na sociedade, contribuindo com novas perspectivas, talentos e inovações em todas as áreas, da cultura à economia.

No Nordeste, território de efervescência cultural, o orgulho se manifesta de formas únicas e potentes. Artistas da comunidade ressignificam tradições, da música ao artesanato, e criam narrativas que desafiam o preconceito. Festas populares, como o São João, tornam-se, aos poucos, espaços mais inclusivos, onde a diversidade celebra e fortalece a identidade cultural da região.

Direitos:
vitórias da luta, não concessões

No Brasil, os direitos da população LGBTQIAPN+ foram, em sua maioria, conquistados por meio de intensa mobilização social e decisões do Supremo Tribunal Federal (STF). O reconhecimento do casamento (2011/2013), a criminalização da LGBTfobia como crime de racismo (2019) e o direito ao uso do nome social são marcos históricos dessa trajetória de luta.

Essas vitórias, contudo, revelam a frequente omissão do poder legislativo e a necessidade de vigilância constante da sociedade civil. É preciso transformar essas decisões judiciais em leis claras e robustas, que não possam ser revertidas. A cidadania plena só será alcançada quando os direitos forem garantidos ativamente pelo Estado em todas as suas esferas, com políticas eficazes.

Políticas públicas para
um futuro de equidade

Direitos no papel não bastam; é preciso que eles se materializem em políticas públicas eficientes e intersetoriais. Isso significa criar programas de saúde que atendam às especificidades da comunidade, combater a evasão escolar de jovens expulsos de casa e promover a empregabilidade, garantindo autonomia e dignidade.

A construção dessa equidade passa, fundamentalmente, pelos municípios. A criação de Centros de Cidadania LGBTQIAPN+, ambulatórios de saúde integral e o fortalecimento de conselhos de direitos locais são estratégias que aproximam o poder público da realidade da comunidade, oferecendo suporte direto e efetivo onde a vida acontece.

Para que essas ações sejam eficazes, é urgente superar a invisibilidade estatística. O Brasil ainda carece de dados demográficos abrangentes sobre sua população LGBTQIAPN+. Sem saber quantas pessoas são, onde vivem e quais suas reais necessidades, o Estado planeja no escuro, dificultando a criação de políticas baseadas em evidências e verdadeiramente transformadoras.

Iniciativas como o programa “Acolher+”, do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, que fortalece casas de acolhimento para a população LGBTQIAPN+ em vulnerabilidade, são passos importantes. É fundamental que estados e municípios do Nordeste desenvolvam e implementem seus próprios planos para garantir a inclusão, a segurança e a promoção da cidadania. Um desenvolvimento sustentável real só existe com justiça social para todos, todas e todes.

Este artigo foi escrito a convite da Eco Nordeste por João Henrique Viana, homem cisgênero gay, professor da Universidade de Fortaleza, na área de Marketing, doutorando em Administração e especialista em Diversidade e Inclusão. Ele utiliza suas plataformas para produzir conteúdo educativo e combater a LGBTfobia, unindo a vivência pessoal à análise acadêmica e de mercado.

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