Três brasileiros, sendo dois deles do Nordeste, estão entre os cinco finalistas regionais da premiação Jovens Campeões da Terra, promovida pela ONU Meio Ambiente para viabilizar soluções inovadoras para problemas ambientais
Neste 2019, a iniciativa da agência das Nações Unidas recebeu mais de 900 inscrições de empreendedores de todo o Planeta engajados com a Sustentabilidade. Os concorrentes foram divididos por região de origem. A organização do prêmio escolheu cinco finalistas para cada uma das sete regiões contempladas.
Os vencedores vão receber consultorias técnicas e uma verba de 15 mil dólares para tirar suas ideias do papel. Eles serão anunciados em setembro, durante evento das Nações Unidas em Nova Iorque.
Da América Latina e Caribe, há três brasileiros com propostas de negócio distintas:
Moradia em sintonia com a natureza
Idealizador da Casa do Semiárido, um projeto de habitação que visa construir residências mais adequadas à realidade dessas regiões secas do Brasil. O empreendimento propõe um modelo de habitação que acompanha as oscilações do meio ambiente e utiliza matérias-primas naturais na construção. As instalações também são projetadas para garantir o reúso de água e a produção da própria alimentação.
Bernardo Andrade, como estudante, em 2012, passou um mês na empresa Earthship Biotecture, no Novo México, que constrói casas usando materiais reciclados. De volta ao Brasil, ganhou uma bolsa de estudos para adaptar a técnica ao Nordeste. Em 2015, como arquiteto, decidiu construir o primeiro “Earthship” no Brasil, uma casa solar passiva, baseada em meus estudos de materiais naturais. A casa é um laboratório e local de treinamento para estudantes e entusiastas em auto-construção sustentável, em parceria com empresas privadas.
“Me sinto lisonjeado por ter sido um dos finalistas deste concurso incrível. A Casa do Semiárido é para mim um projeto muito querido, pois pode impactar milhões de pessoas nesta região do País. Além dos colaboradores, estudantes e profissionais, um grande parceiro é o Poço de Jacó. Essa ONG torna possível a aplicação do projeto piloto, no município de Pentecoste, aqui no Ceará. Esperamos começar em breve o projeto e conseguir financiamento com a ajuda da exposição do concurso”, afirma sobre a final do Jovens Campeões da Terra.
O projeto de bioconstrução Casa do Semiárido visa promover o desenvolvimento local sustentável, por meio da construção de casas mais adequadas para a região nordeste do Brasil. As casas imitam fenômenos naturais para melhorar o desempenho e são construídas inteiramente a partir de materiais naturais, como terra e madeira, com iluminação natural e refrigeração integrada.
Os princípios da permacultura asseguram que todos os elementos do fornecimento do projeto sejam reciclados ou reutilizados, e os alimentos também são produzidos em casa, com a água capturada, armazenada, gerenciada adequadamente e reutilizada. “Nosso objetivo é reunir governo, comunidade, empresas privadas e instituições acadêmicas para produzir alimentos de alto valor para as famílias. A Casa do Semiárido fornecerá água limpa, comida, abrigo confortável para a família, enquanto reunirá a comunidade pelo conhecimento e trabalho compartilhados”, vislumbra Bernardo.
Água potável para todos
Anna Luísa Beserra desenvolveu uma tecnologia de purificação e desinfetação da água por meio da energia solar. A Aqualuz é uma ferramenta que permite transformar a água da chuva em água potável.
Desde 2013, ela vem criando tecnologias inovadoras e sustentáveis para tratamento de água e gestão de resíduos sólidos. Foi assim que fundou a startup “Água Potável para Todos”, em 2015, para desenvolver uma tecnologia que eu começou quando tinha 15 anos. Além da SDW, ela é Young Water Fellow e desenvolve um biodigestor para casas urbanas.
“Ser selecionada como uma das finalistas do Jovens Campeões da Terra da ONU foi uma das melhores notícias que tivemos neste ano. É uma grande honra para mim e para o Aqualuz, que, com isso, ganha ainda mais credibilidade. Esperamos poder ganhar o prêmio para poder mudar a vida de mais famílias no Semiárido por meio do acesso ao bem mais essencial à vida: água potável”, declara.
Aqualuz é um dispositivo reconhecido pela ONU que custa apenas US$ 125,00 e reduzirá a carência de acesso à água potável. Isso ocorre por meio de um sistema de captação de águas pluviais das áreas semiáridas do Brasil, mas com potencial de aplicação em outros países. O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendaram o princípio da desinfecção solar da água, desenvolvida pela Aqualuz, como a única tecnologia no mundo para cisternas, que só precisa da luz solar para tornar a água da chuva adequada ao consumo.
Trata-se de uma tecnologia validada no campo, com muitas vantagens em comparação aos concorrentes, incluindo filtro de argila, cloração e ebulição da água. O sistema pode durar até 20 anos e seus componentes podem ser reciclados. Também é fácil manter e limpar usando água e sabão. Só no Brasil, a tecnologia pode atender mais de 1,2 milhão de famílias com as cisternas existentes. Nenhum componente químico prejudicial à saúde ou à natureza é usado. “Planejamos atingir 700 pessoas até o fim de 2019”, afirma Anna Luísa.
O Aqualuz já obteve o segundo lugar na Hack Brazil, competição que reuniu 400 startups de tecnologia e chegou ao fim durante a Brazil Conference at Harvard and MIT, em abril passado, por estudantes brasileiros em Boston, nos Estados Unidos.
Veja matéria: Dispositivo nordestino de filtragem solar da água é vice-campeão de competição nos EUA
O aparelho consiste em uma caixa de inox coberta por um vidro e uma tubulação simples. Em apenas três passos, o usuário obtém água potável por meio da luz irradiada pelo sol: bombeamento da água da cisterna até a caixa, passando por um filtro ecológico feito de sisal, que retém as partículas sólidas; armazenamento da água na caixa de inox para o ciclo de desinfecção, expondo-a à radiação solar e à alta temperatura que desativa o DNA dos patógenos remanescentes; e, por fim, a retirada da água pela torneira acoplada à caixa de inox, pronta para consumo após um ciclo de quatro horas.
Blockchain para melhores cadeias de valor
Bárbara Schorchit é a criadora da iniciativa Genecoin, que promove práticas de blockchain para rastrear o uso da Biodiversidade brasileira em cadeias de produção. O objetivo do projeto é mapear a utilização de recursos naturais a fim de garantir compensações justas e equitativas dos ganhos obtidos com a sua exploração.
Entusiasta da Ciência de Dados, Bárbara Schorchit é engenheira química premiada como Jovem Empreendedora pela Shell Livewire Brazil. Entrou para o Bootcamp do Global Launchpad do Google Launchpad, o Lean Startup Launchpad da UC Berkeley e o programa pré-acelerador da Draper University, no Vale do Silício. Em 2018, fundou a Genecoin – Blockchain for Biodiversity como uma forma de usar a tecnologia para ajudar a proteger o meio ambiente.
Genecoin foi criado inspirado pelo Protocolo de Nagoya sobre Acesso e Repartição de Benefícios da Convenção sobre Diversidade Biológica. Sua missão é aproveitar as tecnologias de blockchain e machine learning para rastrear a Biodiversidade usada em produtos, permitindo que as empresas ganhem confiança, segurança jurídica e transparência ao longo de sua cadeia de suprimentos – e mapeiem a origem, a jornada e o impacto de seus suprimentos de forma acessível e de maneira confiável.
Além disso, a Genecoin pretende usar o blockchain como uma ferramenta para cumprir a legislação brasileira, melhorando a rastreabilidade. Combinado com a implementação de contratos inteligentes, isso permitirá a distribuição de receita ao longo de toda a cadeia de fornecimento para garantir que todos os interessados sejam compensados de forma justa, equitativa e transparente. “Nossa plataforma foi desenvolvida em parceria com as comunidades locais e atualmente trabalha com a maior reserva privada da Mata Atlântica“, destaca Bárbara.
Além destas três propostas brasileiras na etapa regional da América Latina e Caribe, um jovem brasileiro também concorre na Europa. Felipe Villela é fundador da iniciativa holandesa reNature, que implanta agroflorestais para empresas e indústrias em transição para uma agricultura mais sustentável. O objetivo é restaurar 1 milhão de hectares de solos degradados até 2030.
Os 35 finalistas regionais estão empenhados em enfrentar uma série de problemas que ameaçam a saúde do Planeta e dos seres humanos. De projetos de proteção da vida silvestre no leste de Angola à distribuição de veículos elétricos em Cingapura, passando pela fabricação mais sustentável de têxteis no México, os competidores estão atentos a ameaças como a destruição dos ecossistemas, a perda da Biodiversidade e a poluição dos mares e do ar.
Os vencedores serão selecionados por um júri global, formado pelo CEO da Covestro, empresa de polímeros financiadora da premiação, Markus Steilemann; a chefe interina da ONU Meio Ambiente, Joyce Msuya; a correspondente de Ciência e Mudanças Climáticas da VICE News Tonight, Arielle Duhaime-Ross; a enviada para a Juventude do secretário-geral da ONU, Jayathma Wickramanayake; e a presidente e CEO da Fundação das Nações Unidas, Kathy Calvin.
Cada ganhador receberá 15 mil dólares em financiamento, mentoria de especialistas, treinamento personalizado em liderança, storytelling e comunicação e acesso a redes e mentores de destaque.
Leia mais sobre a premiação no site das Nações Unidas
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