No interior do Estado da Bahia, existe um tesouro geomorfológico que embeleza o País. Trata-se da Chapada Diamantina, um relevo elevado e plano, com formações rochosas de extrema beleza cênica e complexa evolução geológica e geomorfológica, caracterizando uma serra úmida em pleno core semiárido (Figura 1).
Por Vanda Claudino-Sales
Geógrafa
Professora associada aposentada da Universidade Federal do Ceará (UFC)
Professora visitante da Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA)
vcs@ufc.br
As rochas que sustentam a Chapada Diamantina são antigas: datam de 1,8 bilhão de anos (Era Proterozoica), quando foi formada uma bacia sedimentar no interior do continente, a Bacia do Espinhaço (do tipo bacia intracratônica ou sinéclise), a partir das amplas e profundas depressões (os chamados rifts) geradas a partir da divisão do primeiro megacontinente que a história geológica registra, o Columbia.
Normalmente, ao longo da história evolutiva pela qual a Terra passa, as rochas sedimentares tendem a sofrer processos de metamorfismo em resposta à dinâmica tectônica ao qual incessantemente são submetidas, os quais alteram os minerais, a estrutura e forma das rochas. As rochas da Chapada Diamantina, no entanto, foram pouquíssimo metamorfizadas, e exibem estruturas sedimentares muito antigas que são dessa forma raramente visíveis em outras partes do mundo.
Ao longo da evolução tectônica, isto é, de movimentação de rochas na litosfera, pela qual a bacia sedimentar passou, ela foi soerguida e sofreu inversão de relevo. Em outras palavras: as rochas foram formadas em condições rebaixadas, como acontece com as áreas que sofrem deposição, e agora representem relevos elevados que se sobressaem em meio ao sertão, com altitudes que alcançam até 1.200 m.
A rede de drenagem, através de rios de porte regional, dissecou as camadas sedimentares horizontais, criando amplas depressões interplanálticas do tipo vales simétricos, conhecidos como vales em manjedoura (ver figura 1). A dissecação fluvial isolou também volumes de relevo, gerando feições do tipo mesas, e outras ainda menores, chamadas de morros testemunhos, assim denominados por representarem vestígios dos volumes maiores de relevo (figura 2). O processo de recuo lateral das vertentes mantendo a forma (backwearing – figura 3), que é um processo areolar, isto é, que atua nas vertentes, explica o formato íngreme das encostas, bem como a amplidão dos vales.
Riqueza Hidrológica
A maior umidade na Chapada Diamantina deriva da sua altitude. Isso cria condições de plúvio-nebulosidade acentuadas, gerando precipitações anuais que superam os 1.300 mm, o que por sua vez gera um rico lençol freático, dada a permeabilidade dos sedimentos. Um dos efeitos dessas características hidroclimatogeológicas é a presença de muitas nascentes e quedas d’água. A água brota nos topos das mesas e escoam pelas vertentes em profusão, criando belos regatos e borbulhantes cachoeiras (Figura 4).
Dentre os quase 42.000 Km2 de área da Chapada, cerca de 152.000 hectares são protegidos na forma do Parque Nacional da Chapada Diamantina, criado por decreto federal em 1985, hoje administrado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Embora não tenha muito controle do acesso de visitantes, o qual ocorre por diversas entradas, o ICMBio calcula que o número de visitantes anuais ultrapassa os 50 mil (ICMBio, 2020).
A Unidade de Conservação possui grande diversidade ecológica e ambiental em seu território, abrangendo três biomas brasileiros, que são a Mata Atlântica, o Cerrado e a Caatinga. O Parque está inserido nas Reservas da Biosfera (RB) da Caatinga e da Mata Atlântica. Do ponto de vista da fauna, há poucos grandes mamíferos, mas ocorrem muitas espécies de pequenos mamíferos, além de répteis, anfíbios, aves e insetos.
O Parque Nacional da Chapada Diamantina é uma excelente opção para a prática caminhadas, mountain bike, banhos de rio, escaladas e canoagem junto à natureza. São quase 300 Km de trilhas que percorrem campos rupestres, cerrado e mata atlântica em meio a paisagens de tirar o fôlego; formadas por cachoeiras, (dentre elas a Cachoeira da Fumaça, com 390 m de altura), cavernas; locais de escalada; sítios históricos; além do “marimbus”, uma área alagada de grandes proporções, conhecida como “Pantanal da Chapada Diamantina”.
Não há cobrança de ingresso para entrar no Parque. Que tal desvendar essa maravilha nas próximas férias que a pandemia permitir? Conhecer pode ser preservar, preservar é defender. Vão longo, antes que os incêndios destruam fauna e flora e a ocupação para pecuária bovina e agricultura destruam a paisagem, como pretende esse governo desestruturador da natureza. Vamos resistir!
Referências bibliográficas
HAGGE, R.C.F.; CHAVES, J.M.; ROCHA, W.J.S.F.;LIMA, C.C.U. (2012). Caracterização do relevo dos municípios de Abaíra e Rio de Contas para o conhecimento da diversidade de ambientes naturais da Chapada Diamantina – Bahia. Anais do X Simpósio de Geografia Física Aplicada, vol. 1, p, 10-18.
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatítica). (2020). Chapada Diamantina: centro de estatísticas e informações. https://biblioteca.ibge.gov.br/biblioteca-catalogo.html?view=detalhes&id=224667. Acesso em 13 de outubro de 2020.
ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). (2020). Chapada Diamantina. https://www.icmbio.gov.br/portal/visitacao1/unidades-abertas-a-visitacao/9396-parque-nacional-da-chapada-da-diamantina. Acesso em 12 de outubro de 2020.
Adorei a matéria, Obrigada Vanda, por compartilhar o conhecimento!! Sempre que estou pelas trilhas do vale me pergunto como aconteceram estas formações !!