Animais de Mata Atlântica que ocorrem no Nordeste são protegidos pela Itaipu

Neste fim de ano, a Itaipu Binacional  comemorou o marco de 24 milhões de árvores plantadas nas áreas protegidas do entorno do reservatório da usina, ação estreitamente ligada à conservação da fauna silvestre local

A iniciativa teve início em 1975, quando o Plano Básico de Conservação do Meio Ambiente da hidrelétrica previu o inventário de fauna, o resgate dos animais silvestres durante o enchimento do reservatório | Foto: Alice Sales

Por Alice Sales *
Colaboradora

A onça-pintada (Panthera onca) é considerada o maior felino das Américas. Trata-se de um animal de beleza excepcional, robusto, de hábitos solitários e que é cada vez mais raro de ser encontrado na natureza. A espécie, ocorre no Brasil em diferentes habitats, podendo ser encontrada em todos os biomas brasileiros, com exceção do Pampa.

Já a harpia (Harpia harpyja), é considerada uma das aves predatórias mais fortes do Planeta e maior ave de rapina brasileira. Pode ser encontrada em florestas longínquas da Amazônia, mas também ocorre na Mata Atlântica, Cerrado e Pantanal.

No Nordeste, ambas as espécies possuem registros de ocorrência em raras áreas de Caatinga e Mata AtlânticaAlém disso, o que a onça-pintada e a harpia possuem em comum é que as duas são espécies predadoras do topo da cadeia alimentar e importantes indicadoras de qualidade do habitat onde vivem. As duas espécies são também carros-chefes de um projeto de conservação de animais silvestres da Mata Atlântica executado pela Itaipu Binacional.

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A iniciativa teve início em 1975, quando o Plano Básico de Conservação do Meio Ambiente da hidrelétrica previu o inventário de fauna, o resgate dos animais silvestres durante o enchimento do reservatório e o hospital veterinário para atendimento desses animais. 

Em uma operação pioneira no País batizada como Mymba Kuera, a maioria dos animais resgatados durante a inundação do reservatório foi solta nas áreas destinadas como Refúgios Biológicos e em remanescentes florestais próximos. Alguns dos animais que não tiveram condições de retornar à natureza foram encaminhados ao hospital veterinário e permaneceram no Criadouro de Animais Silvestres da Itaipu Binacional (Casib), com o objetivo de conservação ex-situ, reprodução, pesquisa e educação ambiental. 

“Atualmente, a Itaipu mantém e reproduz animais de espécies endêmicas ameaçadas de extinção na região, alguns deles descendentes dos animais resgatados na Operação Mymba Kuera, e dispõe de um hospital veterinário bem equipado para atendimento de seu plantel de animais silvestres e para o atendimento dos animais silvestres vitimados e resgatados em toda a região e mantendo apenas aqueles em que não haja mais possibilidade de retorno à natureza”, detalha Teles. 

Harpias no Refúgio Biológico Bela Vista | Foto: Sara Cheida

No Refúgio Biológico Bela Vista, Unidade de Conservação criada pela Itaipu em 1984 para receber esses animais, além da onça-pintada e da harpia, a iniciativa empreende esforços para lidar com outras espécies como o cervo-do-pantanal, anta, lontra, veado-bororó e o mutum de penacho. Segundo Teles, alguns desses animais estão ameaçados em todo o Brasil, consideradas extintas na região oeste do Paraná, sendo necessários os esforços para reprodução e futuro revigoramentos populacionais.

Parte desses exemplares são descendentes e oriundos dos programas de reprodução dos animais resgatados na operação Mymba Kuera e uma outra parte são animais vitimados (atropelamento, caça, órfãos ou tráfico de animais para comercialização como pets) que são recebidos e atendidos pelo hospital veterinário. Há também animais oriundos dos programas de conservação ex-situ com manejo integrado entre os empreendimentos de manejo de fauna.

Quanto à onça-pintada e à harpia, o veterinário destaca que são animais que precisamos compreender cada vez mais seu manejo e reprodução e é necessário manter uma população de segurança sob cuidados humanos para que futuramente seja possível trabalhar em  reintroduções e revigoramentos populacionais no bioma Mata Atlântica. Teles explica que são duas espécies com alto grau de ameaça de extinção para o bioma e que, por serem topo de cadeia alimentar, têm um papel fundamental no equilíbrio florestal. “Caso consigamos que retornem às áreas restauradas, nos indicarão que toda a cadeia trófica retornou ao ambiente e a floresta alcançou seu ápice funcional“.

Atualmente, o projeto mantém o gene de Mata Atlântica da onça-pintada e já reproduziu 54 filhotes de harpias, que foram enviadas para programas de conservação parceiros, incluindo alguns no exterior.

24 milhões de árvores plantadas 

Lago de Itaipu e floresta no entorno do reservatório | Foto: Alice Sales

Em um esforço de 42 anos de trabalho, o reflorestamento das áreas do entorno do reservatório da usina teve início em 1979, quando uma primeira linha de árvores foi plantada na faixa de proteção da margem esquerda da área inundada. De acordo com Ariel Scheffer, superintendente de Gestão Ambiental da Itaipu Binacional, a ideia do reflorestamento partiu também do princípio de garantir os serviços ecossistêmicos prestados pela floresta e solo, a fim de proteger o reservatório dos danos causados pela sedimentação e assim garantir a vida útil do lago.

Em 1986, um total de 12 milhões de mudas já havia sido plantado, mas muito ainda haveria de ser feito. Ao longo deste período, projetos de sistemas agroflorestais foram realizados junto a agricultores de comunidades lindeiras. Canafístulas, Ipês, peroba, paineiras e tantas outras árvores passaram a crescer às margens do reservatório e formar uma floresta que hoje se encontra em diferentes estágios de desenvolvimento.

Ao todo, são 100 mil hectares de florestas preservadas nas margens Paraguaias e Brasileiras do reservatório, totalizando 1.400 km de extensão da mata ciliar do lago apenas no Brasil. Além disso, 400 mil mudas de árvores nativas da Mata Atlântica são produzidas anualmente no viveiro da Itaipu, que conta com um importante e diversificado banco de germoplasmas. “As aves e outros animais são nossos grandes aliados neste processo de reflorestamento. Podemos encontrar aqui espécies diferentes das cultivadas inicialmente. Com este trânsito de fauna, os animais fazem o trabalho de dispersão de sementes”, explica Cristiano Teixeira, técnico florestal da Itaipu.   

Viveiro de mudas no Refúgio Biológico Bela Vista | Foto: Alice Sales

Hoje, essas áreas conectam diferentes Unidades de Conservação situadas às margens do lago, formando um corredor que liga a biodiversidade do Parque Nacional da Ilha Grande ao Parque Nacional das Cataratas do Iguaçu. Ariel Scheffer ressalta que um dos orgulhos desta iniciativa de longa data é que a maior ação de recuperação de florestas de Mata Atlântica foi feita no Paraná e que 28% destas ações foram realizadas pela Itaipu. 

Além da proteção das margens do lago contra a erosão e sedimentação, a faixa de proteção, refúgios e reservas das áreas protegidas da Itaipu, oferecem os serviços ecossistêmicos do sequestro de carbono (CO2) da atmosfera por meio da biomassa florestal e a conservação das espécies existentes no local.

O superintendente de gestão ambiental da Itaipu pondera que, se a importância do reflorestamento tivesse sido ignorada, muito provavelmente afetaria a produção de água da região. “Viramos produtores de água na região ao recuperar bacias hidrográficas e nascentes. Um exemplo para isso é o Rio Maracaju, onde a gente colocou floresta e a água voltou”. 

E completa:

“O diferencial é que criamos Unidades de Conservação e reconstruímos ecossistemas perdidos e tudo isso envolvendo as comunidades lindeiras no processo. Esse é um grande diferencial, que vai além das compensações ambientais exigidas pela Lei. Plantamos 24 milhões de árvores. Plantamos mudas e cuidamos para que essas mudas virassem árvores e formassem floresta. Agora é tornar essa área uma floresta de verdade, com animais que possam viver nela”

O diretor de Coordenação da Itaipu, general Luís Felipe Carbonell, considera que a parceria com as comunidades e Educação Ambiental são pontos cruciais para o êxito de tantos anos de trabalho. “Celebramos com o marco das 24 milhões de árvores plantadas o ciclo virtuoso que envolve a preservação da natureza junto com a geração de energia limpa e renovável. Fazemos isso, envolvendo uma base muito forte de educação ambiental, já que não adianta recuperarmos parte de uma floresta se as pessoas não entenderem a importância dessa preservação e as consequências da não conservação.  Cuidar da natureza faz parte do nosso negócio e não se trata de um clamor momentâneo.”

Corredor Ecológico Santa Maria

Vista aérea do Corredor Ecológico Santa Maria, em Santa Terezinha de Itaipu – PR | Foto: Jarbas Teixeira

Como um braço do projeto de reflorestamento e conservação das áreas protegidas da Itaipu, há 20 anos foi criado o Corredor Ecológico Santa Maria. Situado na Fazenda Santa Maria, em Santa Terezinha de Itaipu – PR, o corredor é resultado da parceria entre a Itaipu, proprietários de terra e diversas instituições. 

O corredor conta com 976 hectares entre áreas naturais e regeneradas remanescentes de áreas naturais, incluindo territórios de proteção permanente das microbacias dos rios Apepu e Bonito. A faixa de floresta conecta o Parque Nacional do Iguaçu (PNI), ao sul, passando por importantes fragmentos preservados, às áreas protegidas da Itaipu Binacional, ao norte.

Parque Nacional do Iguaçu | Foto: Alice Sales

De acordo com a engenheira florestal Veridiana Pereira, da divisão de meio ambiente da Itaipu, a iniciativa dos proprietários da Fazenda Santa Maria para criar uma Reserva Particular do Patrimônio Natural na propriedade foi nos anos 1990. Segundo ela, atualmente o corredor ecológico favorece a saúde do meio ambiente e contribui com o fluxo genético de flora e fauna da Mata Atlântica

Giovanna Machado, proprietária da Fazenda Santa Maria, que abriga o corredor ecológico, conta que sua família sempre teve uma grande preocupação em preservar a natureza do lugar e por isso abraçou junto à Itaipu e outras instituições a causa. “Aqui há relatos e registros de muitos animais. Nossos boiadeiros às vezes contam que viram onças bebendo água nos estábulos e para nós ela não é uma inimiga. Onde tem onça, tem água e onde tem água tem vida e tudo está interligado para a conservação do ecossistema,” finaliza.

* A jornalista viajou a convite da Itaipu Binacional

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